TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 82.º Volume \ 2011
516 TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Quanto à primeira pergunta – “Concorda que a Câmara Municipal do Cartaxo contratualize a conces- são de exploração do parque público de estacionamento coberto, e de mais 620 lugares de estacionamento dispersos nas ruas circundantes ao centro, que são neste momento públicos, por um prazo de 30 anos a uma empresa privada?” –, cumpre assinalar, desde logo, que a sua formulação não pode considerar-se clara, objectiva e precisa por dela poder retirar uma incorrecta representação da realidade, susceptível de inquinar a formação de uma vontade esclarecida por parte dos respectivos eleitores. De facto, tal como a questão se encontra formulada, a mesma é compatível com uma leitura segundo a qual os lugares de estacionamento “que neste momento são públicos” deixam de o ser por virtude do contra- to de concessão, o que traduz a consideração de um errado pressuposto de facto e de direito, susceptível de fazer cair os eleitores em erro quanto ao alcance e aos efeitos da concessão. Por outro lado e considerando também o teor da segunda questão – “Concorda que a gestão do estacio- namento em espaço público no Município do Cartaxo deve ser feita pelos serviços da autarquia, e as receitas do mesmo, devem reverter para a Câmara Municipal?” –, pode igualmente concluir-se que as perguntas em análise, tal como se encontram formuladas, não permitiriam necessariamente o apuramento de um resultado concludente num sentido unívoco, como é inerente à natureza do instituto do referendo. Na verdade, a possibilidade de existirem respostas simultaneamente afirmativas ou negativas às duas questões, consente que se responda da mesma forma a perguntas de efeito antagónico, acolhendo uma solu- ção sem a correspondente rejeição de hipótese diversa, prejudicando a aferição de um resultado unívoco e o carácter dilemático do referendo. Finalmente, conjugando as duas perguntas, pode também concluir-se que as mesmas se encontram formu- ladas de modo a sugerir uma determinada resposta, porquanto omitindo-se na primeira questão qualquer refe- rência às receitas municipais e incluindo-se essa realidade, que constitui um factor de ponderação, apenas na se- gunda hipótese, o sentido da resposta pode ser induzido por uma ambígua e inexacta representação da realidade. III – Decisão Consequentemente, atento o exposto, o Tribunal Constitucional decide pronunciar-se pela ilegalidade do presente referendo local que, na sua sessão ordinária de 1 de Setembro de 2011, a Assembleia Municipal do Cartaxo deliberou realizar, e ordenar a notificação do seu Presidente para que, no prazo de 8 (oito) dias, aquele órgão deliberar, querendo, no sentido da reformulação, expurgando-a da ilegalidade. Lisboa, 3 de Outubro de 2011. – J. Cunha Barbosa – Catarina Sarmento e Castro – Ana Maria Guerra Martins – José Borges Soeiro – Vítor Gomes – Carlos Fernandes Cadilha – Gil Galvão – Maria Lúcia Amaral – João Cura Mariano – Maria João Antunes – Joaquim de Sousa Ribeiro – Carlos Pamplona de Oliveira ( vencido, conforme declaração) – Rui Manuel Moura Ramos. DECLARAÇÃO DE VOTO No memorando que apresentei à consideração do douto Tribunal propunha-se um julgamento de ile- galidade da proposta de referendo com base no seguinte: Resulta do artigo 23.º do RJRL que a convocação do referendo ocorre com a deliberação assembleia municipal que aprova a correspondente iniciativa, ficando a sua realização condicionada à prévia fiscalização do Tribunal Constitucional e à decisão do presidente do órgão executivo da respectiva autarquia quanto à respectiva data (artigos 25.º e 32.º do RJRL). Acontece que na data em que foi tomada a deliberação agora em apreço, que procedeu à convocação do referendo local, estava vigente o anúncio de eleições para os órgãos de governo próprio da Região Autónoma da Madeira, que decorrerão no próximo dia 9 de Outubro. É, assim, de considerar que a deliberação autárquica
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