TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 82.º Volume \ 2011
331 acórdão n.º 520/11 no âmbito do artigo 311.º do Código de Processo Penal, ser possível ao juiz de julgamento declarar extinto o procedimento criminal por falta de objecto e, em consequência, determinar o arquivamento dos autos por falta de relevância criminal dos factos imputados aos arguidos. (xxix) Só com esta interpretação é que as mencionadas normas processuais penais se assumem conformes à dignidade da pessoa humana, aos princípios basilares de um Estado de direito democrático, aos direitos, liberdades e garantias, ao princípio da proporcionalidade, ao acesso ao direito e à tutela jurisdicional efectiva, à presunção (certeza) de inocência e à função jurisdicional dos tribunais.» O Ministério Público contra-alegou, pronunciando-se pelo não conhecimento do recurso e, subsidia- riamente, pela sua improcedência. II – Fundamentação 1. Do conhecimento do recurso O Ministério Público, nas contra-alegações apresentadas, pronunciou-se pelo não conhecimento do mérito do recurso, por entender que a recorrente não suscitou perante o tribunal recorrido a questão de constitucionalidade que agora vem colocar ao Tribunal Constitucional e que essa questão tem por objecto um critério que não constituiu ratio decidendi do acórdão recorrido. No sistema português de fiscalização de constitucionalidade, a competência atribuída ao Tribunal Cons- titucional cinge‑se ao controlo da inconstitucionalidade normativa, ou seja, das questões de desconformi- dade constitucional imputada a normas jurídicas ou a interpretações normativas, e já não das questões de inconstitucionalidade imputadas directamente a decisões judiciais, em si mesmas consideradas. Por outro lado, tratando‑se de recurso interposto ao abrigo da alínea b) do n.º 1 do artigo 70.º da Lei do Tribunal Constitucional (LTC) – como ocorre no presente caso –, a sua admissibilidade depende da verificação cumulativa dos requisitos de a questão de inconstitucionalidade haver sido suscitada «durante o processo», «de modo processualmente adequado perante o tribunal que proferiu a decisão recorrida, em termos de este estar obrigado a dela conhecer» (n.º 2 do artigo 72.º da LTC), e de a decisão recorrida ter feito aplicação, como sua ratio decidendi , das dimensões normativas arguidas de inconstitucionais pelo recorrente. No presente recurso, a Recorrente pretende que o tribunal aprecie a constitucionalidade da norma constante do artigo 338.º, n.º 1, do Código de Processo Penal, em conjugação com as normas constantes dos artigos 286.º, 288.º, 308.º, 310.º, n.º 1, 311.º e 313.º, n.º 4, do mesmo Código, quanto interpretadas tais disposições legais no sentido de que, tendo havido Instrução e tendo sido proferido despacho ao abrigo do artigo 311.º do Código de Processo Penal, está vedado ao Tribunal Colectivo declarar extinto o procedi- mento criminal por falta de objecto e, em consequência, determinar o arquivamento dos autos, por falta de relevância criminal dos factos imputados aos arguidos, por considerar que esta interpretação viola os prin- cípios constitucionais constantes dos artigos 1.º, 2.º, 18.º, n. os 1 e 2, 20.º, n. os 1, 4 e 5, 32.º, n.º 2, 202.º, n. os 1 e 2, e 204.º da Constituição da República Portuguesa. Da leitura das contra-alegações de recurso apresentadas ao Tribunal da Relação de Lisboa pela recorrente verifica-se que a inconstitucionalidade desta interpretação foi aí claramente suscitada, em termos de vincular o tribunal de recurso ao seu conhecimento, designadamente na conclusão 18.ª daquela peça processual, pelo que se mostra cumprido o referido requisito da suscitação adequada perante o tribunal recorrido da questão de constitucionalidade colocada posteriormente ao Tribunal Constitucional. E da leitura do acórdão recorrido também se verifica que o critério normativo cuja constitucionalidade se pretende ver apreciada neste recurso foi o fundamento da decisão, conforme resulta da sua síntese conclu- siva onde se pode ler:
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