TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 82.º Volume \ 2011

387 acórdão n.º 561/11 a legislação penal, por um lado, e aqueles a que se submetem as contra-ordenações”. Diferença, esta, que cobra expressão, designadamente, na natureza administrativa (e não jurisdicional) da entidade que aplica as sanções contra-ordenacionais (como se decidiu no Acórdão n.º 158/92, publicado no DR , II Série, de 2 de Setembro de 1992) e na diferente natureza e regime de um e outro ordenamento sancionatório (cfr. v. g. Acórdãos n. os 245/00 e 547/01, publicados, respectivamente, no DR , II Série, de 3 de Novembro de 2000 e de 9 de Novembro de 2001). Nestes termos, a intransmissibilidade de um juízo hipotético ou definitivo de censura ética, consubstanciado numa acusação ou condenação penal, não tem de implicar, por analogia ou identidade de razão – que não exis- te – a intransmissibilidade de uma acusação ou condenação por desrespeito de normas sem ressonância ética, de ordenação administrativa. Nem sequer se pode, pois, a partir da referida norma, obter um padrão constitucional previsto a partir do qual se pudesse censurar o referido entendimento do artigo 112.º, alínea a) , do Código das Sociedades Comerciais. Não o impõe, também, o artigo 30.º da Constituição, referido aos “Limites das penas e medidas de segurança”; não o impõe o artigo 32.º, n.º 10, da Constituição, que estende apenas os direitos de audiência e defesa do arguido aos processos de contra-ordenação e a quaisquer outros processos sancionatórios; e não o impõe a lógica de tutela do arguido que justificou a jurisprudência constitucional em matérias como o princípio da legalidade, ou a aplicação da lei mais favorável ( v. g. , Acórdãos n. os 227/92 e 547/01, publicados, respectivamente, no DR , II Série, de 12 de Setembro de 1992 e de 15 de Julho de 2001). Mais do que verificar a desconformidade de um certo sentido da norma impugnada em relação ao parâmetro invocado, conclui-se, pois, pela inexistência do pretendido parâmetro, aplicável para o efeito pretendido”.  O referido aresto, embora centrado ainda na sobredita questão da transmissão de responsabilidade por incor- poração ou fusão de sociedades, não deixa de fornecer elementos decisivos para a interpretação da norma do artigo 30.º, n.º 3, da Constituição, salientando que ela não pode servir de parâmetro uniforme para a responsabilidade penal e a responsabilidade contra-ordenacional. Procurando decifrar o sentido e alcance da norma, também Gomes Canotilho e Vital Moreira salientam que a insusceptibilidade da transmissão da responsabilidade penal está associada ao princípio da pessoalidade, daí resul­ tando como principais efeitos: (a) a extinção da pena (qualquer que ela seja) e do procedimento criminal com a morte do agente; (b) a proibição da transmissão da pena para familiares, parentes ou terceiros; (c) a impossibilidade de subrogação no cumprimento das penas. O que, em todo o caso, não obsta – como acrescentam os mesmos au- tores – à transmissibilidade de certos efeitos patrimoniais conexos das penas, como, por exemplo, a indemnização de perdas e danos emergentes de um crime, nos termos da lei civil ( Constituição da República Portuguesa Anotada , vol. I, 4.ª edição, Coimbra, 2007, p. 504). No caso vertente, importa ter em consideração, antes de mais, que não estamos perante uma qualquer forma de transmissão de responsabilidade penal ou tão pouco de transmissão de responsabilidade contra-ordenacional. O que o artigo 8.º, n.º 1, alíneas a) e b) , do RGIT prevê é uma forma de responsabilidade civil subsidiária dos administradores e gerentes, que resulta do facto culposo que lhes é imputável de terem gerado uma situação de insuficiência patrimonial da empresa, que tenha sido causadora do não pagamento da multa ou da coima que era devida, ou de não terem procedido a esse pagamento quando a sociedade ou pessoa colectiva foi notificada para esse efeito ainda durante o período de exercício do seu cargo. O que está em causa não é, por conseguinte, a mera transmissão de uma responsabilidade contra-ordenacional que era originariamente imputável à sociedade ou pessoa colectiva; mas antes a imposição de um dever indemni- zatório que deriva do facto ilícito e culposo que é praticado pelo administrador ou gerente, e que constitui causa adequada do dano que resulta, para a Administração Fiscal, da não obtenção da receita em que se traduzia o paga- mento da multa ou coima que eram devidas. A simples circunstância de o montante indemnizatório corresponder ao valor da multa ou coima não paga apenas significa que é essa, de acordo com os critérios da responsabilidade civil, a expressão pecuniária do dano que ao lesante cabe reparar, que é necessariamente coincidente com a receita que deixa de ter dado entrada nos cofres da Fazenda Nacional; e de nenhum modo permite concluir que tenha havido a própria transmissão para o administrador ou gerente da responsabilidade contra-ordenacional.

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