TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 82.º Volume \ 2011
318 TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Essa tem sido a orientação seguida pela jurisprudência (vide os acórdãos do Supremo Tribunal de Justiça, de 27 de Maio de 2003 e de 16 de Junho de 2011, da Relação de Lisboa de 4 de Maio de 2010, da Relação de Coimbra de 7 de Junho de 2005, de 28 de Fevereiro de 2009, e de 24 de Março de 2009, acessíveis em www.dgsi.pt ) . Assim, e segundo a decisão recorrida, caberia à recorrente alegar e provar a carência de alimentos, bem como a circunstância de não os poder obter nem da herança deixada pelo falecido, nem das pessoas legal- mente vinculadas nos termos das alíneas a) a d) do artigo 2009.º do Código Civil, sendo que a falta de prova destes factos determinou a improcedência da acção. A recorrente alega que a interpretação segundo a qual deve aplicar-se à Recorrente, casada com o benefi- ciário à data da morte deste, o regime legal previsto para os unidos de facto, é inconstitucional, por violação do princípio da igualdade, previsto no artigo 13.º, n.º 2, da Constituição da República Portuguesa, porque a coloca em manifesta inferioridade legal com os restantes cidadãos casados ou unidos de facto. Argumenta que, em relação aos restantes cidadãos casados, a Lei contenta-se com um único ano de convívio, porventura iniciado com o casamento, e para a situação da recorrente não chegam dois anos de convívio marital, selado pelo casamento, sendo ainda onerada com a prova dos requisitos exigidos unica- mente para os unidos de facto; e em relação a estes, porque exige às pessoas que se encontrem na situação da recorrente a prova de todos os requisitos legais exigíveis aos unidos, olvidando o facto essencial de que casou com o falecido. A recorrente não questiona a diferença de tratamento, no que respeita ao acesso a prestações por mor- te, entre pessoas casadas e pessoas que à data da morte do beneficiário viviam com este em união de facto (questão já por diversas vezes colocada a este Tribunal e que no Acórdão n.º 651/09, aprovado em Plenário, foi objecto de julgamento de não inconstitucionalidade). Questiona, sim, o facto de a decisão recorrida ter entendido não lhe ser aplicável o regime previsto para o cônjuge sobrevivo do beneficiário, casado há mais de um ano, mas antes o regime aplicável a quem tenha vivido em união de facto com o beneficiário durante mais de dois anos, sem que tenha chegado a contrair casamento, sustentando que tal interpretação normativa é inconstitucional, por violação do princípio da igualdade. O âmbito de protecção do princípio da igualdade abrange, na ordem constitucional portuguesa, a dimen são da proibição do arbítrio, sendo inadmissíveis, quer diferenciações de tratamento sem qualquer justificação razoável, de acordo com critérios de valor objectivos, constitucionalmente relevantes, quer a identidade de tratamento para situações manifestamente desiguais. O princípio da igualdade, nesta perspectiva, obriga a que se trate por igual o que for necessariamente igual e como diferente o que for essencialmente diferente, não impe- dindo a diferenciação de tratamento, mas apenas as discriminações arbitrárias, irrazoáveis, ou seja, as distinções de tratamento fundadas em categorias meramente subjectivas, sem fundamento material bastante. A proibição do arbítrio constitui, assim, um limite externo da liberdade de conformação ou de decisão dos poderes públicos, servindo o princípio da igualdade como princípio negativo de controlo. Realce-se, no entan- to, que a vinculação jurídico-material do legislador ao princípio da igualdade não elimina a liberdade de con- formação legislativa, pois a ele pertence, dentro dos limites constitucionais, definir ou qualificar as situações de facto ou as relações da vida que hão-de funcionar como elementos de referência a tratar igual ou desigualmente. Só existirá infracção ao princípio da igualdade quando os limites externos da discricionariedade legislativa sejam violados, isto é, quando a medida legislativa adoptada não tenha adequado suporte material. Ora, sendo certo que a situação da recorrente não é totalmente idêntica a quem viva em união de facto com o beneficiário falecido, também é certo que não se equipara completamente à situação de quem, sendo casado, o seja há pelo menos um ano à data da morte do beneficiário. Como se disse no Acórdão n.º 651/09 do Tribunal Constitucional, “em relação aos cônjuges (tal como em relação aos descendentes menores de 18 anos) a lei presumiu, sem mais, que eram reais e efectivos os elos de dependência económica que pressupunham a necessidade de compensação. Fê-lo tendo em conta os deveres dos cônjuges previstos pela lei civil, entre os quais se contam os deveres de assistência (artigo 1675.º do Código Civil) e o dever de contribuir para os encargos familiares (artigo 1676.º). Em relação à
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