TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 82.º Volume \ 2011

355 acórdão n.º 536/11 11.ª A norma em apreço, na interpretação que lhe foi dada pelo Venerando Tribunal da Relação, não tem fundamento material bastante que tal justifique, antes afecta, de um modo particularmente oneroso e de forma irreversível, os direitos de quem pretende aceder à justiça, violando o direito constitucional garantido da recorrente de ver novamente apreciada uma decisão humana que, como tal, é sempre passível de erro, sendo essa uma das primeiras razões da existência e da longa persistência dos recursos processuais, pois a percepção dos homens sofre a forte influência de factores internos e externos, uns de ordem intelectual, outros de natureza emocional, pelo que, o direito de recurso tem a indiscutível vantagem de conhecer a decisão anterior, a ser ratificada ou não, mas, de todo o modo, é sempre uma apreciação mais reflectida da questão. Termos em que, declarando-se inconstitucional a norma da alínea b) do n.º 2 do artigo 685.°-C do Código de Processo Civil, na interpretação de que a falta de conclusões implica a não apreciação do recurso sem previamente o Juiz Relator proceder em conformidade com o disposto no artigo 685-A n.° 3 do C.P.C., será feita Justiça.» 4. A recorrida não contra-alegou. Não tendo obtido vencimento o projecto de acórdão apresentado pelo relator originário, cumpre formular a decisão em conformidade com o entendimento que prevaleceu. II - Fundamentação 5. O recurso interposto da decisão proferida em 1.ª instância foi liminarmente indeferido pelo Tribunal da Relação do Porto, por a respectiva alegação de recurso não conter as “conclusões”, em violação directa do disposto no artigo 685.º-C, n.º 2, alínea b) , do Código de Processo Civil (CPC). Dessa decisão, reclamou a ora recorrente, reclamação essa que também não foi deferida, com base na mesma disposição legal. A recor- rente discorda da interpretação dada ao aludido preceito legal, porquanto sustenta que, apesar da revogação do artigo 690.° do CPC, o legislador salvaguardou no novo artigo 685.°‑A, n.º 3, introduzido na reforma dos recursos em processo cível operada em 2007, o dever de o juiz convidar o recorrente a completar, esclarecer ou aclarar as conclusões deficientes, obscuras ou complexas. Assim, mesmo a considerar-se que a recorrente não cumpriu o ónus de formular as conclusões na minuta de recurso, esse facto não poderia acarretar o não conhecimento do recurso, já que essa consequência configuraria uma sanção desproporcionada à irregulari- dade cometida, pelo que colidiria com o princípio constitucional do acesso ao direito consignado no artigo 20.° da Constituição da República Portuguesa. Vejamos. 6. A reforma do regime dos recursos em processo civil efectivada pelo Decreto‑Lei n.º 303/2007, de 24 de Agosto, tendo revogado o artigo 690.° do CPC, veio, simultaneamente, aprovar o artigo 685.º-C, n.º 2, alínea b) , onde se considera que a falta de alegações ou de conclusões constitui fundamento de rejeição de recurso. Assim, onde anteriormente se admitia o convite ao recorrente para suprimento daquela falta de conclusões, agora tal convite só ocorre quando as conclusões sejam deficientes, obscuras, complexas ou quando nelas se não tenha procedido às especificações previstas no n.º 2 do artigo 685.º-A. O que, no dizer de Armindo Ribeiro Mendes ( Recursos em Processo Civil - Reforma de 2007 , Coimbra, Coimbra Editora, 2009, p. 108), é uma solução mais drástica – e diversa da acolhida no processo penal, onde se prevê um des- pacho de aperfeiçoamento (artigo 417.°, n.° 3) – concluindo aquele Autor que é de “prever que se venham a suscitar questões de inconstitucionalidade nesta matéria.” Já Amâncio Ferreira ( Manual dos Recursos em Processo Civil , 9.ª edição, Coimbra, Almedina, 2009, p. 171) sustenta que em boa hora o legislador optou pela tese do indeferimento do recurso na situação de falta de conclusões, como vinha defendendo face à vetustez da norma que impõe a formulação de conclusões, advinda do Código de 1939, concluindo que não compreende a afirmação de Ribeiro Mendes, relativamente ao citado enfoque constitucional. Por outro lado, Abrantes Geraldes ( Recursos em Processo Civil - novo regime , Coimbra, Almedina, 2007, p. 151) refere que, quando faltem conclusões, não se admite a prolação de despacho de aperfeiçoamento, tendo em conta os antecedentes históricos do que agora se encontra previsto no artigo 685.º-A, em comparação do que constava

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