TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 82.º Volume \ 2011
428 TRIBUNAL CONSTITUCIONAL um prazo alargado de prescrição ao ilícito disciplinar, pois a prática da infracção continua a ter que ser provada, mediante um procedimento disciplinar em que é garantido ao trabalhador o direito de audiência e o de defesa. Não tem, por isso, razão de ser o argumento de que “não podendo já o Autor vir a ser condenado em proces- so penal pelo referido crime, não podemos extrair no foro laboral ilações gravosas para o trabalhador de um eventual crime pelo qual nunca virá a ser julgado”, já que, como se viu, não decorrem nenhuma dessas “ilações gravosas” para o trabalhador. 8. A solução prevista no n.º 2 do artigo 372.º do Código do Trabalho de 2003 não visa estabelecer qualquer presunção legal no sentido de o trabalhador ter cometido o ilícito correspondente, apenas retira consequências da especial gravidade da conduta imputada ao agente, que justificaria a distinção legal tradu- zida na aplicação de um mais dilatado prazo de prescrição. Dir-se-á – uma vez que o recorrente coloca a questão de inconstitucionalidade no domínio dos direitos conferidos aos arguidos em processo penal – que se a Constituição não proíbe que o legislador estabeleça prazos diversificados de prescrição para as infracções penais e para o próprio procedimento da mesma natu- reza, por maioria de razão se há-de entender que não é vedado ao legislador estabelecer prazos diferentes de prescrição para as infracções disciplinares, desde que respeite os limites excludentes da arbitrariedade. Toda- via, o paralelismo que é estabelecido, na norma impugnada, com o regime de prescrição dos ilícitos penais, absorvendo a sua justificação prática e metodológica, garante, à partida, o cumprimento das exigências da sua adequação substantiva. E a verdade é que cabe na margem de livre apreciação do legislador a previsão de prazos de prescrição diferentes nos vários domínios sancionatórios, em função da gravidade dos factos relevantes. A fixação de prazos de prescrição tem por base a necessidade de proteger o trabalhador da incerteza, evitando que a even- tual punição de uma infracção disciplinar se mantenha indefinidamente como ameaça sobre o seu emprego. Ora, é legítimo estabelecer distinções quando estão em causa infracções disciplinares de gravidade muito diversa, decorrentes da eventualidade do preenchimento abstracto de tipos penais, submetidos a prazos de prescrição de diversa duração. De resto, os próprios interesses violados pela infracção fazem sentir-se com outra intensidade, sendo até de admitir que é variável a possibilidade de a relação jurídica de emprego pros- seguir incólume, consoante a gravidade da infracção cometida (Bernardo Xavier, “Prescrição da Infracção Disciplinar”, in Revista de Direito e Estudos Sociais , 2.ª série, 1990, n.º 1-4, p. 265). Assim, no confronto entre o interesse da empresa do empregador e a garantia da segurança dos trabalha- dores, o legislador pode legitimamente dar um relevo desigual a determinadas infracções, tendo em conta a gravidade dos factos que constituam simultaneamente ilícito disciplinar e ilícito criminal. Trata-se de uma solução, aliás, adoptada por outras normas, como seja a do n.º 3 do artigo 498.º do Código Civil, onde se prevê que o prazo da prescrição é o previsto na lei penal quando o facto ilícito que consubstancia a responsabilidade civil extracontratual também constitua crime. A consagração de uma regra segundo a qual a prescrição de um ilícito de natureza disciplinar ou civil não se dá quando o mesmo facto constituir uma infracção criminal para a qual a lei estabeleça prazo de prescrição de duração superior não se mostra ofensiva da Constituição. O Tribunal também já admitiu a possibilidade de previsão de diferentes prazos de prescrição esta- belecidos em matéria disciplinar, em função da maior ou menor gravidade das infracções. No Acórdão n.º 287/00 (publicado in Diário da República , II Série, de 17 de Outubro de 2000) considerou ser legítimo ao legislador prever prazos de prescrição mais alargados para os ilícitos disciplinares cometidos na adminis- tração pública, em função precisamente da sua maior gravidade. Assim se afirmou: «Note-se, aliás, restringindo agora a nossa atenção aos diversos prazos de prescrição estabelecidos em matéria disciplinar, seja pela Lei do Contrato de Trabalho, seja pelo Estatuto Disciplinar dos Funcionários Públicos, que encontramos sempre diferenças, todas elas demonstrando a maior gravidade das infracções cometidas no âmbito da relação de emprego público. (…)
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