TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 82.º Volume \ 2011

365 acórdão n.º 546/11 No entender do Tribunal, embora da interpretação dos artigos 399.º e 400.º do Código de Processo Penal, na versão que lhe foi dada pela Lei n.º 48/2007, de 29 de Agosto, se retirasse a admissibilidade de recurso para o Supremo Tribunal de Justiça, interposto pelo Ministério Público ou pelo assistente, de acór- dão do Tribunal da Relação que, absolvendo o arguido por determinado crime, revogasse a condenação do mesmo, em primeira instância, numa pena não privativa da liberdade, tal norma, assim interpretada, seria inconstitucional, por violação dos artigos 13.º e 32.º, n.º 1, da Constituição, pelo que se deveria recusar a sua aplicação ao caso dos autos. Ao fundamentar o seu juízo de desaplicação de norma por inconstitucionalidade, o Supremo Tribunal de Justiça, como já antes o fizera a decisão sumária proferida pelo relator, argumentou que, ao admitir o recurso em tal situação, o legislador estaria a dar um tratamento diferente daquele que confere à situação inversa em que, revogando uma decisão absolutória proferida na primeira instância, o acórdão da Relação, proferido em recurso, condena o arguido numa pena não privativa da liberdade. Na base de tal entendimento está, portanto, o confronto entre duas situações consideradas como sime- tricamente opostas em que, na primeira, existe uma condenação em pena não privativa de liberdade seguida de absolvição e, na segunda, uma absolvição seguida de condenação em pena não privativa da liberdade. 2. É deste acórdão que, através de requerimentos autónomos, interpuseram recurso para o Tribunal Constitucional tanto o Ministério Público quanto o assistente. Fizeram-no ao abrigo da alínea a) do n.º 1 do artigo 70.º da Lei n.º 28/82, de 15 de Novembro (Lei do Tribunal Constitucional: LTC), e por ter sido recusada a aplicação da norma constante dos artigos 399.º e 400.º do Código de Processo Penal, na versão que lhe foi dada pela Lei n.º 48/2007, de 29 de Agosto, quando interpretada no sentido de ser admissível recurso para o Supremo Tribunal de Justiça, interposto pelo Ministério Público ou pelo assistente, de acórdão do Tribunal da Relação, que, ao absolver o arguido de um dado crime, revogue a condenação do mesmo em pena não privativa da liberdade imposta na primeira instância. 3.  Recebido o recurso no Tribunal Constitucional, nele apresentaram alegações, como recorrentes, o Ministério Público e o assistente no processo. Defendeu o primeiro que se confirmasse o juízo de inconstitucionalidade proferido pela decisão recor- rida. Pugnou o segundo pela rejeição desse juízo. Foram os seguintes, os argumentos apresentados por um e por outro. 4. Entendeu desde logo o Exm.º Representante do Ministério Público no Tribunal Constitucional que, em matéria penal, a regra relativa à recorribilidade das decisões judiciais se tinha que colher no disposto no artigo 399.º do Código de Processo Penal (CPP), segundo o qual é permitido recorrer dos acórdãos, senten- ças e despachos cuja irrecorribilidade não esteja prevista na lei. Partindo desta regra geral de recorribilidade – e, portanto, da natureza típica das excepções previstas nas diversas alíneas do artigo 400.º do CPP – chegou o Ministério Público à conclusão segundo a qual, no caso, seria recorrível a decisão, por não ser o seu tipo subsumível em nenhuma das excepções, expressamente previstas pelo legislador, de decisões irrecorríveis. No entanto – continuou – tal implicaria que o sistema legal trataria diferentemente duas situações “opostas mas indissociáveis”. Por um lado, a situação prevista na alínea e) do n.º 1 do artigo 400.º do CPP, segundo a qual não são recorríveis as decisões proferidas pela Relação que condenem o arguido em pena não privativa de liberdade. Por outro lado, a situação dos autos, à qual se aplicará a norma segundo a qual serão recorríveis – evidentemente, por parte da “acusação” – as decisões proferidas pela Relação que absolvam o arguido em pena não privativa de liberdade. Esta diferença, legislativamente consagrada, entre as duas situações não é para o Exm.º Representante do Ministério Público no Tribunal Constitucional uma diferença constitucionalmente admissível. Mesmo tendo em conta que o processo penal não é um processo de partes e que, nele, o princípio da igualdade de armas terá um conteúdo tal que não incluirá por certo uma “igualdade matemática ou mesmo lógica”, a inexistência do

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