TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 83.º Volume \ 2012
251 acórdão n.º 85/12 contraordenação «muito grave», independentemente do agente e do objeto, natureza e efeitos sobre o mercado daquela informação. 5. Tal opção levanta dois problemas: por um lado, em termos absolutos, revela-se desproporcionada, na medida em que permite incluir sob a mesma bitola de gravidade (e sob a mesma moldura sancionatória aplicável), infrações cuja gravidade da ilicitude revela diferenças significativas. Por exemplo, ficará sujeito à mesma bitola de gravidade (e à mesma moldura sancionatória aplicável), a prestação de uma informação sem qualidade, insuscetível de servir de base para a formação do preço e a prestação de uma informação sem qualidade, apta a fundamentar uma decisão de investimento ou desinvestimento. 6. Por outro lado, tal situação, em termos relativos, revela-se igualmente desproporcionada, na medida em que cria incongruências face às demais infrações, tipificadas como «muito graves», «graves» e «menos graves». 7. O artigo 379.º, n.º 1, alínea a) , do CVM, não estabelece qualquer delimitação em função dos efeitos pro- vocados pela informação sem qualidade, no mercado, desde logo porque, ainda que se queira conjugar/comple- mentar esta disposição normativa com o artigo 7.º, n.º 1, do mesmo diploma, verifica-se que, por força da entrada em vigor do Decreto-Lei n.º 357-A/2007, de 31 de outubro, foi eliminado desta última disposição normativa o segmento que se referia ao facto de a informação poder ser suscetível de influenciar as decisões dos investidores. 8. Nessa medida, ao qualificar como “muito grave”, e sujeitar à moldura sancionatória mais elevada das contra- ordenações “muito graves”, toda e qualquer informação sem qualidade prestada ao mercado, não fazendo qualquer distinção relevante, em função do agente e do objeto, natureza e efeitos sobre o mercado daquela mesma infor- mação, a norma que resulta do teor literal do artigo 389.º, n.º 1, alínea a) , do CVM é in toto inconstitucional, 9. Por violação do princípio da necessidade e da proporcionalidade, quer na sua vertente absoluta, uma vez que permite incluir sob a mesma bitola de gravidade (e sob a mesma moldura sancionatória aplicável), infrações cuja gravidade da ilicitude revela diferenças significativas, quer na sua vertente relativa, na medida em que cria incon- gruências graves e intoleráveis face às demais infrações, tipificadas como «muito graves», «graves» e «menos graves». 10. O princípio da necessidade e da proporcionalidade das leis restritivas de direitos, liberdades e garantias, como é o caso das leis que consagram tipos penais, tipos contraordenacionais e tipos disciplinares e, em geral, quaisquer tipos infraccionais que se integrem no âmbito do direito sancionatório punitivo público, está consa- grado no artigo 18.º, n.º 2, da Constituição, sendo certo que o princípio da proporcionalidade de toda a atividade legislativa e administrativa do Estado resulta ainda do artigo 2.º da Constituição da República Portuguesa, o qual consagra o princípio do Estado Democrático de Direito. 11. Mais: Ao rotular como “muito grave” um tipo de infração que pode incluir e abranger factos que manifesta- mente não apresentam essa dignidade (essa gravidade), o artigo 389.º, n.º 1, alínea a) , do CVM, viola igualmente o princípio da culpa, previsto no artigo 1.º e 27.º da Constituição da República Portuguesa, e princípio da igualdade, previsto no artigo 13.º da Constituição da República Portuguesa, 12. Pois é necessário que a qualificação jurídica da infração, e principalmente a “gravidade” abstrata dessa mesma infração, que se imputa a um arguido, tenha uma conexão próxima e direta (ou pelo menos não tenha uma correspondência meramente remota) com a culpa pessoal desse mesmo arguido. 13. Tal inconstitucionalidade não é prejudicada pelo disposto no artigo 389.º, n.º 3, alínea a) , do CVM, uma vez que esta disposição legal diz respeito, apenas e tão só, aos mercados não regulamentados (veja-se, artigos 199.º e segs. do CVM). 14. O facto de, no quadro da operação de determinação concreta da coima, ser possível «aplicar coimas em montantes diferenciados em função das circunstâncias concretas» (alegação da CMVM), não prejudica a incons- titucionalidade invocada. 15. Com efeito, o artigo 422.º, n.º 1, do CVM revela que a finalidade primeira das sanções previstas pelo CVM é a restauração da confiança da comunidade na integridade e validade das normas que tutelam o mercado de valo- res mobiliários, através da divulgação publica do exemplo do arguido, só assim se justificando que tal publicidade ocorra num momento em existe, apenas, uma mera decisão administrativa, impugnada judicialmente. 16. Donde resulta que, considerando, entre o mais, as especificidades das finalidades associadas às contraorde- nações e coimas, no quadro do mercado de valores mobiliários, exige-se que o legislador utilize critérios rigorosos
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