TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 83.º Volume \ 2012
109 acórdão n.º 8/12 um propósito claro. Em princípio, os credores da insolvência reclamam a verificação dos seus créditos dentro do prazo designado para o efeito na sentença declaratória da insolvência, prazo esse que pode ser até 30 dias [artigo 36.º, alínea j) , artigo 128.º, n.º 1, do CIRE]. Findo esse prazo, há no entanto ainda a possibilidade de reconhecimento de outros créditos, dispondo os seus titulares, para esse efeito, do meio processual consis- tente na ação de “verificação ulterior”, a interpor, precisamente, nos termos do referido artigo 146.º. A razão pela qual a lei põe à disposição dos credores este específico meio processual – que abre ainda a possibilidade de uma verificação de créditos tardia, porque reclamada para além do tempo regular – prende-se com o motivo exposto no preâmbulo do Decreto-Lei n.º 53/2004, de 18 de março, que, ao abrigo da autorização legislativa concedida pela Lei n.º 39/2003, de 22 de agosto, aprovou o CIRE. Diz-se aí que “[o] objetivo precípuo de qualquer processo de insolvência é a satisfação, pela forma mais eficiente possível, dos direitos dos credores”. Uma regulação processual assim dirigida por esta finalidade precípua contém, razoavelmente, um instrumento destinado especialmente a permitir a verificação de créditos tardia, não reclamada no prazo geral, designado nos termos da lei. No entanto, e porque é também finalidade da ordenação do processo de insolvência, igualmente reco- nhecida pela referida exposição de motivos, a promoção da sua celeridade, a traduzir-se na “necessidade de rápida estabilização das decisões judiciais, que no processo de insolvência se faz sentir com particular intensi- dade”, será também compreensível, em princípio, a fixação, pelo legislador ordinário, de um prazo de cadu- cidade da ação de verificação ulterior de créditos. Resta no entanto saber se o concreto regime de caducidade que a norma sob juízo estabeleceu se conforma, ou não, com as exigências constitucionais in casu pertinentes. 6. Tem o Tribunal Constitucional geralmente entendido que as normas de direito ordinário que estabe- lecem prazos para a interposição de ações em tribunal não infringem qualquer norma ou princípio consti- tucional, na medida em que apenas revelam escolhas legítimas do legislador quanto aos vários modos pelos quais podem ser prosseguidos os diferentes valores que a Constituição inscreve, em última análise, no seu artigo 20.º Foi o que sucedeu, por exemplo, no caso do Acórdão n.º 247/02, em que estava em juízo a norma do Código de Processo Penal que estabelecia, perentoriamente, o prazo de um ano, contado desde o momento em que o detido ou preso fora libertado ou desde o momento em que fora definitivamente decidido o processo penal respetivo, para a apresentação de pedidos de indemnização contra o Estado por privação de liberdade ilegal ou injustificada. Foi também o que sucedeu (ainda como exemplo) no caso do Acórdão n.º 310/05, em que estava em juízo a norma do Código de Processo Civil que impunha um prazo de cinco anos, contados desde o trânsito em julgado da decisão recorrida, para a interposição do recurso de revisão. Nestes casos, e em outros que não vale a pena agora recensear, entendeu-se que, ao fixar na lei de processo prazos de caducidade de ações, o legislador harmonizava de forma côngrua diferentes exigências constitucio- nais: por um lado, as decorrentes do direito de acesso ao direito e à tutela jurisdicional (artigo 20.º, n.º 1); por outro, as decorrentes do princípio de segurança jurídica que justifica a proteção constitucional do caso julgado (artigo 2.º e artigo 20.º, n.º 4). É certo que a esta jurisprudência – que evidentemente se mantém – se apõe em tese um limite. A har- monização entre as diferentes exigências constitucionais acima mencionadas deixa de ser côngrua sempre que se demonstrar que, ao fixar um certo prazo de caducidade de uma ação, o legislador ordinário ofendeu uma posição jurídica subjetiva constitucionalmente tutelada, diminuindo, de modo juridicamente censurável, as possibilidades de exercício de um direito que a CRP consagra. Sustenta o recorrente que será precisamente assim quanto à norma sub judicio , pois que através dela se terão lesado “os direitos constitucionais consagrados dos credores”, tutelados, no seu entender e desde logo, pelo artigo 62.º da CRP. No entanto, e como o Tribunal sempre tem dito, o artigo 62.º, que consagra a garantia constitucional do património privado, não protege em si mesmo os direitos de crédito. O conteúdo destes direitos é determi- nado pela lei e não pela Constituição, pelo que as concretas posições jurídico-subjetivas que na sua estrutura
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