TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 82.º Volume \ 2011

40 TRIBUNAL CONSTITUCIONAL E a divergência de orientações e de propostas tem como pano de fundo a não coincidência dos efeitos pro- duzidos por uma ou outra categoria de medidas. Ainda que um acréscimo de receitas fiscais possa conduzir, no estrito plano contabilístico-financeiro, a ganhos pecuniários equivalentes aos resultantes de um corte de despesas, do ponto de vista dos concomitantes efeitos colaterais e das repercussões globais no sistema econó- mico-social, está longe de ser indiferente seguir uma ou outra via. Não há, nesta matéria, variáveis neutras e rigorosamente intermutáveis, pelo que as políticas a implementar pressupõem uma ponderação complexa, em que se busca um máximo de eficácia, quanto ao objectivo a atingir, e um mínimo de lesão, para outros interesses relevantes. Não cabe, evidentemente, ao Tribunal Constitucional intrometer-se nesse debate, apreciando a maior ou menor bondade, deste ponto de vista, das medidas implementadas. O que lhe compete é ajuizar se as soluções impugnadas são arbitrárias, por sobrecarregarem gratuita e injustificadamente uma certa categoria de cidadãos. Não pode afirmar-se que tal seja o caso. O não prescindir-se de uma redução de vencimentos, no quadro de distintas medidas articuladas de consolidação orçamental, que incluem também aumentos fiscais e outros cortes de despesas públicas, apoia-se numa racionalidade coerente com uma estratégia de actuação cuja defi- nição cabe ainda dentro da margem de livre conformação política do legislador. Intentando-se, até por força de compromissos com instâncias europeias e internacionais, conseguir resultados a curto prazo, foi enten­ dido que, pelo lado da despesa, só a diminuição de vencimentos garantia eficácia certa e imediata, sendo, nessa medida, indispensável. Não havendo razões de evidência em sentido contrário, e dentro de “limites do sacrifício”, que a transitoriedade e os montantes das reduções ainda salvaguardam, é de aceitar que essa seja uma forma legítima e necessária, dentro do contexto vigente, de reduzir o peso da despesa do Estado, com a finalidade de reequilíbrio orçamental. Em vista deste fim, quem recebe por verbas públicas não está em posição de igualdade com os restantes cidadãos, pelo que o sacrifício adicional que é exigido a essa categoria de pessoas – vinculada que ela está, é oportuno lembrá-lo, à prossecução do interesse público – não consubs- tancia um tratamento injustificadamente desigual. III – Decisão Pelos fundamentos expostos, o Tribunal Constitucional decide não declarar a inconstitucionalidade, com força obrigatória geral, das normas constantes dos artigos 19.º, 20.º e 21.º da Lei n.º 55-A/2010, de 31 de Dezembro (Lei do Orçamento do Estado para 2011). Lisboa, 21 de Setembro de 2011. – Joaquim de Sousa Ribeiro – Catarina Sarmento e Castro – Ana Maria Guerra Martins – José Borges Soeiro – Vítor Gomes – Carlos Fernandes Cadilha – Maria João Antunes – Gil Galvão – Carlos Pamplona de Oliveira (vencido conforme declaração junta) – J. Cunha Barbosa (vencido nos termos da declaração de voto que se junta) – João Cura Mariano (vencido, nos termos da declaração que junto) – Rui Manuel Moura Ramos . DECLARAÇÃO DE VOTO Vencido essencialmente pelas seguintes razões: As normas analisadas são, em meu entender, inconstitucionais por violação do principio do Estado de direito democrático, consagrado no artigo 2.º da Constituição, em conjugação com o princípio da igualdade decorrente do disposto nos n. os 1 e 2 do artigo 13.º e da alínea a) do n.º 1 do artigo 59.º da Constituição, que reafirma o princípio da igualdade numa vertente social.

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