TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 83.º Volume \ 2012
272 TRIBUNAL CONSTITUCIONAL bilidade de expor previamente perante esta instância de recurso as suas razões de defesa; cfr., entre outros, Acórdãos n. os 682/06 e 424/09). Sucede que, no caso sub judicio , como ressalta da dinâmica processual que precedeu a prolação do acór- dão do Tribunal da Relação de Coimbra, não teve o arguido a possibilidade prévia de exercer o contraditório quanto à questão da intempestividade do recurso, cuja apreciação não se bastava, aliás, com a mera contagem do respetivo prazo, por forma a poder invocar perante a Relação, antes da tomada da decisão que julgou intempestivo o recurso, as razões que poderiam infirmar esse entendimento. Sendo assim, o que se sujeita à apreciação do Tribunal Constitucional, no presente recurso, é saber se a solução normativa de irrecorribilidade da decisão da relação que julga intempestivo recurso admitido pela primeira instância é, ou não inconstitucional, sendo certo que, relativamente a esta decisão, não pode o arguido, na interpretação normativa sindicada, dela recorrer num único grau, não sendo também válido, em tal contexto, o argumento invocado pela decisão recorrida de que, bastando-se o direito ao recurso, garantido no artigo 32.º, n.º 1, da CRP, com um grau de recurso, ou segundo grau de jurisdição, o arguido «já (o) utilizou ao recorrer para o Tribunal da Relação». Ora, feitas tais precisões, não se pode ignorar as particularidades processualmente relevantes do presente recurso, pelo que, sem risco de descaracterização da natureza necessariamente normativa da questão de cons- titucionalidade, é de ponderar, de um lado, a intensidade lesiva/ofensiva da decisão que, na interpretação sindicada, não admite recurso para o Supremo Tribunal de Justiça e, por outro, a circunstância de o arguido não ter tido a oportunidade de apresentar as suas razões de defesa antes de a mesma ser proferida. Quanto ao primeiro aspeto, a necessidade do recurso deve aferir-se em função da sua utilidade como instrumento de garantia do direito de defesa do arguido. Ora, a efetivação do direito de defesa do arguido torna-se tão mais premente quanto mais intensos forem os efeitos que da decisão judicial decorrem para a sua esfera jurídica, sendo que nesta se incluem, não apenas os direitos fundamentais que a Constituição reco- nhece a qualquer cidadão, mas também aqueles que esta especialmente concede ao arguido enquanto visado por um concreto processo penal. E nesta última categoria necessariamente se integra o próprio direito ao recurso, tendo em linha de conta que é tão gravosa a decisão condenatória como aquela que não admite o recurso dela interposto. Ora, o Tribunal Constitucional, no já citado Acórdão n.º 597/00, embora não tenha perspetivado o objeto do recurso nos precisos termos ora equacionados, julgou efetivamente inconstitucional a norma da alínea c) do n.º 1 do artigo 400.º do CPP, na anterior redação, quando interpretada no sentido de serem insuscetíveis de recurso para o Supremo Tribunal de Justiça os acórdãos proferidos, em recurso, pelas relações que versem sobre questões de direito processual penal. Nesse recurso, tal como no presente, o que se discutia era precisamente interpretação normativa que, tendo por fonte norma que (apenas) não admitia recurso para o Supremo dos acórdãos, em recurso, das relações que não pusessem termo ao processo, considerava serem (também) irrecorríveis os acórdãos das relações que, por razões de natureza processual, põem termo ao processo, sendo praticamente idêntico ao dos presentes autos o contexto processual em que foi acolhida uma tal interpretação da lei. E para o juízo então formulado quanto ao caráter «arbitrário» e «injustificado» dessa interpretação, na perspetiva das garantias de defesa do arguido, não pôde ter deixado de concorrer a perceção de que o efeito preclusivo de um acórdão da relação que, por razões de natureza processual, põe termo ao processo (aí, como aqui, o acórdão da relação rejeitou, por razões de forma, o recurso interposto da decisão de primeira instância que condenou o arguido por crime punível com pena superior a oito anos) não é equiparável, em termos de gravidade decisória, ao que decorre de um acórdão que não conhece do objeto do processo mas não lhe põe termo. No primeiro caso, encerra-se a discussão quanto ao mérito da condenação, pois que da decisão da relação que rejeita o recurso inevitavelmente decorre o trânsito em julgado da decisão condenatória profe- rida pela primeira instância; no segundo, apenas transita a decisão quanto à questão adjetiva, de natureza
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