TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 82.º Volume \ 2011
26 TRIBUNAL CONSTITUCIONAL o valor das despesas inscritas no orçamento para o ano a que respeita. Não pode, assim, sustentar-se que elas regulam matéria alheia à função específica e mais estrita do orçamento, enquanto instrumento de programa- ção anual económico-financeira da actividade do Estado. Pelo contrário. Dando suporte normativo a uma dada previsão de despesas, e sendo a sua aplicação indispensável à sua correcta execução, elas repercutem-se directamente no próprio quadro contabilístico do orçamento, integrando-se substancialmente neste diplo- ma, como sua componente essencial. E nisso parece esgotar-se a sua eficácia, pois não se projectam, com independência, para fora da aprovação e execução do Orçamento do Estado. É o suficiente para se poder afirmar que estamos perante medidas de carácter orçamental, com o regime correspondente. Consequentemente, por força de regra constitucional (artigo 106.º, n.º 1, da Constituição), elas não podem gozar de vigência que não seja a anual. Nem é necessário determinar expressamente o termo final da sua vigência, pois este está definido constitucional e legislativamente (artigo 4.º, n.º 1, da Lei de enquadramento orçamental – Lei n.º 91/2001, de 20 de Agosto, na redacção da Lei n.º 48/2004, de 24 de Agosto). Que as normas impugnadas não visam instituir, com carácter de permanência, um novo regime jurídico dos níveis remuneratórios aplicáveis aos sujeitos abrangidos, em substituição definitiva do anteriormente vigente,que, desta forma, resultaria eliminado da ordem jurídica, é interpretação que encontra também algum apoio textual num segmento do n.º 1 e na alínea d ) do n.º 4 do artigo 19.º da Lei do Orçamento do Estado. Na primeira destas disposições, estabelece-se que a redução é aplicável, não só aos que se encontrem em exercício de funções em 1 de Janeiro de 2011, mas também aos que iniciem tal exercício , depois dessa data . Ora, em relação a estes, que, ab initio , têm o seu quantitativo remuneratório determinado (também) pelas normas impugnadas, nunca tendo auferido, no passado, um valor mais elevado, a previsão expressa de uma redução só se justifica no pressuposto de que os índices anteriores não desapareceram do universo jurídico. Só por confronto com esses índices se pode afirmar que os valores de remuneração resultam reduzidos. Raciocínio estruturalmente semelhante se pode desenvolver, a propósito do n.º 4, alínea d ), do preceito em causa. Aí se dispõe que “os descontos devidos são calculados sobre o valor pecuniário reduzido por aplica- ção do disposto nos n. os 1 e 2”. O enunciado deste regime (a preocupação em o enunciar) só se compreende se for admitido um outro quadro referencial como alternativa possível, para servir de base para as deduções. E esse quadro só pode ser o dos vencimentos sem as reduções, o que parece subentender que esta medida orçamental é transitória. No que especificamente respeita às reduções remuneratórias, propriamente ditas, dos magistrados judi ciais e dos magistrados do Ministério Público (as reduções que incidem sobre as componentes do sistema retributivo que se lhes aplica), vale seguramente o mesmo. Elas são duplamente determinadas pela lei do Orçamento do Estado, que, para além de incluir tais magistrados no rol dos sujeitos abrangidos [alínea f ) do n.º 9 do artigo 19.º], introduz aditamentos aos respectivos Estatutos (os novos artigos 32.º-A e 108.º-A), onde se prevê, nos n. os 1, reduções “nos termos da lei do Orçamento do Estado”. Mas tal inserção nos Esta tutos parece apenas pretender obviar a eventual inconstitucionalidade por ofensa da “reserva de estatuto”, atendendo designadamente ao alcance que a este conceito deu o Acórdão n.º 620/07. Não retira a tais medi das o seu carácter orçamental. Esta conclusão sai reforçada se atentarmos em que as novas normas estatutárias não fixam, elas próprias, a redução a que ficam sujeitos os vencimentos dos magistrados. Reenviam expressamente para os termos da lei orçamental, o que só pode significar que, nesta matéria, os Estatutos não gozam de qualquer autonomia de regime, estando o seu conteúdo normativo e âmbito de eficácia indissoluvelmente presos aos da lei orçamental. O regime aplicável, não só quanto aos quantitativos a reduzir, mas também quanto a todos os outros aspectos coenvolvidos, replica automaticamente o que consta desta lei e ao que é inferível da sua natureza específica. Já é muito duvidoso que o mesmo se possa dizer da redução em 20% dos subsídios equiparados a aju- das de custo, por força dos n. os 2 dos artigos 32.º-A e 108.º-A dos Estatutos dos Magistrados Judiciais e do Ministério Público, respectivamente, aditados pelos artigos 20.º, o primeiro, e 21.º, o segundo, da Lei do
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