TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 82.º Volume \ 2011

324 TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Em remate destas considerações, o tribunal recorrido manteve, “na íntegra”, a decisão. Como bem salienta o Ministério Público nas suas alegações, a primeira questão que cumpre resolver, em face destes dados, é a da identificação da norma efectivamente recusada aplicar pela sentença recorrida. Nesta sentença, para além de inexistir uma recusa expressa de aplicação de uma norma determinada, o juízo de inconstitucionalidade nela emitido, reportado genericamente ao artigo 112.º da LGT, apoia-se num acórdão do Supremo Tribunal Administrativo que aplicou norma diversa, como vimos. Além desta incongruência, a fundamentação da sentença não identifica, de forma inequívoca, a que nor- ma do artigo 112.º da LGT respeita o juízo de inconstitucionalidade. Desde logo, fica por saber se a norma recusada aplicar é a da alínea a ) do n.º 1 do artigo 112.º da LGT ou a da alínea b ) desse mesmo preceito. Já o despacho de aclaração aponta aparentemente como objecto do juízo de inconstitucionalidade a alínea b ) do n.º 1 do artigo 112.º da LGT, na medida em que é esse o único referente normativo indicado. Todavia, o primeiro dos dois fundamentos de inconstitucionalidade aí invocados não tem directamente a ver com o específico regime de prova da culpa constante dessa norma, mas, in radice , com a própria imputação de responsabilidade subsidiária às pessoas físicas nomeadas no corpo do n.º 1 do referido artigo. A incerteza deste modo suscitada levou a que o representante do Ministério Público junto deste Tribu- nal, embora se tenha inclinado para considerar que a norma recusada era a da alínea a ) do n.º 1 do artigo 112.º, tenha, à cautela, produzido alegações quanto a ambas as normas. O Tribunal Constitucional não pode, porém, prevalecer-se desse (compreensível, no caso) expediente ou emitir decisões com base em conjecturas sobre qual a norma ou normas que, por vício de inconstitucio- nalidade, a sentença recorrida recusou aplicar. A impossibilidade de identificar, com um mínimo de certeza, essa(s) norma(s) traduzir-se-á inevitavelmente numa impossibilidade de conhecer do objecto do recurso. Cremos, todavia, que, não obstante as dificuldades apontadas, é possível, numa ponderação global, chegar a uma conclusão suficientemente segura quanto ao alcance da interpretação tida por inconstitucional. Note-se que todas as considerações da sentença atinentes ao “caso dos autos” se cingem ao regime pro- batório. Começando por referir que a Administração Tributária nem sequer alegou a insuficiência do patri- mónio da sociedade para pagamento das coimas, por culpa dos gerentes − pelo que, acrescentamos nós, não pode prevalecer-se da alínea a) do n.º 1 do artigo 112.º da LGT −, acaba por decidir (implicitamente) que não é aplicável a presunção de culpa estabelecida na alínea b) , porque a norma enferma de inconstituciona- lidade. É sobre esta norma, e apenas sobre ela, que recai o juízo de inconstitucionalidade. É certo que a presunção de culpa não é uma solução a se stante , inserindo-se num determinado regime de imputação de responsabilidade, como resulta do proémio do n.º 1 do artigo em causa. E, no despacho de aclaração, a inconstitucionalidade é alargada à própria imposição dessa responsabilidade, por violação do n.º 3 do artigo 30.º da Constituição, não se circunscrevendo a um ponto específico do seu regime, respeitante ao ónus da prova de um pressuposto de responsabilização. Mas há que ter presente que o poder jurisdicional do tribunal recorrido se esgotou com a prolação da sentença. O despacho de aclaração, como o nome indica, destina-se a esclarecer qualquer elemento constante da sentença, não a adicionar inovatoriamente um elemento que dela não faça parte. Ora, nada há na sentença recorrida que permita objectivamente sustentar que nela também foi recu- sada aplicação à própria sujeição a responsabilidade, em si mesma considerada. A vaga alusão ao acórdão do Supremo Tribunal de 4 de Fevereiro de 2009 é insuficiente, para o efeito. E, de resto, se assim fosse, se tal decisão fosse inferível da sentença, tornava-se incompreensível (por inteiramente desnecessária) a apreciação da constitucionalidade do regime de presunção de culpa. Na verdade, a inconstitucionalidade da responsabilidade subsidiária prejudicaria, como é evidente, a apreciação (sempre subsequente) de um ponto concreto do seu regime. Em face do exposto, decide-se conhecer do presente recurso, considerando que ele tem por objecto a norma, constante do artigo 112.º, n.º 1, alínea b ), da LGT, que faz recair sobre os responsáveis subsidiários o ónus da prova de que a falta de pagamento de multas ou coimas vencidas no período do seu mandato lhes não foi imputável.

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