TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 82.º Volume \ 2011

425 acórdão n.º 625/11 no foro laboral ilações gravosas para o trabalhador de um eventual crime pelo qual nunca virá a ser julgado. Por aplicação directa (cfr. artigo 18.º n.º 1 da CRP) do preceito constitucional que estabelece a presunção de inocência, é pois de afastar a aplicação do disposto no art 372.º n.º 2 do CT. Assim há que concluir que, à data da instauração da acção disciplinar mostravam-se prescritas as infracções disciplinares relativas aos factos ocorridos em 21/5/2004, 16/6/2004 e 24/7/2004 (violação do dever de não divul­ gar informação referente à organização, métodos de produção ou negócios do empregador), por ter decorrido mais de um ano sobre a prática dos factos, pelo que, nessa parte, não acompanhamos a decisão recorrida.” (fim da transcrição) Discordando da decisão da Relação no que toca à prescrição, a ré alega que: – o artigo 372.º, n.º 2, do CT não faz depender o alargamento do prazo da prescrição da existência de queixa por parte do empregador; – o disposto naquele normativo é semelhante ao n.º 3 do artigo 498.º do CC, onde se prevê, mutatis mu- tandis , que o prazo da prescrição será o previsto na lei penal quando o facto ilícito que consubstancia a responsabilidade civil extracontratual também constitua crime: – o alongamento do prazo não viola o princípio da inocência, uma vez que a aplicação de tal disposição não comporta, em si mesma, nenhuma condenação penal. Vejamos se lhe assiste razão. Mas, antes disso, importa esclarecer que, nas contra-alegações, o autor não requereu – como podia ter feito, ao abrigo do disposto no artigo 684.º-A do CPC a ampliação do objecto do recurso no que concerne à parte da decisão em que a Relação considerou que a sua conduta integrava o crime de violação de segredo, a qual, por isso, se mostra transitada em julgado. Feito este esclarecimento, atentemos, então, no disposto no n.º 2 do artigo 372.º cuja redacção é a seguinte: “A infracção disciplinar prescreve ao fim de um ano a contar do momento em que lugar, salvo se os factos constituírem igualmente crime, caso em que são aplicáveis os prazos prescricionais da lei penal”. Como decorre da literalidade do referido normativo, para que o prazo da prescrição penal seja aplicável às infracções disciplinares (desde que, naturalmente, seja superior ao prazo previsto na primeira parte do n.º 2 do artigo 372.º do CT) basta que os respectivos factos também consubstanciem, em abstracto, a prática de um crime. Este é, realmente, o único requisito previsto no aludido normativo legal, para que o prazo geral da prescrição da infracção disciplinar – que, nos termos da primeira parte daquele normativo legal, é de um ano – seja alargado quando os factos integradores da infracção disciplinar também sejam susceptíveis de constituírem ilícito penal. Para que tal alargamento ocorra, o normativo em causa não exige a verificação de qualquer outro requisito, já que na sua letra não existe a menor referência nesse sentido, nomeadamente no que toca à necessidade de exercício da acção penal e à necessidade de apresentação de queixa-crime por parte do ofendido, quando o exercício daquela esteja dependente de queixa. Deste modo e face ao disposto no artigo 9.º n.º 2 e 3, do CC nos termos dos quais o intérprete não pode levar em conta o pensamento do legislador que não tenha na letra da lei um mínimo de correspondência verbal (n.º 2) e deve presumir que o legislador consagrou as soluções mais acertadas e soube exprimir o seu pensamento em termos adequados (n.º 3) –, torna-se evidente que a interpretação dada pela Relação ao n.º 2 do artigo 372.º do CT não pode ser acolhida, já que não tem o mínimo de correspondência verbal na letra do n.º 2 do artigo 372.º Por outro lado, também não se vislumbra que o alargamento do prazo da prescrição previsto na segunda parte do n.º 2 do artigo 372.º constitua uma ofensa do principio constitucional de presunção de inocência do arguido contido no artigo 32.º, n.º 2, da Constituição da República Portuguesa – nos termos do qual “[t]odo o arguido se presume inocente até ao trânsito em julgado da sentença de condenação (...)” , dado que o alargamento do prazo da prescrição não tem quaisquer implicações de natureza penal para o trabalhador objecto de procedimento disciplinar. Na verdade, o legislador resolveu alargar o prazo geral da prescrição da infracção disciplinar, quando os factos que a integram, abstractamente considerados, também sejam susceptíveis de integrar ilícito criminal, mas daí não fez decorrer para o trabalhador quaisquer implicações de natureza penal, ainda que em sede meramente presuntiva,

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