TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 82.º Volume \ 2011
293 acórdão n.º 461/11 necessária – por corresponder ao meio exigível, cuja gradação de compressão sobre o direito restringido ainda permite a satisfação da necessidade de eficiência da investigação e repressão de práticas anticoncorrenciais (objectivo que não seria alcançável mediante instrumentos alternativos que, por serem excessivamente one- rosos para a entidade reguladora – em meios e tempo, face à extensão das actividades e entidades reguladas – trariam como consequência margens de ineficácia excessivas, na protecção do interesse de defesa da concor- rência). Finalmente, a restrição em análise mostra-se ainda proporcional, em sentido estrito, apresentando-se como equilibrada e correspondente à justa medida, sendo esta resultante da ponderação do peso relativo de cada um dos concretos bens jurídicos constitucionais em confronto, ou seja, do direito que é objecto da restrição e do bem que justifica a lei restritiva. De facto, os deveres de colaboração, plasmados na lei, em ordem a conferir protecção efectiva aos interesses, constitucionalmente valiosos, da concorrência e do funcionamento equilibrado dos mercados – estruturantes do Estado de direito democrático – comprimem o conteúdo potencial máximo do direito à não auto-incriminação, no âmbito contra-ordenacional em análise, mas deixam intocado o seu conteúdo útil essencial, funcionalmente operante, na vertente do direito a não prestar declarações sobre os factos imputa- dos, atenta a sua virtualidade auto-incriminatória. Relativamente à densidade normativa – que a recorrente problematiza – cumpre referir que, conforme amplamente desenvolvido no âmbito do Acórdão n.º 155/07 deste Tribunal Constitucional – o grau de precisão e determinabilidade da lei habilitante da restrição é variável. A este propósito, citando Jorge Reis Novais – in As restrições de direitos fundamentais não expressamente autorizadas pela Constituição , Coimbra, 2003 – refere o aresto (p. 851): “a densidade normativa exigível varia em função de diferentes parâmetros só definitivamente valoráveis nas circunstâncias do caso concreto”, pelo que o que sempre importa apreciar é se, nas circunstâncias do caso concreto, “é exigível, no sentido não ape- nas de ser objectiva e tecnicamente possível, mas, também, constitucionalmente adequado, que o legislador dote a lei restritiva de uma maior densificação ou determinação normativa.” Refere o mesmo Autor que “a norma habilitante procura, em última análise, propiciar a realização ulte rior de um equilíbrio entre os bens ou interesses conflituantes, o que obriga o legislador a uma abertura – seja no lado dos pressupostos de facto, seja no lado da estatuição ou na conjugação de ambos – capaz de permitir, consoante as circunstâncias concretas da colisão, soluções que dêem prevalência ora a um bem ora a outro, o que, para além de um mínimo de previsibilidade da responsabilidade do legislador, acaba por ser tarefa que, expressa ou implicitamente, o legislador deixa essencialmente dependente dos juízos de valoração e ponde- ração do intérprete/aplicador da norma restritiva. Assim, apesar de as questões competenciais constituírem uma dimensão importante do processo de racionalização do recurso à metodologia da ponderação de bens no domínio da restrição dos direitos funda- mentais não se pode, sem mais e com mero apoio na concepção clássica da reserva da lei, concluir que, aqui, tudo quanto haja a ponderar é tarefa do legislador, restando à Administração a mera execução das restrições previstas na lei.” ( op. cit., p. 845) Ora, na situação em análise, atendendo ao âmbito – objectivo e subjectivo – global de abrangência do regime jurídico da concorrência, tendencialmente transversal a todo o domínio económico, a exequibilidade técnica de uma densificação exaustiva do espaço normativo da lei habilitante da restrição seria difícil e traria o inevitável risco de conduzir a uma cristalização excessivamente inflexível, num domínio em que o ritmo de evolução – imposto pelas exigências de competitividade dos operadores económicos – exige maleabilidade e agilização dos instrumentos de regulação do Estado, sob pena de se comprometer a protecção do núcleo essencial do princípio da concorrência. Neste contexto, considera-se que o grau de densidade normativa da lei restritiva é suficiente para legiti- mar a compressão do direito à não auto-incriminação, no âmbito contra-ordenacional em que nos situamos. O argumento da recorrente, baseado na possibilidade de a autoridade administrativa se aproveitar de alguma indeterminação nos conceitos de “documento” ou “informações” para formular solicitações que correspondem, substancialmente, a perguntas susceptíveis de suscitar verdadeiras declarações confessórias do
Made with FlippingBook
RkJQdWJsaXNoZXIy Mzk2NjU=