TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 83.º Volume \ 2012

172 TRIBUNAL CONSTITUCIONAL dessa Lei n.º 14/2009”, tendo por fundamento a violação do princípio da proteção da confiança, ínsito no princípio do Estado de direito democrático, previsto no artigo 2.º da CRP. No mencionado Acórdão n.º 164/11 julgou-se inconstitucional, por violação do n.º 3 do artigo 18.º da Constituição, a norma constante do artigo 3.º da Lei n.º 14/2009, de 1 de abril, na medida em que manda aplicar, aos processos pendentes à data da sua entrada em vigor o prazo previsto na nova redação do artigo 1817.º do Código Civil, aplicável por força do artigo 1873.º do mesmo Código. 9. O presente conflito jurisprudencial haverá de ser dirimido tendo em atenção, necessariamente, a fun- damentação que foi vertida em ambos os arestos supracitados, desde logo, por neles se encontrarem vertidos os principais argumentos que justificam a opção por uma ou outra das decisões que em cada um deles veio a ser adotada, que, como já se deixou afirmado, se apresentam de sentido contrário, sendo que constituem as soluções de mérito possíveis. No caso presente, entende-se que deve ser seguido o entendimento perfilhado pelo Tribunal e que se mos- tra plasmado no Acórdão n.º 164/11, razão pela qual se seguirá, naturalmente, a jurisprudência nele vertida. 10. No mencionado Acórdão n.º 164/11, em justificação da decisão nele proferida, foi desenvolvida a seguinte argumentação: «(…) 6. Sucede, porém, e é este um dos pontos fundantes do juízo de inconstitucionalidade proferido pelo tribunal a quo, que em janeiro de 2006 decidiu o Tribunal Constitucional, no Acórdão n.º 23/06, declarar com força obri- gatória geral a inconstitucionalidade “da norma constante no n.º 1 do artigo 1871.º do Código Civil, aplicável por força do artigo 1873.º do mesmo Código, na medida em que prevê, para a caducidade do direito de investigar a paternidade, um prazo de dois anos a partir da maioridade do investigante, por violação das disposições conjugadas dos artigos 26.º, n.º 1, 36.º, n.º 1, e 18.º, n.º 2, da Constituição da República Portuguesa.” Efeito da declaração de inconstitucionalidade de uma norma é, como prescreve o n.º 1 do artigo 282.º da CRP, a repristinação da norma ou das normas que aquela outra declarada inconstitucional entretanto tenha revogado. Assim, e como ao instituir o prazo de dois anos para a interposição da ação de investigação da paternidade (contados a partir da maioridade ou emancipação do investigante), o legislador do Código, em 1966, revogara as normas constantes do Decreto n.º 2 de 1910 (que estabelecia, em comparação com o modelo do Código, um regime “liberalizante”, que não cabe agora descrever, quanto ao tempo de exercício do poder de investigar), seria em princípio esse o Direito vigente sobre a questão, a aplicar pelos tribunais comuns após a declaração de inconsti- tucionalidade, com força obrigatória geral, da norma contida no n.º 1 do artigo 1817.º do Código Civil. No entanto, e perante dúvidas que se colocaram a esses mesmos tribunais quanto à própria conformidade desse Direito pretérito face à ordem constitucional vigente, estabeleceu-se orientação jurisprudencial no sentido de se não dar como repristinado o regime de 1910. Perante a inexistência de um prazo que fosse legalmente fixado de caducidade das ações de investigação da paternidade, entendeu-se igualmente (se bem que de forma não intei- ramente unânime) que seria de aceitar o princípio da imprescritibilidade de tais ações, que assim se tornariam, portanto, cognoscíveis a qualquer tempo. É a este entendimento jurisprudencial que vem pôr cobro a Lei n.º 14/2009, de 1 de abril, ao estabelecer, na nova redação que confere ao n.º 1 do artigo 1817.º do Código Civil, que as ações de investigação da paternidade só podem ser interpostas durante os dez anos subsequentes à maioridade ou emancipação do investigante. 7. Como já se sabe, não é a fixação legal deste novo prazo de caducidade [das ações de investigação da paterni- dade] que está em juízo no presente recurso. O que se pede que o Tribunal aprecie é outra questão, relativa à norma de direito transitório inscrita no artigo 3.º da Lei de 2009, que manda aplicar o regime dela constante aos processos pendentes no momento da sua entrada em vigor. Entende a decisão recorrida que tal norma lesa o princípio da proteção da confiança, decorrente do artigo 2.º da Constituição da República Portuguesa, por “projetar retroactivamente, nos processos pendentes à data da

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