TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 83.º Volume \ 2012
377 acórdão n.º 153/12 da Silva, Curso de Processo Penal , III, Verbo, 2009, p. 319, Miguel Ângelo Lemos, “O direito ao recurso da decisão condenatória enquanto direito constitucional e direito humano fundamental”, in Estudos em Home- nagem ao Prof. Doutor Jorge de Figueiredo Dias , III, Coimbra Editora, 2010, pp. 935 e segs., e Figueiredo Dias/Nuno Brandão, loc. cit. , pp. 639 e segs.). 7. Da interpretação que a decisão recorrida fez dos artigos 399.º e 400.º do CPP resulta que não é recorrível para o Supremo Tribunal de Justiça o acórdão da Relação, proferido em recurso, que condenou o arguido numa pena não privativa da liberdade e que, assim, revogou a absolvição da 1.ª instância [artigo 400.º, n.º 1, alínea e) , do CPP], mas que já é recorrível para o Supremo Tribunal de Justiça o acórdão da Relação, proferido em recurso, que absolveu o arguido e que, assim, revogou a condenação do mesmo na 1.ª instância numa pena não privativa da liberdade (artigos 399.º e 400.º, este a contrario ). Do ponto de vista dos destinatários das normas, resulta do acórdão recorrido o seguinte: o arguido não pode recorrer em segundo grau de acórdão condenatório em pena não privativa da liberdade, que revogou absolvição da 1.ª instância; o assistente pode recorrer em segundo grau de acórdão absolutório, que revogou condenação em 1.ª instância em pena não privativa da liberdade. Face ao critério legal de admissibilidade de recurso para o Supremo Tribunal de Justiça de decisões proferidas, em recurso, pelas Relações, constitucionalmente suportado por não ser exigível o triplo grau de jurisdição, há que qualificar as situações como iguais: não obstante haver, em ambas, decisões discordantes das instâncias, as duas situações não se integram nos casos de maior merecimento penal, tendo em conta que a condenação é em pena não privativa da liberdade. As normas pertinentes foram, porém, interpretadas, relativamente a uma das situações, no sentido de o arguido não poder recorrer para o Supremo Tribunal de Justiça, face ao disposto na alínea e) do n.º 1 do artigo 400.º do CPP; e, quanto à outra, no sentido de haver recurso em segundo grau por parte do assistente, por força do disposto nos artigos 399.º e 400.º, n.º 1, alínea e) , a contrario , do mesmo Código. A diferença de tratamento é evidente, não havendo qualquer justificação material para uma diferen- ciação que privilegie o assistente no acesso ao Supremo Tribunal de Justiça enquanto segunda instância de recurso. A natureza absolutória do acórdão proferido pela Relação, em recurso, não é fundamento material bastante, considerando o que se pretende regulamentar (o acesso ao triplo grau de jurisdição e, em geral, àquele Supremo Tribunal) e as normas e princípios constitucionais pertinentes (em especial, o artigo 32.º, n. os 1 e 2). O que faz com que a norma em apreciação não possa ser perspetivada como uma solução norma- tiva que apenas se repercute na coerência interna das regras legais que conformam o acesso ao segundo grau de recurso. A recorribilidade, por parte do assistente, de acórdão absolutório da Relação que revogue condenação em 1.ª instância em pena não privativa da liberdade não é compatível com o objetivo da lei processual penal de restringir o acesso ao Supremo Tribunal de Justiça enquanto instância de recurso, limitando o triplo grau de jurisdição aos casos de maior merecimento penal a partir da regra da dupla conforme e do critério da gravidade da pena aplicada ( supra ponto 6. da Fundamentação). Não há aqui um qualquer elo de adequação objetiva e racionalmente comprovável entre a ratio daquela escolha legislativa e a diferença estabelecida, já que esta assenta exclusivamente na natureza absolutória do acórdão proferido em recurso (cfr. Acórdão n.º 184/08). Além de a diferença não ser justificável pela posição processual e atribuições do assistente enquanto sujeito do processo penal (artigo 69.º do CPP). Por outro lado, aquela diferença de tratamento não é permitida pela CRP. Ainda que se entenda que o ofendido (constituído assistente) tem o direito de intervir no processo, recorrendo de decisões absolutórias de 1.ª instância (cfr. supra ponto 5. da Fundamentação), a integração do direito ao recurso em processo penal nas g arantias de defesa significa que a CRP não consagra, nem quis consagrar, quanto ao arguido e ao assistente, um princípio de igualdade em matéria de direito ao recurso. E que, a haver diferenciações de tratamento, só serão constitucionalmente legítimas as que penderem em favor do primeiro. O princípio da igualdade nivela a posição dos sujeitos processuais dentro do direito de defesa e em favor da mesma
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