TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 83.º Volume \ 2012

323 acórdão n.º 127/12 numa situação em que o bem expropriado, por “inação pura” da Administração, não ter sido, no prazo de dois anos contados desde a sua adjudicação, aplicado ao fim determinante da expropriação. Considerou-se que, por um lado, a entidade expropriante não tinha de notificar o expropriado já que nenhuma atividade diversa da que legitimou a expropriação foi prosseguida pela Administração e, por outro, “decorridos que sejam os dois anos após a expropriação e sem que o bem que dela foi alvo tivesse sido afeto a outro fim que não o que a ditou, o prazo de dois anos concedido a partir daí ao expropriado para solicitar a reversão (…) não se afigura como acentuadamente exíguo ou desproporcionado para um exercício de um tal direito”. 9. Consideram os recorrentes que a norma objeto do presente recurso, que prevê um prazo de vinte anos para a “extinção” do próprio direito de reversão, é inconstitucional por prever a extinção do direito mesmo nos casos – como o presente – em que esses bens, até à petição de reversão, estiveram afetos ao fim de utili- dade pública que determinou a sua expropriação, sendo posteriormente desafetados e vendidos no mercado imobiliário para a construção de um projeto imobiliário privado. Valem aqui as considerações tecidas nos Acórdãos já referidos quanto à necessidade de ponderação do direito de reversão com outros princípios constitucionais, como sejam o princípio da segurança e da certeza jurídicas. Com o estabelecimento de um limite temporal de vinte anos, findo o qual o direito de reversão se extingue, visa salvaguardar-se o interesse público que corresponde ao fundamento de todos os prazos pres- cricionais, designadamente quanto à estabilização dos atos jurídicos das entidades públicas, a certeza jurídica e a paz social. Com efeito, um dos princípios mais relevantes no nosso ordenamento jurídico, por ser um dos que mais contribui para a paz jurídica e social, é o da estabilidade. É ele que, sendo raiz e pressuposto da segurança jurídica, conduz, em inúmeros casos, à consolidação das relações jurídicas existentes e as jurisdifica com caráter definitivo, contribuindo, dessa forma, para a mencionada pacificação. O Tribunal dá acolhimento a esse princípio em inúmeros contextos, ao reconhecer que a estabilidade é um dos valores  que mais contribui para a paz jurídica e social. Foi, de resto, precisamente em função da importância e do valor desta estabilidade que o legislador fez extrair da posse, ou de outros direitos reais de gozo, mantidos por certo lapso de tempo, a aquisição do próprio direito de cujo exercício aquela atuação corresponde, através da consagração do instituto da usuca- pião (artigos 1287.º e seguintes do Código Civil). É em homenagem àqueles princípios, e à necessidade da certeza e da segurança nas relações jurídicas, que a ordem jurídica confere à “aparência” de um direito, pro- longada por determinado lapso de tempo, a virtualidade de se transformar na realidade. Sempre no intuito de preservar os referidos valores da segurança e estabilidade das relações jurídicas, a lei permite que o “não exercício” de um direito por um determinado lapso de tempo determina a sua prescrição – nos termos dos artigos  298.º e 309.º, ambos do Código Civil. É, assim, certo que o prazo de vinte anos de prescrição do direito de reversão se justifica por razões semelhantes às que estão na base dos institutos da prescrição e  da usucapião. São razões idênticas às que ditam a previsão dos referidos institutos que estão na base da previsão do prazo de vinte anos para a extinção do direito de reversão. A segurança e a certeza jurídicas assumem particular relevância no presente contexto, em que estão em causa decisões de entidades públicas respeitantes à disposição dos bens de que são titulares. Para além disto, a salvaguarda do interesse público que obrigatoriamente preside às opções das autoridades públicas, reclama a possibilidade de reafectação dos referidos bens a necessidades públicas novas, supervenientes, transcorrido que seja um prazo razoável. Por fim, há que reconhecer que a configuração e utilidade da propriedade de bens imóveis se altera com o decurso do tempo, como o demonstra a mutação das classificações dos solos, o que reclama que a sua titularidade se estabilize definitivamente ao fim de um prazo razoável. Neste contexto, merecem também proteção os valores que justificam os princípios da confiança e da boa fé, à sombra dos quais se criaram na ordem jurídica novas posições de que podem ser titulares entidades públicas ou privadas.

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