TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 82.º Volume \ 2011
359 acórdão n.º 536/11 Como o Tribunal já por diversas vezes afirmou, o legislador tem ampla liberdade de conformação no estabelecimento das regras sobre recursos em cada ramo processual. Necessário é, porém, que essas regras não signifiquem a imposição de ónus de tal forma injustificados ou desproporcionados que acabem por importar lesão da garantia de acesso à justiça e aos tribunais. No presente recurso questiona-se se a omissão de conclusões na alegação de recurso, sem a prolação do despacho convite para as formular, sob pena de rejeição do recurso, é de considerar injustificado, desrazoável ou desproporcionado. Conforme foi decidido no Acórdão n.º 102/10 (disponível em www.tribunalconstitucional.pt ): «Nestas particulares circunstâncias, a norma que conduz ao indeferimento do requerimento de interposição do recurso não se mostra compatível, nem com a ideia geral da proporcionalidade ínsita no princípio do Estado de direito, nem com a garantia constitucional do processo equitativo, consagrados no artigo 2.º e no n.º 4 do artigo 20.º da Constituição, respectivamente. Na verdade, o direito de agir em juízo deve efectivar-se através de um processo equitativo, cujo significado básico é o da exigência de conformação do processo de forma materialmente adequada a uma tutela jurisdicional efectiva e que se densifica através de outros subprincípios, um dos quais é o da orientação do processo para a justiça material, sem demasiadas peias formalísticas (Gomes Canotilho e Vital Moreira, Constituição da República Portu- guesa Anotada, vol. I, 4.ª edição, pp. 415 e segs.). Os ónus processuais devem servir o fim para que são instituídos e a sanção para o seu incumprimento deve ser adequada a compelir ao respectivo cumprimento, mas sem exceder a justa medida, pondo em balança as consequências desvantajosas para o interessado e os efeitos da conduta incum- pridora na frustração dos objectivos visados com a disciplina processual considerada.» Assim, o direito à tutela jurisdicional ou o direito de acesso aos tribunais como direito de acesso a uma protecção jurídica individual adequada estabelece especial ênfase no facto de a via judiciária que se abre aos particulares possuir um grau acrescido de eficácia, no sentido da garantia judiciária não ser um mero «jogo formal»; mas que seja obtida uma decisão sobre o fundo da causa, fundada no direito. Com efeito, como se afirmou, lapidarmente, no preâmbulo do Decreto-Lei n.º 329-A/95, de 12 de Dezembro: « (…) Os princípios gerais estruturantes do processo civil, em qualquer das suas fases, deverão essencialmente representar um desenvolvimento, concretização e densificação do princípio constitucional do acesso à justiça. Na verdade, tal princípio não se reduz à mera consagração constitucional do direito de acção judicial, da faculdade de qualquer cidadão propor acções em tribunal, implicando, desde logo, como, aliás, a doutrina vem referindo, que a todos seja assegurado, através dos tribunais, o direito a uma protecção jurídica eficaz e temporalmente adequada. (…) O direito de acesso aos tribunais envolverá identicamente a eliminação de todos os obstáculos injustificados à obtenção de uma decisão de mérito, que opere a justa e definitiva composição do litígio, privilegiando-se assim claramente a decisão de fundo sobre a mera decisão de forma. (…) Procura, por outro lado, obviar-se a que regras rígidas, de natureza estritamente procedimental, possam impedir a efectivação em juízo dos direitos e a plena discussão acerca da matéria relevante para propiciar a justa composição do litígio. (…) O incremento da tutela do direito de defesa implicará, por outro lado, a atenuação da excessiva rigidez de certos efeitos cominatórios ou pre- clusivos, sem prejuízo de se manter vigente o princípio da auto-responsabilidade das partes e sem que as soluções introduzidas venham contribuir, de modo significativo, para a quebra da celeridade processual.” No dizer de Miguel Teixeira de Sousa ( Estudos sobre o Novo Processo Civil , 2.ª edição, 1997, p. 27): “É clara a opção ideológica da reforma. No preâmbulo do Decreto-Lei n.º 329-A/95 explicitam-se as ‘ linhas mestras’ que presidiram à reforma agora realizada no processo civil nacional. Destacam-se as duas seguintes: “ a distinção entre os princípios estruturantes, que se referem aos valores fundamentais do processo civil, e as regras de natureza instrumental, que definem o funcionamento do sistema processual; a garantia da
Made with FlippingBook
RkJQdWJsaXNoZXIy Mzk2NjU=