TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 83.º Volume \ 2012

154 TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Anabela Rodrigues, “Da afirmação de direito à proteção de direitos dos reclusos: a jurisdicionalização da execução da pena de prisão”, in Direito e Justiça , vol. especial, 2004, Faculdade de Direito da Universidade Católica Portuguesa, pp. 183-195, p. 195). Mas a razão decisiva para o problema em apreciação decorre do próprio estatuto constitucional do recluso. Embora o citado n.º 5 do artigo 30.º da Constituição não se refira expressamente à tutela judicial, pode dizer-se que «tal tutela estará sempre pressuposta em todo o seu conteúdo» (assim Damião da Cunha, ob. cit., 691). Na verdade, o direito de acesso ao tribunal não é mais do que a garantia adjetiva necessária à efe- tivação dos direitos fundamentais do recluso e, por isso, é necessariamente um dos direitos cuja titularidade o recluso mantém. No mesmo sentido se pronunciou o Tribunal Europeu dos Direitos do Homem (TEDH), no caso Ste- garescu e Bahrin c. Portugal (acórdão de 6 de abril de 2010, Recurso n.º 46194/06), em que os requerentes invocavam, além do mais, não ter tido possibilidade de impugnar contenciosamente as decisões dos serviços prisionais que determinaram a sua transferência para unidades prisionais diferentes daquela a que estavam inicialmente afetos e a sua colocação em quartos de segurança (à data deste acórdão ainda estava em vigor o Decreto-Lei n.º 265/79, de 1 de agosto, que antecedeu o atual CEPMPL). O TEDH decidiu ter ocorrido violação do artigo 6, § 1, da Convenção Europeia dos Direitos do Homem, ainda que salientando que o “direito a um tribunal” não é um direito absoluto e que os Estados gozam de uma certa margem de apreciação no estabelecimento de limitações no acesso aos tribunais, desde que essas restrições sejam justificadas e proporcionais e não limitem de tal forma o acesso a ponto de porem em causa a substância do próprio direito. Em aplicação desse critério, e apoiando-se em jurisprudência anterior, concluiu o Tribunal que a existência de um processo judicial que permita ao recluso impugnar os atos com repercussões importantes sobre os seus direitos civis é uma exigência do justo equilíbrio entre, por um lado, as restrições necessárias à administração do meio penitenciário e, por outro, os direitos do recluso. Também o ponto 70.3. da “ Recomendação REC(2006)2 do Comité de Ministros aos Estados Membros sobre as Regras Penitenciárias Europeias” (adotada na 952.ª reunião de Delegados dos Ministros, de 11 de janeiro de 2006) prevê que o recluso tenha o “direito de recorrer” das decisões que o afetem para uma “enti- dade independente”. Conclui-se, assim pela desconformidade constitucional de uma interpretação normativa do artigo 200.º do CEPMPL no sentido de a decisão de manutenção do regime de segurança não ser impugnável. III – Decisão Nestes termos, e pelos fundamentos expostos, decide-se: Julgar inconstitucional, por violação do disposto nos artigos 20.º, n.º 1, e 30.º, n.º 5, da Constituição, a norma do artigo 200.º do Código da Execução das Penas e Medidas Privativas da Liberdade (aprovado pela Lei n.º 115/2009, de 12 de outubro), quando interpretada no sentido não ser impugnável a decisão administrativa de manutenção do recluso em regime de segurança; Consequentemente, conceder provimento ao recurso, devendo a decisão recorrida ser reformulada em conformidade com o presente juízo de inconstitucionalidade. Lisboa, 12 de janeiro de 2012. – Joaquim de Sousa Ribeiro – José da Cunha Barbosa – Catarina Sarmento e Castro – João Cura Mariano – Rui Manuel Moura Ramos . Anotação: 1 – Acórdão publicado no Diário da República, II Série, de 27 de fevereiro de 2012. 2 – Os Acórdãos n. os 496/96, 638/06 e 427/09 estão publicados em Acórdãos, 33.º, 66.º e 75.º Vols., respetivamente.

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