TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 83.º Volume \ 2012
260 TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Por fim, as exigências de informação e transparência permitem ainda garantir um sistema de igualdade de oportunidades dos investidores. São neste contexto particularmente ilustrativas as palavras de Eduardo Paz Ferreira, ao afirmar que “o equilíbrio automático que seria conseguido pelo funcionamento do mercado é, de facto, substancialmente perturbado pela existência de assimetrias de informação que vão determinar uma alocação imperfeita da riqueza” ( ibid .). No contexto da regulação da Concorrência, o Tribunal teve também já oportunidade de sublinhar a importância da informação no domínio das atividades económicas ligadas ao exercício da iniciativa privada (Acórdão n.º 461/11, disponível no site do Tribunal). Para a salvaguarda dos referidos valores constitucionais, o legislador optou por estabelecer sanções que se revelassem dissuasoras. Como explica Frederico Lacerda da Costa Pinto, “(…) o merecimento de tutela sancionatória destes bens radica, de uma forma geral, no facto de estar em causa a regularidade e a eficiência de um setor do sistema financeiro, reconhecido constitucionalmente (artigo 101.º da Constituição), que desempenha funções económicas essenciais, como a diversificação das fontes de financiamento das empresas, a aplicação de poupanças das famílias ou a gestão de mecanismos de cobertura de risco de atividades e de investimentos” ( op. ult. cit. , p. 17). Em suma, a qualificação da comunicação ou divulgação, por qualquer pessoa ou entidade, e através de qualquer meio, de informação que não seja completa, verdadeira, atual, clara, objetiva e lícita como contra- ordenação muito grave fundamenta-se na necessidade de salvaguardar os referidos interesses, constitucional- mente tutelados. Face ao relevo dos valores que se pretenderam salvaguardar, não pode considerar-se que a qualificação das condutas referidas como “contraordenação muito grave” se mostre desnecessária, inadequada ou manifestamente excessiva, pelo que não pode considerar-se violado o princípio da proporcionalidade na vertente que o recorrente qualifica como “absoluta”. 10.3. O mesmo se dirá, de resto, no que respeita ao princípio da proporcionalidade na também invo- cada vertente “relativa”, a propósito da congruência que deverá verificar-se entre si, quanto às sanções previs- tas no ordenamento jurídico em causa. Também aqui há que começar por relembrar a ampla margem de liberdade de conformação do legisla- dor no que toca ao equilíbrio interno do sistema de sanções previstas no CVM. E a verdade é que não pode concluir-se que a qualificação como “contraordenação muito grave” se revele manifestamente desproporcio- nada em relação às demais contraordenações previstas no diploma. De facto, o CVM procede à distinção de várias situações de transparência atribuindo-lhes sanções diferenciadas, consoante a verificação de vários fatores, como se depreende da leitura dos demais números do artigo 389.º do CVM. Importa atentar, em particular, na alínea a) do n.º 3, que determina que, se a prestação de informação sem a qualidade exigida disser respeito a valores mobiliários ou a instrumentos financeiros que não sejam negociados em mercado regulamentado, ou se a operação tiver valor igual ou inferior ao limite máximo da coima prevista para as contraordenações graves, apenas se originará contraordenação grave, o que manifesta a preocupação do legislador em salvaguardar a referida vertente relativa do princípio da proporcionalidade, sancionando mais fortemente a violação de deveres de informação respeitantes a outros valores. Por fim, pode ainda afirmar-se que, no que toca aos montantes das coimas, o artigo 388.º do CVM prevê que os limites máximos e mínimos dos vários tipos de contraordenações são parcialmente sobreponí- veis, o que demonstra que, na arquitetura do regime de sanções previstas no Código, a solução legal não se mostra desequilibrada. 11. Alega ainda o recorrente que, ao rotular como “muito grave” a comunicação ou divulgação, por qualquer pessoa ou entidade, e através de qualquer meio, de informação que não seja completa, verdadeira, atual, clara, objetiva e lícita, o artigo 389.º, n.º 1, alínea a), do CVM, viola o princípio da culpa previsto nos artigos 1.º e 27.º da Constituição, por ser “necessário que a qualificação jurídica da infração, e prin- cipalmente a “gravidade” abstrata dessa mesma infração, que se imputa a um arguido, tenha uma conexão próxima e direta (…) com a culpa pessoal desse mesmo arguido”.
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