TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 83.º Volume \ 2012
278 TRIBUNAL CONSTITUCIONAL 8.ª – Por conseguinte, qualquer interpretação do citado artigo do Código de Processo Civil no sentido de que se aplica a processos em que se discutem direitos como os que, no caso, se pretende exercer tem que ter-se como inconstitucional e abrangida pela revogação constitucionalmente prevista. 9.ª – Em boa verdade, a existência de contradição com as normas constitucionais que aqui se sustenta é aná- loga à que ocorre relativamente ao n.º 1 do artigo 1817.º e que levou à declaração de inconstitucionalidade desta norma, 10.ª – Porque em ambos os casos estamos perante normas meramente adjetivas alicerçadas em considerações de ordem prática, abusivamente preclusivas do exercício dos mesmos direitos fundamentais. 11.ª – Tem, por isso, que considerar-se inconstitucional, e por isso revogada, a norma do artigo 494.º, n.º 1, alínea i) do Código de Processo Civil quando interpretada no sentido da sua aplicabilidade aos processos em que se discutam ou se pretendam exercer direitos fundamentais como os que no caso sub judice estão em apreciação. Sem conceder 12.ª – O facto de o legislador estatuir no artigo 1813.º do Código Civil que, no caso de ação oficiosa de inves- tigação, a sua improcedência não impede a instauração de nova ação – o que não acontece com outros tipos de ações intentadas pelo Ministério Público – revela bem que se reconhecia que, no caso, estamos perante o exercício de um direito fundamental que justifica excecionar-se ao regime do caso julgado. 13.ª – Consideração esta que, à luz da atual Constituição e das garantias aos direitos fundamentais que estabe- lece, ganha um peso muito mais substancial. 14.ª – Sendo frouxa e inconsistente, como resulta das considerações que supra se alinharam, a justificação dada por alguns autores para o disposto no artigo 1813.º, que se consubstancia numa alegada maior falibilidade do Ministério Público. 15.ª – É evidente que o facto de se estabelecer que não ocorre caso julgado nas ações oficiosas e o mesmo não acontecer com as não oficiosas, constitui uma violação do princípio da igualdade consignado no artigo 13.º da Constituição. 16.ª – Violação que assume especial gravidade atento o melindre e a relevância dos direitos que estão em causa, 17.ª – Pelo que, também por este fundamento, se impõe a declaração de inconstitucionalidade da interpretação dos artigos 494.º, n.º 1, alínea i) do Código de Processo Civil com o sentido que repudiamos. 18.ª – Não obstante a A. desta ação ter arguido a inconstitucionalidade desta norma na interpretação supra referida, e a sua implícita revogação parcial ocorrida com a entrada em vigor da atual Constituição, o Supremo Tribunal de Justiça limitou-se a negar provimento ao seu recurso alegando que a declaração de inconstitucionali- dade do n.º 1 do artigo 1817.º não pode produzir efeitos relativamente à presente ação, por ocorrer caso julgado, louvando-se no disposto no artigo 282.º, n.º 3, da Constituição da República Portuguesa. 19.ª – Abstendo-se, assim, de pronunciar-se sobre a inconstitucionalidade arguida pela A. quanto à alínea i) do n.º 1 do artigo 494.º do Código de Processo Civil na interpretação a que nos vimos referindo. 20.ª – Do que resultou aplicar uma norma [a do artigo 494, n.º 1, alínea i) cuja inconstitucionalidade parcial, e implícita parcial revogação, tinha sigo arguida – o que confere à A. o direito de recorrer para este tribunal, con- forme prevê o artigo 70.º, n.º 1, alínea b) da Lei n.º 28/82, de 15/11.» O recorrido não contra-alegou. Importa apreciar e decidir II – Fundamentação 4. Está em causa, no presente recurso, a questão de saber se é conforme à Constituição a interpretação do disposto no n.º 1, alínea i), do artigo 494.º do Código de Processo Civil, segundo a qual a exceção dila- tória do caso julgado, aí prevista, abrange também as ações não oficiosas de investigação da paternidade.
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