TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 82.º Volume \ 2011
266 TRIBUNAL CONSTITUCIONAL por outro, haveria, sempre, que aferir do grau de organização e perigosidade do crime à luz do caso concreto, o que a norma subjudice dispensa. 104.º - O ora Recorrente considera absurdo que se sugira que o seu caso concreto preenche estes requisitos e que poderia constituir uma ameaça para os Jurados, ainda que apenas se tivesse em conta as alegações da pro- núncia. E considera sem sentido que se qualifique a mera transferência de fundos cuja origem ilícita não ficou minimamente provada para um banco estrangeiro (não tendo efectivamente existido branqueamento algum, por este exigir o elemento da origem ilícita, apesar da sua condenação nesse sentido em violação do seu direito consti- tucional de propriedade que garante a respectiva movimentação, mesmo para o estrangeiro) como uma actividade perigosa ou altamente organizada. 105.º - Por último, também aqui não é possível legitimar a exclusão do julgamento por tribunal do júri do crime de branqueamento na remissão introduzida na revisão de 1997 para os “casos e com a composição que a lei fixar”, desde logo, porque isso implicaria conferir a tal norma um sentido que violaria o artigo 288.º, alíneas d) e m) , CRP, tal como supra se concluiu. 106.º - Para lá de uma evidente fraude à Constituição, tal restrição não prosseguiria em termos adequados ou necessários o fim da isenção, dado que não existindo qualquer factor intimidatório ficaria por justificar a exclusão do Júri. Igualmente a privação do ora recorrente do seu direito de ser julgado pelos seus concidadãos e do direito de todos estes potencialmente o poderem vir a julgar tornaria claramente desproporcionada tal restrição. 107.º - Finalmente, tendo tal alargamento da noção legal de “criminalidade altamente organizada” tido nature- za constitutiva e não declarativa da correspondente noção constitucional, a exclusão do branqueamento teria sido realizada em 2007, não podendo ser aplicada retroactivamente aos factos anteriormente ocorridos por força do artigo 18.º, n.º 3, CRP, sob pena de a referida alínea m) do n.º 1, do artigo 1.º, do C.P. Penal, ser inconstitucional ainda por mais este fundamento. 108.º - Assim, a norma em questão é materialmente inconstitucional por violação dos artigos 1.º, 2.º, 12.º, 13.º, 17.º, 18.º, n.º 2 e 3, 20.º, n.º 4 e n.º 5, 32.º, n.º 1, 48.º, n.º 1, 50.º, n.º 2, e 207.º, n.º 1, alíneas d) e m) do 288.º da CRP. Em síntese, e nestes termos, deve a norma do artigo 40.º da Lei n.º 34/87, de 16 de Julho, ser julgada incons- titucional em todos e cada um dos sentidos em que se desdobrou a sua aplicação no caso dos autos, após o que deve ser ordenada a baixa dos autos ao Venerando Tribunal da Relação de Lisboa para alterar o douto Acórdão recorrido em função da declaração de inconstitucionalidade material que venha a ser proferida, admitindo-se a intervenção do tribunal do júri no julgamento do Arguido, ora Recorrente, quanto aos crimes previstos na Lei n.º 34/87, de 16 de Julho, pelos quais ainda se mantenha a acusação e de branqueamento de capitais, seguindo-se os demais termos legais.» O Ministério Público respondeu, concluindo do seguinte modo: «A Lei n.º 34/87, de 16 de Julho, ao responsabilizar criminalmente os titulares de cargos políticos por actos cometidos no exercício das suas funções, tem especificidades próprias que se explicam pelo relevo dos bens jurídicos que afectam (os bens jurídico-constitucionais em sentido estrito) e pelo especial dever de zelo a que se vinculam esses mesmos titulares de cargos políticos perante o interesse público e perante o povo donde tiram a sua legitimidade. O n.º 1 do artigo 207.º da Constituição determina os casos em que a constituição ou mera previsão legal do tribunal do júri está excluída (os dos crimes que não sejam graves, e de entre os graves, os de terrorismo e de cri- minalidade altamente organizada), remetendo para a lei ordinária a concretização dos casos de intervenção do júri. O artigo 13.º do Código do Processo Penal especifica a competência do tribunal do júri, delimitando o con- ceito de crime grave para efeitos de julgamento com intervenção de júri. Neste enquadramento jurídico-constitucional, não se afigura arbitrária, infundada ou manifestamente despro- porcionada, a restrição à intervenção do júri, operada por força do artigo 40.º da Lei n.º 34/87, de 16 de Julho. Pelo que, tal restrição não afronta a Constituição, nomeadamente, os seus artigos 207.º, n.º 1, 13.º e 18.º . Deve, pois, o presente recurso, improceder.»
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