TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 82.º Volume \ 2011

62 TRIBUNAL CONSTITUCIONAL de prova admissíveis e o seu valor são normas de processo criminal, dado cumprirem a função instrumental de darem a conhecer “os factos juridicamente relevantes para a existência ou inexistência do crime, a punibilidade ou não punibilidade do arguido e a determinação da pena ou da medida de segurança aplicáveis” (cfr. artigo 124.º do Código de Processo Penal – C. P. Penal) cuja determinação é prosseguida pelo processo criminal. Enquanto norma que dispõe sobre o valor da análise da contraprova por confronto com o valor do exame inicial (não importando, aqui, saber se com o valor de prova taxada ou prova legal, como parece ter entendido a decisão recorrida, ou se com valor de prova sujeita a apreciação judicial segundo as regras de experiência e livre convicção do julgador), ela é uma norma processual compreendida no âmbito material do princípio afirmado no artigo 127.º do C. P. Penal. Assim sendo, o preceito, na medida em que projecta efeitos a nível da valoração da prova em processo criminal, e quando referido a contraprova efectuada mediante analisador quantitativo, apenas poderia ser editado por lei da Assembleia da República ou por decreto-lei do Governo, emitido a coberto de autorização legislativa, nos termos da alínea c ) do n.º 1 do artigo 165.º da Assembleia da República. Anote-se, porém, que, quando referida a contraprova efectuada com recurso a análise ao sangue, há-de en- tender-se que a mesma foi substituída pelo referido n.º 5 do artigo 6.º do referido Regulamento, deixando-se de colocar a questão da competência para a edição do respectivo critério normativo. 5.3 – O artigo 1.º da Lei n.º 53/2004, de 4 de Novembro, concedeu autorização ao Governo para “proceder à revisão do Código da Estrada, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 114/94, de 3 de Maio, com as alterações introduzidas pelos Decretos-Leis n. os 2/98, de 3 de Janeiro, e 265-A/2001, de 28 de Setembro, e pela Lei n.º 20/2002, de 21 de Agosto, e ainda a criar um regime especial de processo para as contra-ordenações emergentes de infracções ao Código da Estrada, seus regulamentos e legislação complementar”. E, definindo o sentido da autorização, o artigo 2.º da mesma Lei dispõe que a autorização visa “permitir a cria- ção de um regime jurídico em matéria rodoviária em conformidade com os objectivos definidos no Plano Nacional de Prevenção Rodoviária, com as normas constantes de instrumentos internacionais a que Portugal se encontra vinculado e com as recomendações das organizações internacionais especializadas com vista a proporcionar índices elevados de segurança rodoviária para os utentes”. Ora, conquanto possa entender-se que o regime em causa constante do n.º 6 do artigo 153.º do Código da Estrada cabe no objecto e no sentido da lei de autorização, certo é que, analisado o artigo 3.º da mesma Lei e tendo em conta que “a extensão da autorização especifica quais os aspectos da disciplina jurídica da matéria em causa sobre que vão incidir as alterações a introduzir por força do exercício dos poderes delegados” (cfr., entre outros, o Acórdão n.º 358/92, disponível em www.tribunalconstitucional.pt ) , não se vê que o mesmo caiba em qualquer dos que, aí, são enunciados. Assim sendo, a norma em causa padece de inconstitucionalidade orgânica. Aqui chegados, torna-se desnecessário apurar se a mesma afronta os princípios constitucionais invocados pela decisão recorrida ou pelo Ministério Público. O Tribunal concluiu, portanto, que o Governo, ao dispor inovadoramente, e sem a devida autorização, no n.º 6 do artigo 153.º do Código da Estrada, sobre o modo de valoração da prova em matéria de fiscali- zação da condução sob o efeito do álcool ou de substâncias psicotrópicas, invadiu a reserva de competência legislativa da Assembleia da República. Com efeito, estando em causa matéria com implicação penal ou processual penal, mostrava-se necessá- ria a autorização legislativa. Tal autorização não consta no entanto da Lei n.º 53/2004, de 4 de Novembro, que “autoriza o Governo a proceder à revisão do Código da Estrada, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 114/94, de 3 de Maio”. A lei habilitante é na verdade omissa no que respeita à matéria em causa – apesar das múlti- plas alíneas, de a ) a z ) e de aa ) a ee ), que compõem o seu artigo 3.º, o qual define a extensão da autorização conferida ao Governo.

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