TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 83.º Volume \ 2012
305 acórdão n.º 112/12 5.ª Na verdade, relativamente a (i) , e atendendo ao disposto na cláusula 4ª do Contrato de Concessão – que confere à concessionária o direito de utilizar as vias públicas para a instalação das infraestruturas de distribuição de energia, determinando expressamente que esse direito abrange as infraestruturas de baixa, média e alta tensão – revela-se evidente, para um “declaratário normal”, que a isenção fixada na cláusula 12.ª do Contrato de Concessão para o uso dos bens do domínio público municipal por essa concessionária terá de abranger todos os bens ocupados por infraestruturas de distribuição de energia elétrica (independentemente do nível de tensão em que operam); 6.ª No que concerne a (ii), a ponderação das circunstâncias que, no momento em que as partes celebraram o Contrato de Concessão, rodeavam o exercício da atividade de distribuição de energia elétrica – as quais revelam que tal atividade estava concentrada, em todos os seu vetores (alta, média e baixa tensão) na A. –, sempre levaria um “declaratário normal” a concluir que tal contrato foi configurado – em todos os seus elementos integrantes, incluindo a isenção de taxas pela ocupação do domínio público municipal – atendendo à unidade empresarial que caracterizava a referida atividade de distribuição de energia elétrica; 7.ª Por fim, quanto a (iii), tendo em conta a conduta das partes no período inicial de execução do contrato – que é aquele que deve relevar para a definição e estabilização do exato sentido das declarações negociais que o integram –, um “declaratário normal” só poderá concluir que o equilíbrio de posições jurídicas vertido naquela cláusula 12.ª assentava efetivamente numa reciprocidade prestacional entre renda e isenção total de taxas domi- niais, na medida em que, durante os anos que se seguiram à celebração do contrato (2002 e 2003), o município do Seixal não liquidou à A. qualquer taxa por ocupação do domínio público municipal; 8.ª Tendo, em 2005, o município do Seixal decidido inverter esta prática – que é, aliás, generalizada a todos os contratos de distribuição de energia elétrica vigentes no território continental – e liquidado à A. uma taxa de € 3 171.854,10 pela ocupação do domínio público com infraestruturas de distribuição de energia elétrica em alta tensão no ano de 2004, a Recorrente impugnou tal decisão judicialmente; 9.ª Ao julgar tal impugnação, o TCA Sul baseou-se na interpretação do artigo 11.º da Portaria n.° 437/2001, de 28 de abril, para concluir que dele não decorre “qualquer isenção de taxas pela ocupação do solo e subsolo municipais com linhas e redes de alta tensão, como as relativas às taxas ora impugnadas”, reconhecendo, assim, que a A. não poderia exigir tal isenção e que o município do Seixal tinha legitimidade para cobrar a essa entidade concessionária taxas pela ocupação do solo dominial com infraestruturas de alta tensão; 10.ª Ao interpretar o artigo 11.º da Portaria n.° 437/2001 no sentido de que a isenção do pagamento de taxas com a ocupação do domínio público – aí fixada como contrapartida do pagamento de uma renda pela conces- sionária de distribuição de energia elétrica – é necessariamente parcelar, apenas abrangendo as infraestruturas de distribuição de energia em baixa tensão, o TCA Sul produziu uma solução interpretativa que, rompendo com o sinalagma contratual que esteve efetivamente na base da decisão de contratar, datada de 30 de agosto de 2002, envolveu uma rutura do equilíbrio financeiro do contrato de concessão celebrado entre o município do Seixal e a A.; 11.ª Sucede que o equilíbrio financeiro de um contrato administrativo – no caso particular, do Contrato de Concessão de distribuição de energia elétrica celebrado entre Recorrente e Recorrido – tem na sua base posições jurídicas que são objeto de tutela jus‑fundamental, quer pelo direito de propriedade (artigo 62.° da Constituição), quer pelo direito de livre iniciativa económica privada (artigo 61.° da Constituição); 12.ª Com efeito, deve entender-se que cabem na garantia constitucional do direito de propriedade todos os direitos subjetivos de conteúdo patrimonial – isto é, todas as posições jurídicas que sejam aptas a conferir ao seu titular um espaço de liberdade material, ainda que tendo na sua origem um ato de direito público – pois esta é a única leitura compatível com o telos subjacente ao artigo 62.º da Constituição; 13.ª Ora, neste quadro, a posição da Recorrente no que respeita à manutenção do equilíbrio financeiro do Contrato de Concessão, enquanto posição jurídica com indiscutível relevância económica e expressão patrimonial, é tutelada pelo direito de propriedade, que confere ao seu titular o direito de exigir que esse equilíbrio financeiro não seja subvertido sem a devida compensação patrimonial (cfr. artigo 62.°, n. os 1 e 2 da Constituição); 14.ª A mesma tutela é conferida pelo direito de livre iniciativa económica, na medida em que a adulteração do equilíbrio financeiro daquele contrato, impossibilitando que o exercício de uma atividade económica – ou
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