TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 83.º Volume \ 2012
273 acórdão n.º 107/12 interlocutória ou incidental, nela resolvida, mantendo-se aberta a possibilidade de discussão quanto à justiça material da condenação pela primeira instância. Ora, fazendo apelo à apreciação conciliatória dos valores antinómicos do processo penal, que a Cons- tituição impõe, não pode admitir-se, em nome de um processo penal célere e eficaz, a insindicabilidade da decisão da relação que rejeita, por intempestivo, sem contraditório, o recurso interposto de decisão da pri- meira instância que condena o arguido em pena de prisão igual ou superior a 8 anos de prisão. Os efeitos altamente gravosos de uma eventual decisão errada ou ilegal, quanto a tal matéria, devem ser prevenidos pela garantia, nesse caso, de um grau de recurso, sendo certo que é precisamente em razão da gravidade de uma decisão condenatória da relação que aplica ao arguido pena de prisão em medida igual ou superior a 8 anos de prisão que a lei lhe confere o direito de dela recorrer até ao Supremo Tribunal de Justiça, reconhecendo-lhe, em tais casos, um triplo grau de jurisdição [artigo 400.º, n.º 1, alínea f ) , a contrario , do CPP]. O direito de defesa do arguido impõe, pois, que, pelo menos nos casos em que o Supremo teria compe- tência, a final, para conhecer do mérito do recurso, se reconheça ao arguido o direito de ver por esta instância reapreciada a decisão da relação que, sem prévio contraditório, rejeitou, por intempestivo, o recurso inter- posto da decisão condenatória da primeira instância que foi por esta última admitido. É que à gravidade da decisão acresce a circunstância de ao arguido não ter sido previamente facultada a possibilidade de expor as suas razões de defesa perante a instância decisória (a Relação). Assim, retomando a segunda variável de análise acima enunciada, o único modo de garantir ao arguido o efetivo exercício do seu direito fundamental de defesa é permitir que este possa sindicar perante o tribunal superior (o Supremo) a bondade de tão gravosa decisão de forma, expondo no respetivo recurso as razões de defesa que antes não teve a oportunidade de invocar. Por tais razões, justifica-se a formulação de um juízo de inconstitucionalidade que, embora recaindo sobre a interpretação normativa sindicada, restrinja a sua amplitude, pois que, se não merece censura cons- titucional a interpretação que vede a reapreciação pela mais alta instância ordinária de recurso de todo e qualquer acórdão da relação que não admita, por intempestivo, recurso para si interposto, é já de admitir a desconformidade com a Lei Fundamental quando a decisão da relação que, com esse fundamento de natu- reza processual, rejeita o recurso interposto de sentença que condena o arguido em pena de prisão igual ou superior a oito anos, operando o respetivo trânsito, sem antes lhe dar a possibilidade de se pronunciar sobre essa questão prévia. Se é constitucionalmente exigível que os autores de crimes sejam julgados e punidos, com celeridade e eficácia, pela sua prática, não é aceitável, também na perspetiva constitucional, que isso se consiga com um intolerável sacrifício do direito de defesa do arguido. É o que sucederia, pelas enunciadas razões, com a adoção do entendimento normativo ora em apreço, pelo que cumpre julgar inconstitucional, por violação do artigo 32.º, n.º 1, da CRP, a norma da alínea c) do n.º 1 do artigo 400.º do CPP, interpretada no sentido de não haver recurso para o Supremo Tribunal de Justiça de acórdão da Relação que, sem prévio contraditório, considera intempestivo o recurso, admitido na 1.ª instância, de decisão que condena o arguido em pena de prisão igual ou superior a oito anos de prisão. 4. Decisão Pelo exposto, decide-se: a) Não conhecer da questão de inconstitucionalidade atinente à norma do artigo 107.º, n.º 6, do CPP, interpretada no sentido de que se «limita a permitir a prorrogação do prazo de recurso de 20 para 30 dias e que, mesmo havendo impugnação da matéria de facto, o prazo de recurso não pode exceder os 30 dias»;
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