TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 83.º Volume \ 2012
257 acórdão n.º 85/12 (informação respeitante a instrumentos financeiros, a formas organizadas de negociação, às atividades de intermediação financeira, à liquidação e à compensação de operações, a ofertas públicas de valores mobiliá- rios e a emitentes), como os veículos da mesma (informação inserida em conselho, recomendação, mensagem publicitária ou notação de risco). Por outro lado, se é certo que, na redação dada pelo Decreto-Lei n.º 486/99, de 13 de novembro, apenas se exigiam esses requisitos no que toca à informação que fosse “suscetível de influenciar as decisões dos investido- res”, menção que foi posteriormente retirada, nem por isso essa alteração implicou uma diminuição da clareza da norma. Alterou-se, com efeito, a configuração do tipo contraordenacional, que passou a sancionar uma con- duta independentemente dos efeitos danosos que ela possa provocar nos bens jurídicos que se visam salvaguar- dar. Ora, não é constitucionalmente ilegítima a criação de infrações contraordenacionais formais ou de mera atividade, em que o preenchimento do tipo se esgota na realização da conduta proibida, independentemente de qualquer resultado exterior. Na verdade, pode afirmar-se que “no âmbito do mercado de valores mobiliários uma tal antecipação da intervenção sancionatória de natureza contraordenacional justifica-se plenamente. A tutela dos valores em causa não se deve fazer por referência aos danos provocados ou às lesões de interesses efeti- vamente verificadas. Por um lado, porque neste tipo de mercado é muitas vezes difícil a identificação dos danos, na maior parte de natureza difusa; por outro lado, quando identificados os danos sobre o mercado eles são, em regra, já irreparáveis e incontroláveis; finalmente, porque com as práticas ilícitas se geram normalmente efeitos económicos em cadeia que transcendem o simples espaço de circulação dos valores em causa; por último, mas não menos importante, para um mercado tão rápido e sensível como este qualquer perigo é já um momento de danosidade efetiva, que nele permanece alimentando a desconfiança dos investidores. É pois compreensível, por exemplo, que o CVM sancione a simples violação de deveres de informação ou a inexatidão desta” (Frederico Lacerda da Costa Pinto, “A tutela dos Mercados de Valores Mobiliários e o Regime do ilícito de mera ordenação social”, in AA.VV., Direito dos Valores Mobiliários , vol. I, Coimbra Editora, 1999, p. 300). 9.4. Por fim, a norma objeto do presente recurso deve ser ainda lida em conjugação com a alínea a) do n.º 1 do artigo 388.º do CVM, que estabelece a moldura sancionatória das contraordenações qualificadas como muito graves, fixada entre 25 000 e 2500 000 Euros. Não se pode considerar que os limites máximo e mínimo da moldura sancionatória tenham sido fixados de forma a violar o princípio da determinabilidade da norma. De facto, o CVM especifica no artigo 405.º os critérios que deverão presidir à determinação da medida da coima, nomeadamente a ilicitude concreta do facto, da culpa do agente, os benefícios obtidos, as exigências de prevenção, a natureza singular ou coletiva do agente. A determinação da coima em concreto resulta da ponderação, dentro da margem fornecida pelos limites mínimo e máximo estabelecidos pelo n.º 1 do artigo 388.º do CVM, das circunstâncias que estão expressamente mencionadas na lei. É, assim, perfeita- mente possível aos destinatários saber quais são as condutas proibidas, como ainda antecipar, com segurança, a sanção aplicável ao correspondente comportamento ilícito. E é nisto que consiste a necessária determinabilidade dos tipos contraordenacionais. Importa relembrar, com efeito, que da jurisprudência do Tribunal resulta que o estabelecimento de limites alargados das san- ções, no domínio contraordenacional, não consubstancia em si uma violação de princípios constitucionais, devendo avaliar-se se a lei estabelece outros mecanismos que concorrem para a segurança jurídica. No Acórdão n.º 574/95 (disponível no site do Tribunal Constitucional), o Tribunal considerou que o n.º 5 do artigo 670.º do CVM então em vigor – que previa uma moldura sancionatória de 500 000$ a 300 000 000$ – não era inconstitucional, já que “a distância entre o limite mínimo e o limite máximo da coima” não seria “de molde a que esta deixe de cumprir a sua função de garantia contra o exercício abusivo (persecutório e arbitrário) ou incontrolável do ius puniendi do Estado”, já que o legislador teria fixado sem margem para dúvidas os limites “dentro dos quais se há de mover aquele que tiver de aplicar a coima”. Acrescentou-se ainda que “uma certa extensão da moldura sancionatória é de algum modo – pode mesmo dizer-se – o tributo que o princípio da legalidade das sanções tem de pagar ao princípio da culpa, que deriva da essencial dignidade da pessoa humana e se extrai dos artigos 1.º e 25.º, n.º 1, da Constituição”.
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