TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 83.º Volume \ 2012

183 acórdão n.º 24/12 O acolhimento de genéricos prazos de caducidade subjetivos salvaguarda, sem lacunas, a efetiva possibilidade de o interessado recorrer a juízo para ver reconhe­cido o vínculo de filiação com o seu progenitor. E mais do que isso. Em face do teor das alíneas b) e c) do n.º 3, mesmo quando o investigante dispõe de elementos probatórios que lhe permitem sustentar, com viabilidade de sucesso, dentro do prazo fixado no n.º 1, a sua pretensão de reconhe­cimento como filho de determinada pessoa, relevam os factos ou circunstâncias que possam justificar que, só após o termo final de tal prazo, ele tome essa iniciativa. Por conseguinte, a lei civil portuguesa não adotou a regra da “imprescri­tibili­dade” do direito de investigação de paternidade e continuou a insistir na necessi­dade de existência de limites temporais ao exercício desse direito, tendo embora configurado esses limites com um novo figurino e duração.» Se este novo figurino não permite que possamos qualificar a Lei n.º 14/2009, de 1 de abril, como uma lei interpretativa (vide, neste sentido, Batista Machado em Sobre a aplicação no tempo do novo Código Civil , p. 288, da edição de 1968, da Almedina), seguramente que ele não veio introduzir novas restrições, anterior- mente não previstas, nem procedeu ao alargamento ou agravamento de restrições já consagradas por lei pré- via ao direito ao reconhecimento judicial da paternidade, mas, pelo contrário, desagravou significativamente a severidade do sistema de prazos de caducidade que vigorava anteriormente à sua aprovação. Daí que, mesmo não se isolando o prazo atualmente previsto no artigo 1817.º, n.º 1, do Código Civil, do sistema de prazos de caducidade previstos nos demais números desse artigo, não é possível concluir que as alterações introduzidas pela Lei n.º 14/2009, de 1 de abril tenham vindo introduzir novas restrições, ante- riormente não previstas, ou a proceder ao alargamento ou agravamento de restrições já consagradas por lei prévia ao direito ao reconhecimento judicial da paternidade, pelo que não estamos perante uma lei contendo normas restritivas de direitos fundamentais que se pudesse considerar abrangida pela proibição prevista no artigo 18.º, n.º 3, da Constituição. Por estas razões, encontrava-se na esfera de liberdade do legislador ordinário optar por um regime de aplicação da lei no tempo como aquele que foi criado no artigo 3.º da Lei n.º 14/2009, de 1 de abril, uma vez que o mesmo não respeitava a normas que pudessem ser consideradas restritivas de direitos fundamentais. Por isso me pronunciei pela não inconstitucionalidade da norma aqui fiscali­zada. – João Cura Mariano. DECLARAÇÃO DE VOTO A posição que defendi – a da não inconstitucionalidade da norma do 3.º da Lei n.º 14/2009, de 1 de abril – parte do princípio de que o juízo sobre as normas transitórias formais, como é a norma questionada, é absolutamente autónomo do juízo que mereça o conteúdo e o alcance prescritivos da norma mandada aplicar. Tratando-se de normas sobre normas, sobre a vigência temporal de normas que substituem outras anteriormente em vigor, o que conta são apenas os parâmetros que regem a sucessão de leis no tempo e não os que controlam o modo de composição substancial dos interesses regulados pelo novo preceito. Só quando a aplicabilidade temporal do regime antigo ou do regime que lhe sucedeu é feita depender dos seus sentidos normativos, por força do disposto na própria norma transitória – assim acontece no âmbito do direito penal – é que temos que atender aos conteúdos reguladores. Sufrago a tese do Acórdão n.º 164/11 de que a imposição de limites temporais para o exercício do direito de investigar a paternidade deve ser tratada como uma restrição ao direito fundamental à identidade pessoal, desencadeando, nessa medida a aplicação da regra do artigo 18.º, n.º 3, da Constituição da Repú- blica Portuguesa. Mas dele divirjo por considerar que esta norma não é violada, pois a aplicação do novo prazo de caducidade aos processos pendentes (o mesmo é dizer, a situações jurídicas ainda não definitiva- mente consolidadas) não configura um caso de retroatividade autêntica.

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