TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 83.º Volume \ 2012

220 TRIBUNAL CONSTITUCIONAL dispensado, por inutilidade, de proceder a maior pormenorização além da que resulta da indicação feita em tais termos quando o arguido confrontado com ela tome a posição de negar os factos». Em ambos os arestos estava essencialmente em causa o conteúdo do interrogatório quanto à comuni- cação ao arguido dos factos subjacentes à detenção e dos elementos indiciadores dos factos imputados ao arguido, tendo o Tribunal sancionado que a exposição dessa factualidade assumisse “ um grau de generalidade demasiado extensa, difusa e imprecisa” sem concretização das circunstâncias de tempo, modo e lugar em que os factos ocorreram, por tal determinar uma impossibilidade do arguido de exercer o seu direito de defesa e de contraditar os factos constantes do processo e que determinaram a detenção do arguido e, na sequência, a aplicação da medida de coação de prisão preventiva, tendo em conta não apenas o parâmetro constante do n.º 1 do artigo 32.º da norma normarum , mas também a injunção constitucional de que a detenção seja “submetida, no prazo máximo de quarenta e oito horas, a apreciação judicial, para restituição à liberdade ou imposição de medida de coação adequada, devendo o juiz conhecer das causas que a determinaram e comunicá-las ao detido, interrogá-lo e dar- lhe oportunidade de defesa”, como resulta do artigo 28.º, n.º 1, da Constituição. No caso sub judicio, cumpre salientar que a questão decidenda se distancia, na sua essência, das que foram consideradas nos arestos citados, sendo patente a assimetria normativa entre o objeto do presente recurso de constitucionalidade e os referidos critérios normativos sindicados e sancionados por este Tribunal, porquanto e em bom rigor, o recorrente não contesta a suficiência dos factos que lhe foram comunicados em aplicação do disposto no artigo 141.º, n.º 4, do CPP, para sobre eles poder defender-se perante a detenção e a aplicação da medida de coação, mas sim a possibilidade de, na acusação do Ministério Público, serem incluídos factos concretos com os quais o arguido não foi confrontado durante o inquérito. 9. A lei adjetiva penal inclui o interrogatório no âmbito do inquérito como um momento obrigatório, independentemente da detenção do arguido, permitindo, assim que o arguido, ainda nessa fase, seja con- frontado com factos e elementos colhidos no âmbito da investigação relevantes para a decisão de acusação ou de arquivamento do inquérito, para que sobre eles possa pronunciar-se, em conformidade, necessariamente, com o princípio constitucional consagrado no artigo 32.º, n.º 1 da Constituição. Existindo detenção do arguido, a exigência constitucional, ao nível das garantias de defesa, é bem mais rigorista, porquanto impõe, desde logo, a apresentação do detido à autoridade judicial competente para que este seja interrogado como arguido, interrogatório esse que visa reduzir ao mínimo possível os riscos de uma privação ilegal de liberdade, exigindo-se, logo nesse momento, a obtenção de um juízo judicial sobre a lega- lidade/ilegalidade da detenção e a definição da situação processual futura do arguido – artigos 27.º, n.º 4, 28.º, n.º 1, e 32.º, n.º 1, da Constituição. Nesse contexto específico e como se afirma no Acórdão n.º 607/03, “(…) o interrogatório está [aqui] predestinado essencialmente para o arguido apresentar, de viva voz ou por escrito, a sua defesa”, reconhe- cendo a Constituição ao detido esse específico direito relativamente aos factos e razões que determinam a sua detenção. Trata-se, neste caso, de um interrogatório essencialmente garantístico, conformado de modo a garantir ao arguido detido uma defesa efetiva perante as razões que justificam a detenção, impondo-se, nessa medida, que lhe sejam dados a conhecer os elementos suficientemente indiciadores da responsabilidade penal já existentes no inquérito e, obviamente, os pressupostos da aplicação da medida de coação promovida pelo Ministério Público (cfr. Germano Marques da Silva, “Sobre a liberdade no processo penal ou do culto da liberdade como componente essencial da prática democrática”, em Liber discipulorum para Figueiredo Dias , Coimbra, 2003, p. 1372). Ainda assim, mesmo neste âmbito, não será exigível que ao arguido seja dado um conhecimento total e irrestrito dos factos previamente recolhidos e dos respetivos meios de prova, devendo ponderar-se con- cretamente se a divulgação dos factos em causa é, ou não, passível de afetar gravemente a investigação e

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