TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 83.º Volume \ 2012
231 acórdão n.º 73/12 6. Mais resulta dos elementos do processo que o objeto do recurso se encontra restringido à apreciação da constitucionalidade da norma do artigo 26.º, n.º 2, da Lei da Concorrência (segundo recurso interposto), uma vez que o primeiro recurso apresentado, destinado à apreciação da norma do artigo 55.º, n.º 3, do Decreto-Lei n.º 433/82, foi, por despacho do primitivo Relator, julgado manifestamente improcedente à luz da jurisprudência reiterada deste Tribunal Constitucional, não tendo tal despacho sido impugnado pelas recorrentes que, pelo contrário, apresentaram alegações versando apenas aquele primeiro recurso. 7. Importa agora apreciar a questão suscitada pelo primitivo Relator, no despacho de fls. 350, quanto à eventual falta de pressupostos para conhecer do objeto do recurso respeitante à constitucionalidade da norma do artigo 26.º, n.º 2, da Lei da Concorrência (LdC). Levanta-se a questão, nesse despacho, da eventual não coincidência da dimensão normativa objeto do presente recurso com a interpretação normativa da mesma norma, aplicada pelo tribunal recorrido, uma vez que as recorrentes sustentam que a audiência oral a que se refere aquela norma tem natureza de diligência probatória, enquanto que a sentença recorrida considerou-a um instrumento de defesa que, por isso, apenas diz respeito ao arguido respetivo. Em resposta, as recorrentes sustentam que a interpretação reputada inconstitucional é a adotada pela decisão recorrida como sua ratio decidendi e salientam que a fiscalização da constitucionalidade da interpre- tação em causa não pode ser impedida com base «na formulação de um “pré-juízo” meramente formal de qualificação da audiência oral no sentido de que a mesma “não é uma diligência probatória”». O presente recurso vem interposto para apreciação da constitucionalidade da norma do artigo 26.º, n.º 2, da LdC, quando interpretada no sentido de não conferir aos coarguidos em processo contraordenacio- nal e respetivos defensores o direito de assistência e participação na audiência oral prevista naquela norma. É o que resulta, quer do requerimento de interposição de recurso (cfr. ponto 5.º, a fls. 217), quer das alegações das recorrentes (cfr. ponto I – Enquadramento e conclusão I., respetivamente a fls. 230 e 254). A sentença do Tribunal de Comércio de Lisboa, aqui recorrida, na parte que agora releva, começa por analisar a “natureza e regime da audição oral prevista no artigo 26.º, n.º 2, da LdC”, afirmando que a audição oral «corresponde ao exercício do direito de defesa mediante uma concretização do direito dos arguidos a serem ouvidos», isto é, «um meio que o legislador dá às arguidas de substituir ou complementar a sua defesa escrita, ou seja, de apresentar os argumentos que entenderem relativamente à imputação que lhe é feita na nota de ilicitude». De seguida, a sentença salienta que a audição oral é «distinta de um interrogatório de arguido ou de um debate instrutório», nela não havendo lugar «à inquirição da arguida nem são colocadas quaisquer perguntas perante a sua exposição». Finalmente, faz notar que «tal como sucede com a resposta escrita, juntamente com a resposta oral pode a arguida juntar ao processo documentos e, nessa medida apre- sentar meios de prova. Mas daqui não resulta que a audição seja, em si mesmo, uma diligência probatória tal como não o é a resposta escrita apresentada pela arguida». É com base nesta análise que o Tribunal de Comércio de Lisboa decidiu manter a decisão da Autoridade da Concorrência que indeferiu a solicitação de presença dos advogados constituídos pelos arguidos na audi- ência oral requerida pela coarguida. É inquestionável que, ao assim decidir, a sentença recorrida interpretou a norma do artigo 26.º, n.º 2, da LdC, no sentido de não conferir aos coarguidos o direito de assistir e participar na audiência oral prevista naquela norma – exatamente o sentido enunciado pelas recorrentes como objeto do recurso. Essa conclusão é, aliás, expressamente afirmada em vários trechos da fundamentação, por exemplo, a fls. 50 e 52 dos autos. É certo que a conclusão a que chegou o tribunal recorrido parte de uma análise prévia do regime infra- constitucional desta audiência oral para, a partir dele, qualificar juridicamente a audiência em causa. Mas essa análise não é um elemento da norma reputada inconstitucional, antes é um dos elementos convocados para a apreciação e resolução do problema colocado pela interpretação normativa reputada inconstitucional. Ou seja, a decisão recorrida não chega a uma conclusão diferente da pretendida pelas recorrentes por adotar uma interpretação diversa da norma do artigo 26.º, n.º 2, da LdC. Antes analisa de modo diverso o respetivo regime para dele extrair a regra que, precisamente, as recorrentes reputam inconstitucional.
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