TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 83.º Volume \ 2012

367 acórdão n.º 153/12 “O princípio da igualdade de armas, em processo penal de um Estado de direito, está ao serviço do arguido, visando garantir que ele não seja colocado em inferioridade no processo (...). O direito ao recurso, enquanto dimensão essencial do princípio de defesa não pode ser visto como uma garantia do assistente mas tão só do arguido” (Ac. do Tribunal Constitucional de 27 de outubro de 1992. proc. 277/91). A “igualdade de armas” no processo prende-se também com o princípio constitucional da igualdade. “O princípio da igualdade consagrado no artigo 13.º da Constituição exige a dação de tratamento igual aquilo que, essencialmente, for igual, reclamando, por outro lado, a dação de tratamento desigual para o que for disseme- lhante, não proibindo, por isso, a efetivação de distinções. Ponto é que estas sejam estabelecidas com fundamento material bastante e, assim, se não apresentem como irrazoáveis ou arbitrárias” (Ac. do Tribunal Constitucional de 1 de março de 1994, proc. 504/92). Ora, o tratamento diferente que a lei processual dá aos dois casos de recorribilidade anteriormente indicados, simetricamente opostos e, portanto, indissociáveis, já que não se pode encarar um sem vislumbrar o outro, como num espelho que inverte a imagem da mesma “figura”, coloca o arguido nesta situação absurda: naquele em que é condenado, não lhe é permitido recorrer para obter a sua absolvição, no outro em que é absolvido, a acusação pode recorrer para obter a sua condenação! Esta diferença de tratamento, em casos que deveriam ser tratados como iguais, é irrazoável e arbitrária, para mais com ofensa do núcleo fundamental do direito de defesa. Há ofensa, nesta interpretação das normas de processo penal, dos artigos 13.º e 32.º, n.º 1, da Constituição, por violação material dos direitos à igualdade e de defesa (através do recurso) no processo penal. Note-se que estamos aqui a reportar-nos a um caso específico, em que a condenação na 1.ª instância foi numa pena não privativa de liberdade e que, posteriormente, reapreciada pela Relação em sede de recurso, foi determi- nada a absolvição do arguido. Pois, se a condenação na 1.ª instância fosse em pena privativa de liberdade, nenhuma objeção se poria ao recurso para o STJ por parte da acusação contra o acórdão absolutório da Relação, pois que na situação simetricamente oposta (absolvição na 1.ª instância e condenação na Relação em pena privativa da liber- dade) o arguido poderia interpor recurso para o STJ [cfr. alínea e) , a contrario , do n.º 1 do artigo 400.º do CPP]». 4. O Ministério Público reclamou desta decisão para a conferência, nos termos do artigo 417.º, n. os 6 e 8, do Código de Processo Penal (CPP), entendendo que “a decisão em causa não é recorrível para o Supremo Tribunal de Justiça, por via da interpretação das normas legais em causa”, devendo o recurso ser rejeitado por esta razão e “não em função de uma inconstitucionalidade, a qual não existe (…) dentro de uma interpreta- ção sistémica do regime de recursos”. Pelo acórdão agora recorrido, o Supremo Tribunal de Justiça indeferiu a reclamação do Ministério Público, com a seguinte fundamentação: «O Ministério Público entende, na esteira de alguma jurisprudência do Supremo Tribunal de Justiça, que não há recurso ordinário para este Tribunal de acórdão do Tribunal da Relação que conheça de recurso interposto de decisão – seja do tribunal singular, coletivo ou do júri - que aplique pena não privativa de liberdade ou pena de prisão não superior a cinco anos, pois assim ir-se-ia contrariar “de modo insuportável os princípios, a filosofia e a teleologia que estão pressupostos na repartição da competência em razão da hierarquia definida na regra-base sobre a recorribilidade para o STJ do artigo 432.º, n.º 1, alínea c) do CPP. A contradição e a assimetria normativa e a con- sequente aporia intrasistemática seriam, assim, tão patentes e tão intensas, que tornariam insuportável tal sentido”. Não nos vamos alongar sobre este tema, pois a decisão sumária sob reclamação já contém suficiente resposta. Recordemos, no entanto, que a referida jurisprudência refere que houve uma clara intenção do legislador da Lei n.º 48/2007, de 29 de Agosto de restringir os recursos para o Supremo Tribunal de Justiça aos casos de maior gravidade (esta conotada, por via da técnica usada para aferir da admissibilidade do recurso, com a espécie e medida da pena aplicada) e de que constituem manifestações bem paradigmáticas as limitações decorrentes: a) tratando-se de recurso direto para o STJ, do preceituado na alínea c) do n.º 1 do art. 432.º do C.P.P.

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