TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 82.º Volume \ 2011

407 acórdão n.º 579/11 A contribuição é devida pelos titulares do direito de construir em cujo nome seja emitido o alvará de licença de construção ou de obra – cfr. artigo 3.° do RCE. Entendeu o tribunal recorrido que a contribuição especial incide sobre a valorização dos terrenos ocorri- da entre 1 de Janeiro de 1994 e a data do requerimento da licença de construção, o que implica a “tributação de um facto que ocorreu antes da entrada em vigor da lei que a determinou” (cfr. fls. 78), tratando-se, por- tanto, de normas fiscais retroactivas. O tribunal considerou que a norma do artigo 2.º, n.º 1, do RCE cons- titui uma verdadeira norma de incidência real, ao definir o valor sobre que recai o imposto, tendo entendido que se estava perante um “facto tributário complexo”. Assim, para que uma lei se possa aplicar a um facto tributário de natureza complexa, seria necessário que todos os seus elementos se concretizassem no domínio de vigência da mesma, sob pena de violação do princípio da não retroactividade da lei fiscal. Vejamos se é de acompanhar esta orientação. 8. A contribuição especial foi aprovada pelo Decreto-Lei n.º 43/98, de 3 de Março, com o objectivo de tributar a valorização de que beneficiaram os prédios rústicos e terrenos para construção situados nas zonas envolventes à CRIL, CREL, CRIP, CREP e respectivos acessos, bem como à travessia ferroviária do Tejo e outros investimentos. O valor sujeito a contribuição resulta da aplicação da fórmula prevista no referido arti- go 2.º, n.º 1, do Regulamento, o qual resulta da diferença entre o valor do prédio à data em que é requerido o licenciamento de construção ou de obra, e o seu valor à data de 1 de Janeiro de 1994, corrigido por aplicação dos coeficientes de desvalorização da moeda. A contribuição incide, portanto, sobre o aumento de valor dos prédios ou terrenos localizados em zonas delimitadas que beneficiaram, substancial e excepcionalmente, de investimentos públicos avultados, os quais originaram uma valorização extraordinária dos mesmos. O diploma considera que este valor – ou melhor, a sua realização tributariamente relevante – se consome uma vez verificadas determinadas condições espe- cíficas: utilização de prédios rústicos ou terrenos para construção urbana ou demolição de prédios urbanos já existentes para neles edificar novas construções, as quais saem valorizadas pelas acessibilidades resultantes das obras públicas identificadas pelo diploma (cfr. artigo 1.º, n. os 1 e 2, do RCE). O que se apresenta como fiscalmente relevante é o momento da realização da “mais-valia”, consubstanciado no requerimento do licen­ ciamento de construção ou de obra. Este Tribunal analisou anteriormente as normas controvertidas sob o prisma da proibição da retroactividade fiscal em casos em que o requerimento da licença deu entrada antes da entrada em vigor do Decreto-Lei n.º 43/98. Mas, tendo o requerimento (e a consequente emissão da licença) ocorrido após a entrada em vigor daquele diploma, é afastada a mobilização do parâmetro contido no artigo 103.º, n.º 1, da Constituição. Ao contrário do que entendeu o tribunal recorrido, a data de 1 de Janeiro de 1994 surge, na estrutura da contribuição especial, como um mero instrumento, relevando enquanto mecanismo operacional de deter- minação do aumento de valor que é tributável. Como se referiu no Acórdão n.º 63/06, já citado, “a qualquer contribuição de melhoria subjaz a consideração de que ocorreu uma vantagem económica particular, o que só pode ser aferido por referência a uma situação patrimonial pretérita.” 9. O aumento de valor não é resultado do normal decurso do tempo verificado entre aquela data – 1 de Janeiro de 1994 – e o momento do requerimento da licença (ou da sua emissão). Este valor resulta de um outro facto, extraordinário e anormal, relacionado com investimentos públicos avultados em acessibilidades de diversa índole, as quais comportam benefícios consideráveis para os terrenos circundantes. A realização desses benefícios, resultantes não do normal decurso do tempo mas das acessibilidades entretanto execu- tadas, que é consumada no requerimento da licença de construção, é que surge como o facto tributário o qual não é, portanto, ao contrário do que entendeu o tribunal recorrido, um facto complexo. Não se visa tributar uma valorização gradual dos imóveis, mas sim a valorização que ocorre no momento em que se efectiva a possibilidade de utilização dos terrenos para o fim de construção urbana, com um valor substan- cialmente acrescido por via das obras públicas previstas no Decreto-Lei n.º 43/98, as quais tornaram viável

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