TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 82.º Volume \ 2011

90 TRIBUNAL CONSTITUCIONAL onera-as pesadamente com uma duplicação de estruturas e um acréscimo de custos, com que a iniciativa privada se não confronta. E nem se diga que esse é o preço a pagar pela abertura da “oportunidade de participação no mercado”, como se lê no Acórdão, e que a solução representa “o justo equilíbrio, permitindo, por um lado, o acesso das entidades sociais à titularidade das farmácias”, salvaguardando, por outro, “o princípio constitucional da igualdade de concorrência com os demais operadores”. O Decreto-Lei n.º 307/2007 nenhuma faculdade concede a estas entidades – mormente a de participação no mercado – que elas já não detivessem ao abrigo do regime geral da sua capacidade, mesmo numa leitura estrita, hoje maioritariamente superada, do princí- pio da especialidade. O que se nos depara é antes o sacrifício do interesse social, em nome da igualdade de concorrência, que não tem “peso” constitucional bastante para legitimar a solução. A perspectiva que tenho por correcta é a inversa, ou seja, são os valores de ordem social constitucionalmente tutelados pelo reconhecimento do sector cooperativo e social e pela injunção de apoio constante do n.º 5 do artigo 63.º que justificam algum desvio, a existir, a regras estritas de concorrência. Por tudo o que fica dito, pronunciei-me no sentido de uma declaração de inconstitucionalidade das normas dos artigos 14.º, n.º 1, 47.º, n.º 2, alínea a) , e 58.º do Decreto-Lei n.º 307/2007 com um objecto mais alargado, sem a restrição constante da alínea a) da decisão. 2. Desta posição decorre que também considero inconstitucional a norma do n.º 3 do artigo 14.º, na parte em que faz incidir o regime fiscal aplicável às sociedades comerciais sobre as pessoas colectivas desta natureza a constituir obrigatoriamente pelas entidades do sector social actuantes na área farmacêutica. A inadmissibilidade do ónus de constituição dessas sociedades comerciais acarreta a inadmissibilidade de apli- cação do regime correspondente, incluindo o regime fiscal. Independentemente disso, creio que existe também fundamento de inconstitucionalidade orgânica, por desrespeito aos artigos 165.º, n.º 1, alínea i), e 103.º, n.º 2, da Constituição. Ao determinar a aplicação do regime fiscal das sociedades comerciais, a norma impugnada faz as enti- dades do sector social perder as isenções fiscais de que gozam, implicando, pelo menos para as que, antes da entrada em vigor do Decreto-Lei n.º 307/2007, já exercitavam a actividade farmacêutica, uma alteração, no sentido do agravamento, da sua situação tributária. Ora, a lei de autorização (Lei n.º 20/2007) não faz qual- quer menção específica, como seria necessário, a matéria fiscal, habilitando apenas, no artigo 2.º, à “fixação das condições de acesso à propriedade de farmácias”. Esta autorização é insuficiente para a imposição da igualdade fiscal, não apenas o resultado, mas o objectivo declarado do Decreto-Lei n.º 307/2007. A inserção dessa alteração radical num enunciado que fixa as condições em que “as entidades do sector social da economia podem ser proprietárias de farmácias” não ilude a realidade substancial de que os rendimentos auferidos por essas entidades na exploração de far- mácias, até aqui isentos, passam a recair no domínio de incidência de diversos impostos. Por isso mesmo, não fico convencido pelo argumento formal, utilizado no Acórdão, de que o segmento da norma não opera a imposição de um novo regime fiscal àquelas entidades «antes esclarecendo que as sociedades comerciais que aquelas devamconstituir para poderem ser proprietárias de farmácias se sujeitam ao regime fiscal típico das sociedades comerciais». – Joaquim de Sousa Ribeiro. DECLARAÇÃO DE VOTO  Dissenti da presente decisão, tendo-me pronunciado por um juízo de inconstitucionalidade de alcance mais alargado que aquele a que o Tribunal chegou neste acórdão. Um juízo que sempre incluiria o artigo 14.º, n.º 3, do Decreto-Lei n.º 307/2007 que, ao onerar as entidades do sector social com um regime fiscal que anteriormente lhes não era aplicável, se quisessem ser proprietárias de farmácias, opera uma mudança do

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