TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 82.º Volume \ 2011
401 acórdão n.º 579/11 2.3. Como já anteriormente se disse o Tribunal Constitucional, pelo Acórdão n.º 63/06, já declarou a inconsti- tucionalidade, com força obrigatória geral, da norma dos artigos 1.º, n.º 2 e 2.º do Regulamento, na interpretação segundo a qual, sendo a licença de construção requerida antes da entrada em vigor deste diploma, seria devida a contribuição especial por este instituída que, assim, incidiria sobre a valorização do terreno ocorrida entre 1 de Janeiro de 1994 e a data daquele requerimento. Tal interpretação foi considerada violadora do princípio da não retroactividade fiscal, consagrado no artigo 103.º, n.º 3, da Constituição. Para o Tribunal, se se considerasse o facto tributário relevante, o pedido de licenciamento de construção, estar- -se-ia perante uma lei (ou interpretação) retroactiva se esse pedido fosse anterior à entrada em vigor do diploma que criou o imposto (o Decreto-Lei n.º 43/98), mesmo que o alvará de licença de construção ou de obra fosse emitido já na vigência daquele diploma legal. Este entendimento não foi unânime, tendo inclusivamente sido proferido um Acórdão que não julgou incons titucional a dimensão normativa posteriormente declarada inconstitucional (Acórdão n.º 604/05). Para quem sustentava este entendimento, como a “realização” do acréscimo de valor se consumava com a emissão do alvará, se este fosse emitido estando em vigor o Decreto-Lei n.º 43/98, não ocorreria “criação retroactiva” de um tributo, mesmo que o pedido de licenciamento de construção tivesse sido apresentado antes do diploma vigorar, sendo esta também a posição que, na altura, o Ministério Público defendeu. Esta questão, no entanto, não se coloca nos presentes autos, pelas razões anteriormente referidas, quando deli mitámos o objecto do recurso. 2.4. Vejamos pois, concretamente, se a norma em causa, ao fixar a data de 1 de Janeiro de 1994, como data de aquisição, cria, retroactivamente, um imposto. É certo que – para a definição, não já dos pressupostos de facto constitutivos de imposto em causa, mas do montante do tributo, ligado à definição ou determinação da “matéria colectável” mediante avaliação pericial – a norma desaplicada manda atender a um momento temporal anterior à edição do Decreto-Lei n.º 43/98, toman- do como parâmetro de aferição do diferencial de valores – de que decorre o acréscimo extraordinário de valor do prédio – a data de 1 de Janeiro de 1994, tida como ponto temporal de referência quanto ao lançamento dos investimentos públicos que geraram o potencial acréscimo de valor dos imóveis por eles genérica e indistintamente beneficiados: na realidade, o “aumento de valor” dos prédios em causa decorre da “diferença”, da comparação entre o valor patrimonial “histórico” na referida data inicial e o seu valor “actual”, à data em que se iniciou o processo de licenciamento para construção. Deste modo – e ao contrário do que se entendeu na decisão recorrida – não estamos confrontados com uma verdadeira aplicação retroactiva da lei fiscal – como sucederia se se conferisse relevância a factos, geradores da obri- gação tributária, verificados anteriormente à data da vigência da lei nova que criou certo imposto – mas perante uma situação em que: – o facto essencial, gerador da obrigação de imposto, ocorreu posteriormente à edição da lei nova que prevê certa “contribuição de melhoria”; – de um ponto de vista instrumental – e para orientar a avaliação pericial e consequente determinação do quantum do aumento de valor ocorrido – a lei manda atender ao valor patrimonial “histórico” originário dos bens, em data anterior àquela em que foram lançados os investimentos públicos que implicaram o acréscimo substancial e extraordinário do valor dos imóveis. A nosso ver, a circunstância de – como critério orientador da avaliação pericial, prevista no n.º 2 do artigo 2.º – se mandar atender ao diferencial de valores patrimoniais concretos, estabelecidos em função da natureza e destino económico do prédio (cfr., artigo 6.º), com referência, respectivamente, à data de 1 de Janeiro de 1994 e à data em que se iniciou o processo de licenciamento que culminou na possibilidade de utilização dos terrenos para construção ou reconstrução urbana, não viola o princípio da proibição da retroactividade da lei fiscal. Como atrás se salientou, consideramos que tais critérios – e momentos relevantes – não se ligam constituti- vamente ao facto tributário, configurando-se antes como meros critérios instrumentais relevantes para orientar a avaliação pericial dos bens em causa. A realidade que se visa tributar não é uma valorização gradual e sequencial dos bens imóveis, verificada e consumada, de forma individualizável, ao longo dos vários anos – e, portanto, em
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