TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 83.º Volume \ 2012
324 TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Todos estes interesses justificam a conformação do direito de reversão ligado ao decurso de um determi- nado lapso de tempo, findo o qual o direito se extingue. 10. O artigo 5.º, n.º 4, alínea a), do Código das Expropriações fixa um prazo de vinte anos, findo o qual o direito de reversão se extingue. A verdade é que tal prazo não se afigura desproporcionado ou irrazoável. Ele corresponde, aliás, ao prazo ordinário da prescrição previsto no artigo 309.º do Código Civil. Não se vislumbra, aliás, motivo algum que dite que o direito de reversão mereça uma imprescritibilidade superior a outros direitos que se podem ter também como decorrências de direitos fundamentais. O prazo de vinte anos é, de resto, o prazo “máximo” para a usucapião de bens imóveis (artigo 1296.º do Código Civil). Ao lançar mão deste prazo, empregue com efeitos semelhantes em outros locais da ordem jurídica, o legislador acabou por adotar o período de tempo – juridicamente relevante – de maior dimensão, previsto no sistema, aplicando-o ao direito que vigora na esfera jurídica dos expropriados. Não é, a todas as luzes, um prazo desproporcionada ou irrazoavelmente exíguo, tendo em conta que as razões de segurança e estabilidade se fazem sentir com particular intensidade no âmbito da propriedade imobiliária. As considerações até agora tecidas não são invalidadas pelo facto de a entidade beneficiária da expropria- ção ter dado aos bens expropriados o fim de utilidade pública que determinou a sua expropriação durante os referidos vinte anos e só posteriormente os ter desafetado e vendido no mercado imobiliário. Com efeito, à luz dos princípios da certeza e segurança jurídicas é irrelevante o destino conferido aos bens após o decurso do referido prazo. A estipulação de um prazo de prescrição do direito de reversão visa “precisamente” , em nome dos já referidos valores assumidos pelo Direito, a pacificação das relações jurídicas, proibindo a controvérsia sobre a afetação dos bens. Tudo se passará, transcorrido o prazo, como se tivesse sido apagado o dever de “afetação” do bem ao “específico fim de utilidade pública” determinativo da expropriação. Com efeito, não é obrigatório reconhecer-se ao expropriado, findo aquele prazo, qualquer expectativa legítima de o bem poder regressar ao seu domínio. O quadro legal em vigor à data da expropriação, em 1949, adotara já um prazo para o exercício do direito de reversão dos bens expropriados; a Lei n.º 2030, de 22 de junho de 1948 (artigo 8.º, n.º 2) previa, com efeito, um prazo de trinta anos para o exercício do direito de reversão – que coincidia com a duração do prazo de usucapião previsto no Código Civil então vigente. Os herdeiros dos expropriados, face ao quadro legal atualmente em vigor, não poderiam também ter qualquer expectativa neste domínio. Não pode considerar-se terem existido, no presente caso, expectativas jurídicas merecedoras de proteção no sentido de os bens expropriados poderem ainda, atualmente, reverter para a esfera jurídica dos herdeiros dos expropriados. Finalmente, há que aceitar que os princípios da igualdade e da justiça foram devidamente acautelados com o pagamento da justa indemnização, contemporânea à data da adjudicação da propriedade dos bens à entidade beneficiária da expropriação. A justa indemnização devida pela expropriação constitui o meio idó- neo para repor, no contexto de uma expropriação por utilidade pública, o equilíbrio e a justiça do tratamento dos cidadãos perante os encargos públicos. Importa, por isso, recordar a jurisprudência do Tribunal sobre a exigência de uma justa indemnização como integrante do próprio conceito de expropriação por utilidade pública. É neste ponto paradigmático o Acórdão n.º 210/93 (publicado in Diário da República , II Série, de 28 de maio de 1993), onde se escreveu: «[...]a expressão «justa indemnização», inserta no artigo 62.º, n.º 2, da Lei Fundamental, não pode ser consi- derada como uma fórmula vazia. É, antes, uma fórmula carregada de sentido, na qual podem ser colhidos impor- tantes limites à discricionaridade do legislador ordinário. 10. Em obra recente, F. Alves Correia (cfr. O Plano Urbanístico e o Princípio da Igualdade, cit., p. 532 e segs.) defende que o conceito constitucional de «justa indemnização» leva implicado três ideias: a proibição de uma indemnização meramente nominal, irrisória ou simbólica; o respeito pelo princípio da igualdade de encargos; e a consideração do interesse público da expropriação.
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