TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 83.º Volume \ 2012

359 acórdão n.º 146/12 Em primeiro lugar, a ideia de redução do risco de erro judiciário. Mesmo que se observem todas as regras legais e prudenciais, a hipótese de um erro de julgamento é dificilmente eliminável. E o reexame do caso por um novo tribunal permite a deteção de tais erros, através de um novo olhar sobre o processo. Além disso, o direito ao recurso permite que seja um tribunal superior a proceder à apreciação da decisão proferida, o que, naturalmente, tem a virtualidade de oferecer uma garantia de melhor qualidade potencial da decisão obtida nesta nova sede. Por outro lado, também assegura a faculdade do arguido expor perante um tribunal superior os motivos que sustentam a posição jurídico-processual da defesa perante a decisão impugnada. Neste plano, a tónica é posta na possibilidade de o arguido não só reiterar, mas também apresentar novos argumentos que abalem os fundamentos da decisão recorrida, de modo a que a nova decisão possa ter em consideração toda a argu- mentação da defesa. Resulta do exposto que os fundamentos do direito ao recurso entroncam na garantia de um duplo grau de jurisdição. Mas, conforme este Tribunal tem afirmado reiteradamente, a obrigatoriedade de assegurar esta garantia, não implica necessariamente a consagração na lei ordinária da recorribilidade de toda e qualquer decisão proferida em processo penal, sendo admissível que essa faculdade seja restringida ou limitada em certas fases do processo e que, relativamente a certos atos do juiz, possa mesmo não existir, desde que, dessa forma, se não atinja o conteúdo essencial desse direito de defesa do arguido. Multiplicar as possibilidades de recurso ao longo do processo seria comprometer outro imperativo constitucional, o da celeridade na resolução dos processos-crime (artigo 32.º, n.º 2, da Constituição), pelo que o legislador, para além das matérias em que não dispõe de liberdade para excluir a hipótese de recurso, pode sacrificar este direito desde que outros prin- cípios orientadores do processo penal, designadamente a celeridade processual, o justifiquem. O Tribunal Constitucional tem incluído no núcleo essencial deste direito de defesa as sentenças conde- natórias e outras decisões que tenham como efeito a privação ou restrição da liberdade ou de outros direitos fundamentais constitucionalmente consagrados. Com a salvaguarda do direito ao recurso nestas matérias pretende-se garantir ao arguido a possibilidade de requerer que o sacrifício dos seus direitos fundamentais, em prol das necessidades de eficácia da justiça criminal, resulte duma decisão jurisdicional com um grau de ponderação reforçado, obtido através duma segunda apreciação por um tribunal superior. O estabelecimento desta proteção aos direitos fundamentais faz aliás todo o sentido porque, ao contrário de outros ordenamen- tos constitucionais estrangeiros, em que existem específicos recursos de defesa destes direitos constitucionais contra decisões judiciais («o recurso de amparo»), esta figura não foi acolhida no nosso sistema de fiscalização da constitucionalidade. Foi esta posição da jurisprudência do Tribunal Constitucional que a Revisão de 1997 procurou sufragar com a menção ao direito ao recurso entre as garantias de defesa que devem ser asseguradas ao arguido no processo penal. 6. No presente recurso questiona-se a constitucionalidade da interpretação que considera irrecorrível um despacho proferido pelo Presidente do Supremo Tribunal de Justiça, ao abrigo da competência prevista no artigo 11.º, n.º 2, alínea b) , do Código de Processo Penal, que não atenda a arguição, no requerimento para abertura da instrução, da nulidade da ordem de destruição dos registos de interceções telefónicas, emi- tida por aquele Magistrado. O recorrente alega, por um lado, que a destruição de registos de interceções telefónicas realizadas no âmbito do inquérito é manifestamente um elemento que contende com o núcleo essencial do direito de defesa dos arguidos, pelo que, estando em causa a afetação de um direito fundamental, é obrigatória a sua recorribilidade, e, subsidiariamente, que a solução restritiva que não admite a garantia de um duplo grau de jurisdição para a apreciação da decisão sobre a validade da destruição dos meios de prova de que a defesa não prescinde é desproporcionada.

RkJQdWJsaXNoZXIy Mzk2NjU=