TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 82.º Volume \ 2011
86 TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Por outro lado, devendo a garantia institucional da coexistência dos sectores de produção (privado, público e social) ser vista como assegurando que cada um deles, com as suas características identitárias específicas, possa actuar nos diversos âmbitos de actividade que lhe são próprios, será excessivo impor ao sector social que actue no seu espaço normal, fora do mercado, sem que se possa apresentar com a sua natural identidade. Em suma, atendendo aos fins que visa alcançar – e às exigências resultantes do n.º 5 do artigo 63.º da Constituição –, a solução legislativa adoptada, ao obrigar os entes sociais que pretendam desenvolver a acti vidade farmacêutica fora do mercado, à constituição de sociedades comerciais, revela-se uma solução que não observa as exigências de equilíbrio decorrentes do princípio da proibição do excesso ínsito no princípio do Estado de Direito, consagrado no artigo 2.º da Constituição. Assim sendo, desnecessário se torna apreciar a violação do princípio da igualdade que também funda- mentava o pedido apresentado pelo Provedor de Justiça. 9. A equiparação fiscal operada pelo n.º 3 do artigo 14.º do Decreto-Lei n.º 307/2007 Quanto ao artigo 14.º, n.º 3, parte final, do Decreto-Lei n.º 307/2007, ao estabelecer que é aplicável, como condição de acesso à propriedade de farmácias por parte das entidades do sector social, o regime fiscal previsto para as sociedades comerciais, faz aplicar esse regime, não às entidades do sector social em si mesmas, mas às sociedades comerciais que estas constituíram para o exercício da actividade farmacêutica. O segmento não opera, por isso – ao contrário da leitura sustentada pelo requerente – a imposição dum novo regime fiscal àquelas entidades, antes esclarecendo que as sociedades comerciais que aquelas devam constituir para poderem ser proprietárias de farmácias, se sujeitam ao regime fiscal típico das sociedades comerciais. Ora, neste entendimento da norma, distinto do invocado pelo requerente, apenas é possível sustentar-se que o âmbito de aplicação da norma do n.º 3 é determinado pela amplitude da declaração de inconstitucio- nalidade da norma do n.º 1 do artigo 14.º, e somente nessa medida a afecta. Nas situações em que se considerou ser admissível obrigar as entidades sociais à criação de sociedades comerciais, como condição para a propriedade de farmácias, nada obsta a que a estas sociedades comerciais seja aplicado o regime fiscal regra, próprio destas pessoas colectivas. III – Decisão Pelos fundamentos expostos, o Tribunal Constitucional decide: a) Declarar a inconstitucionalidade, com força obrigatória geral, dos artigos 14.º, n.º 1, 47.º, n.º 2, alínea a) , e 58.º, do Decreto-Lei n.º 307/2007, de 31 de Agosto, na medida em que impõem às entidades do sector social que, no desempenho de funções próprias do seu escopo, constituam sociedades comerciais para acesso à propriedade das farmácias, por violação do princípio da proibi- ção do excesso ínsito no princípio do Estado de Direito (consagrado no artigo 2.º da Constituição), conjugado com o artigo 63.º, n.º 5, da Constituição; b) Não declarar a inconstitucionalidade do n.º 3 do artigo 14.º do Decreto-Lei n.º 307/2007, de 31 de Agosto. Lisboa, 13 de Dezembro de 2011. – Catarina Sarmento e Castro – Ana Maria Guerra Martins – Vítor Gomes – Carlos Fernandes Cadilha – Gil Galvão – Maria Lúcia Amaral – João Cura Mariano – Maria João Antunes – Carlos Pamplona de Oliveira (com declaração) – Joaquim de Sousa Ribeiro (vencido, de acordo com a declaração anexa) – Rui Manuel Moura Ramos [vencido quanto à alínea b) da decisão, de acordo com a declaração anexa] – [Tem voto de conformidade o Exm.º Juiz Conselheiro José Borges Soeiro que não assina por, entretanto, ter deixado de fazer parte do Tribunal] – Catarina Sarmento e Castro .
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