TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 83.º Volume \ 2012

248 TRIBUNAL CONSTITUCIONAL menor sentido invocar a falta de inquérito, por estarmos em âmbitos completamente diferentes e nenhuma norma legal existe no RGCOC e no CVM que imponham exigência» (cfr. p. 149 do Acórdão recorrido). Ora, só pode isto significar que o Tribunal interpretou o artigo 54.º, n. os  1 e 2, do RGCOC, no sentido de que a atividade de investigação e obtenção de prova, em processo de contraordenação, pode ser realizada pelas entidades administrativas fora da existência de um processo contraordenacional formalmente instau- rado, podendo as mesmas, conforme diz expressamente o Tribunal, ser realizadas «no âmbito dos poderes de supervisão». e) a norma extraída dos artigos 360.º, n.º 1, alínea e) , 361.º, n.º 2, 381.º, 389.º, n.º 3, alíneas b) e c) , 401.º 1, n.º 1 e 408.º, n.º 1, do CVM, 33.º, n.º 1, 41.º, n.º 2, e 54.º, n.º 2, do RGCOC, 125.º, 126.º, n. os  1 e 2, alínea a) , n.º 3, 241.º, e 262.º do CPP, interpretados no sentido de que a CMVM, enquanto Autoridade Administrativa reguladora e supervisora, pode acusar e condenar uma pessoa coletiva sujeita à sua supervi- são com base em provas, nomeadamente documentos, obtidas dessa mesma pessoa coletiva no âmbito de um procedimento de supervisão de caráter não sancionatório, ao abrigo dos seus poderes de supervisão e sob a cominação implícita da prática de uma contraordenação, nos termos do artigo 389.º, n.º 3, alíneas b) e c), do CVM – ou outras imputáveis à luz do mesmo Código –, ou de um crime de desobediência, previsto no artigo 381.º do CVM, já depois de aquela entidade ter tido noticia de factos com eventual relevância contraordenacional, mas sem que tenha instaurado o respetivo processo contraordenacional e sem que tenha informado a visada de que era suspeita da prática de atos ilícitos contraordenacionais e/ou que estava a investigar a prática de factos ilícitos contraordenacionais. A este propósito, é necessário referir que o Tribunal recorrido enfrentou expressamente a referida questão de inconstitucionalidade, entre o mais, nos seguintes termos: «tendo em conta os princípios de supervisão (artigo 358.º do CVM), procedimentos de supervisão (artigo 360.º do CVM) e o exercício dessa mesma supervisão (artigo 361.º do CVM), dúvidas não restam que existe uma clara limitação ou restrição do princípio nemo tenetur se ipsum accusare que deve ceder perante o regime previsto no CVM, que tem aco- lhimento constitucional expresso, como acima referimos. Tal restrição é manifestamente extensiva a toda a fase de recolha e análise de documentação que a entidade bancária está obrigada a entregar à entidade supervisora, seja por mera rotina, seja a pedido desta» (cfr. p. 143 do Acórdão recorrido). 2. Normas e princípios constitucionais que se considera terem sido violados: a) a norma constante do artigo 389.º, n.º 1, alínea a) , do CVM, ao prever que a prestação de toda e qualquer informação sem as qualidades referidas no próprio artigo 389.º, n.º 1, alínea a) , do CVM, é punida com coima, sem identificar e delimitar o agente, objeto, natureza e/ou os efeitos sobre o mercado dessa mesma informação, conforme referido no ponto 1, alínea a) , supra , aplicada pelo Acórdão recorrido, ao não asse- gurar o caráter certo e determinado do tipo contraordenacional, viola assim o artigo 29.º, n. os 1 e 3, da Constituição da República Portuguesa. b) a norma constante do artigo 389.º, n.º 1, alínea a) , do CVM, ao prever que toda e qualquer prestação de informação sem qualidade traduz, independentemente de quem a presta e do objeto, natureza e/ou efeitos sobre o mercado dessa mesma informação, uma contraordenação «muito grave», conforme referido no ponto 1, alínea b) , supra , aplicada pelo Acórdão recorrido, viola o princípio da necessidade da punição e o princípio da proporcionalidade da punição, quer no seu sentido relativo, quer no seu sentido absoluto, ambos previstos no artigo 18.º, n.º 2, da Constituição da República Portuguesa, violando igualmente o princípio da culpa, previsto no artigo 1.º e 27.º da Constituição da República Portuguesa, e o princípio da igualdade, previsto no artigo 13.º da Constituição da República Portuguesa. c) a norma do artigo 360.º, n.º 1, alínea f ), do CVM, interpretada no sentido de que a CMVM, enquanto autoridade reguladora e de supervisão, pode dar ordens que coloquem o Arguido na situação de, inevita- velmente e em alternativa, confessar a prática de um ilícito, incorrer na prática de um crime ou incorrer na prática de uma contraordenação, conforme referido no ponto 1, alínea c) , supra , aplicada pelo Acórdão recorrido, viola os direitos à presunção de inocência, ao silêncio e à não autoincriminação, bem como

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