TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 83.º Volume \ 2012

316 TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Ao contrário do que o Acórdão recorrido pressupõe e indicia, a posição que se tome quanto ao ato/facto constitutivo do direito de reversão na esfera do expropriado (expropriação/adjudicação do bem à expropriante ou alguma das circunstâncias recortadas no artigo 50, n.º 1, do Código das Expropriações) não colide por qualquer forma com a questão/inconstitucionalidade que se discute no processo: o que importa saber aqui é se o direito de reversão pode ser exercido num prazo razoável após a verificação de alguma das circunstâncias recortadas no artigo 50, n.º 1, do Código das Expropriações, independentemente de esse direito haver nascido com a expropriação ou com alguma dessas circunstâncias de facto. Apesar do teor literal da norma em causa, a consideração do direito fundamental de propriedade privada (artigo 62.º da Constituição) e dos princípios constitucionais conexos, determinam que os expropriados, em deter- minadas situações, mesmo que já tenham decorrido 20 anos sobre a adjudicação do bem à expropriante, devem dispor de um prazo razoável para requerer a reversão dos bens expropriados. Trata-se de uma interpretação siste- mática do Código das Expropriações, por referência às exigências constitucionais nesta matéria. De facto, constitui um absurdo lógico-jurídico conferir um direito fundamental aos expropriados que, quando se verifica a respetiva previsão normativa, isto é, quando pode ser exercido, deixa de o poder ser porque, entretanto (numa altura em que não podia ser exercido), se extinguiu: um direito não se pode extinguir enquanto não puder ser exercido. Assim, a norma deste artigo 5.º, n.º 4, a) , do Código das Expropriações, só pode ser entendida como regra geral, isto é, para todas as situações em que o direito de reversão podia ter sido exercido, mas não o foi nesse período de 20 anos; a exceção será constituída por aquele grupo de situações em que esse direito de reversão nunca pode ser exercido durante esse período de 20 anos. Uma interpretação sistemática do Código das Expropriações, em respeito da Constituição, determina que este artigo 50, n.º 4, a) , do Código das Expropriações, seja entendido nos seguintes termos: O direito de reversão cessa quando tenham decorrido 20 anos sobre a data da adjudicação, exceto se nesse período não se tiver verificado alguma das situações descritas no n.º 1 deste preceito, caso em que terá que ser exercido nos termos referidos no n.º 5 deste preceito. 7.ª Diferente seria a solução se os Expropriados tivessem tido a oportunidade de exercer esse direito e o não tivessem feito, como seria o caso de o bem expropriado nunca ter sido afeto ao fim que determinou a sua expro- priação: nessa situação sim, mais do que formar-se na esfera jurídica dos Expropriados, podia desde logo exercer-se o direito de reversão, podendo, aliás, indicar-se com certeza qual a data limite para o exercício do mesmo desde a data da adjudicação dos bens expropriados; nessa situação, o direito de reversão pode ser exercido durante aquele período de 20 anos sobre a data da adjudicação, pelo que bem se compreende que se sancione a inércia dos Expropriados por, durante aquele prazo legal, nada terem feito para inverter essa situação. No entanto, não é essa a situação dos presentes autos, pelo que não pode defender-se aqui a aplicação da mesma tese e solução jurídicas, como pretendeu o Tribunal recorrido, sob pena de violação, entre outros, do próprio princípio da igualdade: deve tratar-se de forma igual o que é igual e diferente o que é diferente. 8.ª O equívoco do Tribunal recorrido prende-se com a distinção que deve, necessariamente, ser feita entre a existência do direito e a possibilidade legal do seu exercício, designadamente para efeitos de caducidade (ou extinção): não obstante se ter entendido que esse direito de reversão nasce na esfera jurídica do expropriado com a própria expropriação e que o mesmo só pode ser exercido caso se verifique alguma das circunstâncias de facto pre- vistas no n.º 1 do artigo 5.º do Código das Expropriações (em articulação com a defesa dos próprios Recorrentes), inexplicavelmente, concluiu-se a final que, em qualquer caso, esse direito só pode ser exercido no prazo de 20 anos sobre a data da adjudicação (independentemente, pois, de se ter verificado ou não uma qualquer daquelas circuns- tâncias de facto). O que se pergunta é como pode caducar (ou extinguir-se) um direito que, até a esse momento concreto, nem sequer podia ser exercido?! 9.ª Ainda que se entenda que o Código das Expropriações não previu a situação que se nos depara (impossibili- dade do exercício do direito de reversão nos 20 anos subsequentes à expropriação pelo facto de o bem expropriado se encontrar cometido ao fim que determinou a sua expropriação) e que, portanto, estamos perante uma lacuna, importa respeitar a metodologia prescrita no artigo 10.º do CC, recorrer à analogia e concluir o seguinte: por um lado, que o regime da usucapião, por ser estruturalmente distinto da questão que nos ocupa, não pode aqui ser equacionado ou aplicado; por outro, que é o regime da prescrição que mais se aproxima da situação sub judice e que, portanto, deve ser aplicado analogicamente.

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