TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 82.º Volume \ 2011
44 TRIBUNAL CONSTITUCIONAL imagem da capacidade do país solver os seus compromissos, para continuar a ter acesso a fontes de financia- mento, a juros razoáveis, que lhe permitam iniciar uma recuperação económica decisiva. A superioridade do peso do interesse público que presidiu à medida aqui sob fiscalização não oferece quaisquer dúvidas perante os interesses particulares afectados, assim como a aptidão dessa medida para atin- gir os objectivos definidos. O mesmo não sucede quanto à necessidade ou exigibilidade do meio escolhido em relação ao fim deseja- do. Na verdade, não basta demonstrar que a via escolhida é adequada à finalidade visada, é também necessário evidenciar-se que ela é a que menos encargos impõe aos cidadãos. Face à violação da confiança dos cidadãos e aos danos subsequentes, essa medida tem que se revelar “a mais suave”, “a mais benigna”, entre as medidas possíveis para alcançar a finalidade pretendida. Só assim se poderá concluir pela necessidade da sua aprovação. Ora, se o fim perseguido é uma redução drástica do défice das contas públicas, o mesmo tanto poderá ser obtido por via do aumento da receita como pela via da diminuição da despesa. Sabe-se que não é indiferente o combate ao défice pelo lado da receita ou pelo lado da despesa, atenta a diferença dos efeitos colaterais na economia destas opções, não podendo este Tribunal cercear a liberdade do legislador escolher o caminho que considera mais eficaz para atingir o seu objectivo, como refere o presente acórdão. Contudo, quando o corte da despesa é efectuado através da redução dos vencimentos dos funcionários públicos, a essencialidade dos referidos efeitos colaterais coincide com as consequências duma tributação dos rendimentos – redução do poder de compra da população, com reflexos na procura interna. Não está demonstrado que exista uma diferença significativa nos efeitos da opção da redução dos ven- cimentos dos funcionários públicos, relativamente a uma tributação acrescida dos rendimentos de todos os cidadãos, sendo certo que ambas alcançariam o objectivo de redução do défice público, com menores encargos para os funcionários públicos, uma vez que a distribuição do sacrifício recairia sobre um universo substancialmente mais alargado. Além de que, estando nós perante um objectivo de interesse comum a todos os cidadãos, era indiscutivelmente mais justo que a medida de redução dos rendimentos particulares não atingisse apenas os trabalhadores da função pública. Não se revelando, pois, que a medida escolhida pelo legislador para alcançar a redução do défice das contas públicas fosse a “mais benigna” entre as medidas possíveis, não se mostra preenchido o requisito da necessidade que poderia justificar a violação do princípio da confiança em nome da prossecução de um inte- resse público superior, pelo que me pronunciei pela inconstitucionalidade das normas constantes dos artigos 19.º, 20.º e 21.º da Lei n.º 55-A/2010, de 31 de Dezembro. Fixaria, contudo, por razões de evidente interesse público de excepcional relevo, a produção de efeitos da declaração de inconstitucionalidade, apenas a partir de 1 de Janeiro de 2012, permitindo assim ao legis- lador perspectivar medidas alternativas de redução do défice público que lhe permitisse atingir os objectivos definidos, utilizando-se a faculdade prevista no artigo 282.º, n.º 4, da Constituição. – João Cura Mariano . Anotação : 1 – Acórdão publicado no Diário da República , II Série, de 17 de Outubro de 2011. 2 – Os Acórdãos n. os 93/84, 22/86, 64/91, 24/92, 124/93, 362/94, 786/96 e 745/98 estão publicados em Acórdãos , 4.º, 7.º, Tomo I, 18.º, 21.º, 24.º, 28.º, 34.º e 41.º Vols., respectivamente. 3 – Os Acórdãos n. os 670/99, 304/01, 529/01, 141/02, 368/02, 360/03 e 3/10 estão publicados em Acórdãos , 45.º, 50.º, 51.º, 52.º, 54.º, 56.º e 77.º Vols., respectivamente. 4 – Os Acórdãos n. os 287/90 e 303/90 estão publicados em Acórdãos , 17.º Vol.. 5 – Os Acórdãos n. os 581/07 e 620/07 estão publicados em Acórdãos , 70.º Vol.. 6 – Os Acórdãos n. os 128/09 e 188/09 estão publicados em Acórdãos , 74.º Vol.. 7 – Ver, neste volume, o Acórdão n.º 613/11.
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