TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 83.º Volume \ 2012

252 TRIBUNAL CONSTITUCIONAL e refinados, na delimitação da gravidade abstrata, a que associa cada tipo de comportamento e cada moldura san- cionatória específica, não sendo legítimo que o legislador integre dentro da categoria das infrações “muito graves” situações que manifestamente não têm essa dignidade. 17. Neste sentido, sai igualmente violado o princípio da culpa, previsto no artigos 1.º e 27.º da Constituição da República Portuguesa, e o princípio da igualdade, previsto no artigo 11.º da Constituição da República Portuguesa. 18. A ilegitimidade de uma contraordenação “muito grave” que inclua toda e qualquer prestação de informação sem qualidade, em mercado, não significa uma menor tutela do mercado de valores mobiliários. Significa apenas que se deve reconhecer que nem toda a prestação ao mercado de informação sem qualidade partilha, uniforme- mente, da mesma gravidade, ao nível da ilicitude. Pelo que, em vez de se tutelar a informação ao mercado de valores mobiliários através de um único tipo contraordenacional “muito grave”, que funciona como saco comum de todos os ilícitos, mesmo que díspares, em abstrato, quanto à sua gravidade, se deveria proceder a tal tutela de forma diferenciada, utilizando o legislador critérios mais precisos e afinados para distinguir, ao nível do tipo contraorde- nacional, a intensidade abstrata da gravidade de cada um dos comportamentos que se pretende punir. 19. O que o Tribunal Constitucional tem de apreciar é se o tipo normativo que resulta do artigo 389.º, n.º 1, alínea a) , do CVM é ou não conforme à Constituição (sendo certo que, pelo menos nas duas alegadas infrações datadas de finais de 2007, tal tipo normativo foi aplicado, ao nível do preenchimento dos seus elementos constitu- tivos, sem ponderar a suscetibilidade de influenciar as decisões dos investidores), 20. Sendo absolutamente irrelevante saber se, caso o tipo infraccional se tivesse mantido idêntico ao que era antes de 2007, ainda assim, o mesmo estaria ou não preenchido. A falta de delimitação do agente, do objeto, da natureza e/ou dos efeitos sobre o mercado dessa mesma infor- mação, no tipo contraordenacional 21. O artigo 389.º, n.º 1, alínea a) , do CVM, sanciona com coima a prestação de toda e qualquer informação sem qualidade, sem identificar e delimitar o agente, objeto, natureza e/ou os efeitos sobre o mercado dessa mesma informação. 22. Nessa medida, tal disposição normativa constitui um tipo excessivamente amplo, uma vez que permite abarcar um conjunto excessivamente alargado de situações que, na sua essência, apresentam formas, natureza, gravidade e efeitos diferentes e não comparáveis. 23. Assim sendo, o artigo 389.º, n.º 1, alínea a) , do CVM, não revela limites certos e precisos à própria intervenção sancionatória do Estado, segundo juízos de necessidade para a realização dos seus fins, potenciando situações de amplitude irrestrita e/ou indiferenciada da ação punitiva desse mesmo Estado, 24. Pelo que viola o princípio da legalidade sancionatória, na sua dimensão de tipicidade (caráter certo e deter- minado do tipo contraordenacional), ofendendo dessa forma o artigo 29.º, n. os 1 e 3, da Constituição da República Portuguesa. Nestes termos, e nos mais de Direito aplicáveis, deve o Tribunal Constitucional decidir julgar a inconstitucio- nalidade in toto da norma constante do artigo 389.º, n.º 1, alínea a) , do Código dos Valores Mobiliários, segundo o requerido no requerimento de interposição de recurso, e agora melhor fundamentado nas presentes alegações.» 5. Os recorridos Ministério Público e CMVM apresentaram contra-alegações. O primeiro concluiu: «1.º A norma cuja interpretação vem questionada, da alínea a) do n.º 1 do artigo 389.º do CVM, não deve ser interpretada e aplicada isoladamente, mas em estreita conjugação e conexão com os artigos 7.º e 388.º, n.º 1, alínea a) , do CVM. 2.º O primeiro preceito, artigo 7.º do CVM estatui um dever de qualidade de informação e, em conjugação com a alínea a) do n.º 1 do artigo 389.º do CVM, preenche os elementos do tipo contraordenacional. Não se verifica, assim, nenhuma indeterminação dos pressupostos da norma questionada. 3.º O segundo preceito, alínea a) do n.º 1 do artigo 388.º do CVM, estabelece a moldura sancionatória da contraordenação.

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