TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 83.º Volume \ 2012

431 acórdão n.º 176/12 Em causa está a alteração do regime especial de acesso ao ensino superior de que são beneficiários os atletas de alta competição. Na vigência da redação original do artigo 19.º do Decreto-Lei n.º 393-A/99, os atletas de alta compe- tição (titulares de um curso de ensino secundário português) podiam requerer a matrícula e inscrição no par estabelecimento/curso, desde que tivessem tido aprovação nas disciplinas do ensino secundário correspon- dentes às provas de ingresso exigidas no ano em causa. Ou seja, o acesso baseava-se apenas na aprovação do curso de ensino secundário, não contando a nota obtida nos exames nacionais das disciplinas específicas. Com a nova redação conferida pelo Decreto-Lei n.º 272/2009, passou a ser exigido aos praticantes des- portivos de alto rendimento, para a matrícula e inscrição em par estabelecimento/ curso de ensino superior, a obtenção de classificações mínimas nas provas de ingresso respetivas (fixadas anualmente pelos estabeleci- mentos de ensino superior) e na nota de candidatura (no âmbito do regime geral de acesso). Ou seja, como se salienta no acórdão recorrido, a nota dos exames nacionais passou a ser tomada em linha de conta em duas medidas: (i) a nota obtida tem de ser superior ao limite mínimo fixado pelo estabelecimento de ensino supe- rior; (ii) será ponderada com a média da frequência do secundário, sendo que o resultado dessa ponderação também terá de ser superior ao limite mínimo fixado pelo estabelecimento de ensino superior. A alteração entrou em vigor no 5.º dia após a publicação do Decreto-Lei n.º 272/2009, ou seja, em 6 de outubro de 2009. 6. Ficou provado nas instâncias que a autora, aqui recorrida, concluiu o 12.º ano, no Curso Científico- -Humanístico de Ciências e Tecnologias, no ano letivo de 2009/2010 e nessa data encontrava-se qualificada como praticante desportivo de alta competição, na modalidade de ténis. A aplicação, ao caso da recorrida, da alteração legislativa introduzida pelo Decreto-Lei n.º 272/2009, quando a mesma já se encontrava a fre- quentar o 12.º ano, significava que a esta era imposto a ponderação das médias dos anos letivos passados e da classificação das provas de ingresso realizadas no ano letivo anterior, isto é, as provas específicas de Biologia/ Geologia e Físico-Química realizadas no 11.º ano. O acórdão do Supremo Tribunal Administrativo, aqui recorrido – que foi proferido em recurso de revista interposto no âmbito de um processo urgente de intimação à proteção de direitos, liberdades e garan- tias –, negou provimento ao recurso e confirmou o acórdão do Tribunal Central Administrativo do Sul (TCAS) que julgara procedente a intimação, reconhecendo à autora, aqui recorrida, o direito a ser admitida no Curso de Medicina da Faculdade de Ciências Médicas da Universidade Nova de Lisboa, no ano letivo de 2010/2011 e condenando o Ministério na criação de uma vaga nesse curso. Para o efeito, considerou aplicável ao caso concreto o regime de acesso ao ensino superior constante do Decreto-Lei n.º 393-A/99, recusando a aplicação da alteração legislativa introduzida pelo Decreto-Lei n.º 272/2009, com fundamento na violação dos princípios da confiança e da segurança ínsitos na ideia de Estado de direito democrático (artigo 2.º da Constituição), pelas razões assim resumidas: «Essa nova regu- lação procedimental apresenta-se como excessivamente onerosa, portanto inadmissível, porque afeta, em sentido desfavorável, as expectativas da autora constituindo uma mutação da ordem jurídica com a qual a autora, já na reta final do seu percurso de acesso ao ensino superior não podia razoavelmente contar e que destrói o seu investimento de confiança na manutenção do regime legal e os seus planos de vida, sem que se veja que a afetação da sua relação jurídica já constituída, tenha sido ditada pela necessidade de salvaguar- dar direitos ou interesses constitucionalmente protegidos que devam considerar-se prevalentes». Em suma, entendeu o Supremo Tribunal Administrativo que «a tomada em consideração de factos anteriores à entrada em vigor da lei nova, no procedimento concretizador do direito especial da autora de acesso ao ensino supe- rior, agravando o respetivo condicionamento, ofende os princípios da confiança e da segurança ínsitos na ideia de Estado de direito democrático (artigo 2.º da Constituição)». O representante do Ministério Público junto deste Tribunal Constitucional pronunciou-se no mesmo sentido, salientando que «a mudança superveniente das regras que regulamentavam a situação da recor- rida, com a qual esta não podia razoavelmente contar, e surgida em momento que a impossibilitou de,

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