TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 82.º Volume \ 2011
308 TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acordam na 3.ª Secção do Tribunal Constitucional: I – Relatório 1. A. foi condenado, por sentença proferida a 27 de Junho de 2008 pela 1.ª Vara Criminal do Porto, a seis anos de prisão, pela prática, como autor material, de um crime de burla agravada, previsto e punido pelos artigos 217.º e 218.º, n.º 2, alínea a) , ambos do Código Penal. Inconformado, recorreu o arguido para o Tribunal da Relação do Porto que, através de acórdão proferi- do a 25 de Março de 2009, decidiu negar provimento ao recurso, alterando contudo, e ainda assim, a pena que fora aplicada em 1.ª instância, de modo a condenar o arguido em cinco anos de prisão. A. apresentou então requerimento arguindo nulidades várias de que enfermaria o acórdão da Relação, referindo também obscuridade e erro material, arguição essa que, por decisão de 8 de Julho de 2009, veio a ser desatendida. 2. Recorreu então A. para o Tribunal Constitucional ao abrigo do disposto na alínea b) do n.º 1 do artigo 70.º da Lei n.º 28/82, de 15 de Novembro (Lei do Tribunal Constitucional: doravante LTC). Dizia, no requerimento de interposição de recurso, que recorria, quer do acórdão de 25 de Março de 2009, quer do outro, subsequentemente proferido pelo Tribunal da Relação a 8 de Julho, por nele terem sido aplicadas normas cuja inconstitucionalidade havia sido suscitada durante o processo. Identificavam-se nesses termos quatro distintas questões de constitucionalidade que se pretendia que o Tribunal apreciasse. A 24 de Setembro de 2010 foi decidido sumariamente (ao abrigo do disposto no artigo 78.º-A da LTC) não tomar conhecimento de nenhuma dessas questões, por se entender que a respeito de nenhuma delas se perfaziam os correspondentes pressupostos de admissibilidade. Concordando com o assim decidido quanto a três dessas questões, reclamou no entanto o arguido para a conferência (artigo 78.º-A, n.º 3, da LTC) quanto à decisão de não levar a julgamento a questão restante, que se cifrava no problema de saber se seria ou não inconstitucional, por violação das garantias de processo criminal constantes do artigo 32.º da Constituição, a norma contida no artigo 358.º do Código de Processo Penal, no juízo interpretativo que dela havia feito o Tribunal da Relação do Porto, quer no acórdão de 25 de Março quer no acórdão de 8 de Julho, segundo o qual a “convolação” do ofendido ou da vítima, num crime de burla, não se traduz em uma nova “qualificação jurídica dos factos” para efeitos do disposto no artigo 358.º, n.º 3, do Código de Processo Penal. Justificou assim A. a sua reclamação: «(...) o recorrente foi pronunciado e condenado em primeira instância por um crime de burla agravada, haven do-se entendido, nos correspondentes despacho e acórdão, que a vítima de tal crime (a pessoa ou entidade que sofrera o correspondente prejuízo patrimonial) fora o Banco de que era funcionário. (A matéria de facto relativa a eventual burla a Clientes, que estava na douta pronúncia foi, pois, considerada como não integradora do crime por que veio a ser condenado – artigos 1.°, a) e 338.º, n.° 4, ambos do CPP). Recorreu – só ele! – da decisão. E, no Tribunal da Relação a quo, mantendo-se embora a condenação pelo mesmo “tipo” formal de crime, entendeu-se todavia, que a vítima ou vítimas do mesmo foram – agora – antes os clientes do Banco. Ou seja: o Tribunal de recurso “absolveu” o recorrente do crime de burla ao Banco e passou a “condená-lo” pelo crime de burla aos clientes da instituição bancária; o Tribunal da Relação procedeu, consequentemente, a um diferente enquadramento ou qualificação dos factos consubstanciadores da infracção criminal imputada ao recorrente. Mas fê-lo sem previamente dar a este último oportunidade de pronunciar-se sobre esse novo enquadramento ou qualificação dos factos, cuja análise retomou, depois de a ter considerado irrelevante, isto é, sem lhe dar a correspondente possibilidade de defesa; surpreendido com a alteração operada pelo Tribunal de recurso (a qual
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