TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 82.º Volume \ 2011
455 acórdão n.º 636/11 6. Tendo sido igualmente notificado para contra-alegar, o arguido nada disse. Cumpre apreciar e decidir. II – Fundamentação 7. Na interpretação do regime legal acolhida pelo tribunal a quo , não é exigível que, perante um reque- rimento para abertura de instrução, apresentado pelo assistente, que não respeite as exigências essenciais de conteúdo impostas pelo n.º 2 do artigo 287.º do CPP, e não ocorrendo nenhuma das causas de rejeição pre- vistas no n.º 3 do mesmo preceito, o juiz de instrução formule um convite para aperfeiçoamento do mesmo. Questiona o recorrente se tal interpretação do regime legal é conforme à Constituição. Sendo esse o objecto da questão submetida à apreciação do Tribunal Constitucional, é evidente que não cabe aqui tomar posição sobre a correcção de tal interpretação do regime legal. Além disso, também não é relevante a questão de saber se o caso dos autos é ou não abrangido pelo acórdão do Supremo Tribunal de Justiça n.º 7/2005, ( Diário da Assembleia da República , I Série-A, de 4 de Novembro de 2005, p. 6340), proferido nos autos de recurso extraordinário de fixação de jurisprudência, que fixou jurisprudência no sentido de que “[n]ão há lugar a convite ao assistente para aperfeiçoar o reque- rimento de abertura de instrução, apresentado nos termos do artigo 287.º, n.º 2, do Código de Processo Penal, quando for omisso relativamente à narração sintética dos factos que fundamentam a aplicação de uma pena ao arguido”. Tratando-se de matéria de direito infraconstitucional, este Tribunal é incompetente para sobre ela tomar posição. A questão de constitucionalidade é apenas a de saber se o legislador é livre para poder dispensar o convite ao aperfeiçoamento de um requerimento para abertura de instrução, apresentado pelo assistente, que não respeite as exigências essenciais de conteúdo impostas pelo n.º 2 do artigo 287.º do CPP, e não ocorrendo nenhuma das causas de rejeição previstas no n.º 3 do mesmo preceito, ou se, pelo contrário, a formulação de tal convite lhe é constitucionalmente imposta. Vejamos, pois. 8. Em processo criminal, e de acordo com o n.º 7 do artigo 32.º da CRP, “o ofendido tem o direito de intervir no processo, nos termos da lei”. O preceito, acrescentado pela revisão de 1997, tornou explícito o que já antes, por interpretação, poderia concluir-se. Conforme disse o Tribunal no Acórdão n.º 24/88 – que julgou inconstitucional a parte da norma do n.º 4 da Base V da Lei n.º 7/70, de 9 de Junho, que proibia a concessão de assistência judiciária aos ofendidos que quisessem constituir-se assistentes no exercício da acção penal por crimes públicos – já antes de 1997 decorria da Constituição, mormente do seu artigo 20.º, a neces sidade de, por alguma forma, o legislador ordinário proteger “o interesse do ofendido em contribuir para a sujeição a julgamento do ou dos autores do crime de que foi vítima.” ( Acórdãos do Tribunal Constitucional , 11.º Vol., p. 531). Assim, ao acrescentar às “garantias de processo criminal” consagradas no artigo 32.º o seu actual n.º 7, a quarta lei de revisão constitucional apenas deixou explícito o que antes, por interpretação, já poderia concluir-se: face à CRP, a lei ordinária deve conformar as normas de processo de forma a não descon- siderar o “interesse” do ofendido na realização da justiça penal. É neste contexto que os artigos 68.º a 70.º do Código de Processo Penal definem o estatuto processual do assistente. A explicitação que, em 1997, se fez da tutela constitucional deste estatuto não pode no entanto obnu- bilar três aspectos essenciais que marcam a conformação, constitucionalmente devida, das normas de direito processual penal. O primeiro desses aspectos é o relativo à natureza ineludivelmente pública do processo penal. Não é pelo facto de a Constituição ter passado, depois de 1997, a referir‑se expressamente, em sede de “garantias de processo criminal”, à condição jurídico-processual do ofendido, que o referido processo deixou de ser o que
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