TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 82.º Volume \ 2011

295 acórdão n.º 461/11 procedimento administrativo quer no de um processo perante os órgãos jurisdicionais comunitários, sustentar que os documentos apresentados têm um significado diferente daquele que lhes deu a Comissão.» 17. Nos termos de tudo o exposto, conclui-se que a interpretação normativa em análise não comporta restrição inconstitucional do princípio nemo tenetur se ipsum accusare , enquanto refracção das garantias pro- cessuais de defesa do arguido e do direito a um processo equitativo, no âmbito contra-ordenacional definido no regime jurídico da concorrência. 18 . Passemos à análise da segunda questão, que a recorrente enuncia da seguinte forma: «(...) a inconstitucionalidade da norma que resulta da interpretação do artigo 51.°, n.° 1 da Lei n.° 18/2003, bem como a inconstitucionalidade da norma que resulta da interpretação do artigo 311.°, n.° 1 e 312.°, n.° 1, do Códi­ go de Processo Penal, em conjugação com o artigo 41.° do Regime Geral das Contra-Ordenações e artigo 51.°, n.° 1 da Lei n.° 18/2003, segundo a qual o arguido em processo de contra-ordenação não tem de ser notificado das contra-alegações da Autoridade da Concorrência e não pode responder a essas mesmas contra-alegações.» Refere a recorrente que, na impugnação da decisão condenatória proferida pela autoridade da Concor- rência, suscitou nulidades e questões prévias, relativamente a tal decisão. A Autoridade da Concorrência, nas alegações – juntas nos termos do artigo 51.º, n.º 1, da Lei n.º 18/2003, de 11 de Junho – pronunciou-se, além do mais, sobre as nulidades e questões prévias suscitadas, tendo o Tribunal proferido decisão, sem que a recorrente tenha sido notificada da peça processual aludida, apresentada pela Autoridade da Concorrência. Notificada da decisão judicial, datada de 8 de Abril de 2008, a recorrente arguiu a sua nulidade, refe- rindo ter suscitado a questão de constitucionalidade, que agora pretende ver dirimida pelo Tribunal Consti- tucional e que reporta como coincidindo com a interpretação adoptada na decisão recorrida: o despacho de 1 de Julho de 2008. A recorrente baseia o seu juízo de inconstitucionalidade na violação dos princípios do contraditório e da igualdade de armas e dos direitos de audiência e defesa, consagrados nos artigos 20.º, n.º 4, e 32.°, n. os 1, 2, 5 e 10, ambos da Constituição da República Portuguesa. Para fundamentar a sua posição, defende que o princípio do contraditório, no âmbito do processo penal e contra-ordenacional, exige que o arguido tenha a possibilidade de se pronunciar, não apenas sobre todos os actos ou questões que possam colidir com a sua defesa, mas igualmente que possa fazê-lo em último lugar. Nesta sequência, conclui a recorrente que, mesmo que as alegações não apresentem nenhum argumento ou facto novo, deve ficar ao critério das partes o exercício da possibilidade de se pronunciarem ou não. Vejamos se lhe assiste razão. 19 . Em primeiro lugar, cumpre delimitar o exacto âmbito da questão a dirimir, que se reporta à circuns- tância de o regime legal não prever que o arguido seja notificado das alegações da Autoridade da Concorrên- cia, juntas em resposta a uma impugnação judicial da decisão condenatória contra-ordenacional proferida por tal entidade. É essa específica interpretação que é problematizada e que implicitamente decorre da decisão recorrida. Na verdade, o despacho de 1 de Julho de 2008 assenta no pressuposto de que não decorre do ordena- mento jurídico a obrigatoriedade de notificação das alegações, juntas pela Autoridade da Concorrência, ao abrigo do n.º 1 do artigo 51.º da Lei n.º 18/2003, de 11 de Junho. Não se confunde esta questão – nos precisos termos delimitados – com a da necessidade de cumpri- mento do princípio do contraditório, quando, nas alegações, são inseridos novos factos constitutivos da infracção em causa ou considerações inovatórias, relevantes para a decisão final, não constantes da decisão

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