TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 82.º Volume \ 2011
258 TRIBUNAL CONSTITUCIONAL 28.º - Convertendo uma norma preceptiva exequível por si própria e, portanto, que se projectava directamente na esfera jurídica subjectiva de cada indivíduo atribuindo-lhe um direito fundamental, numa norma de discutível preceptividade e nula auto-exequibilidade, suprime-se o padrão a partir do qual se pode aferir a inconstitucio nalidade das normas infraconstitucionais. 29.º - A consequência prática negativa mais evidente foi a tentativa de legitimação das exclusões constantes da lei ordinária que violavam manifestamente a Constituição, em que se destaca o artigo 40.º da Lei n.º 34/87, de 16/07. 30.º - Estas alterações (a relativa à criminalidade altamente organizada apenas nos termos em que foi interpre- tada) não violam apenas a alínea d) do artigo 288.º da CRP, mas igualmente a sua alínea m) , que tutela a indepen- dência dos Tribunais, de que o tribunal do júri constitui uma garantia fundamental. De resto, o Direito comparado fornece abundantes precedentes de a restrição às competências do tribunal do júri constituir um instrumento essencial de controlo das decisões judiciais pelo poder político. 31.º - A recusa da solicitada constituição do tribunal do júri com fundamento em que os crimes de que o arguido vinha acusado tinham sido praticados por um titular de um cargo político cai pela base quando nenhum dos crimes pelos quais foi efectivamente condenado (fraude fiscal e branqueamento de capitais) supõe essa especial situação do agente. Assim, a fixação da competência do tribunal com base nesse duplo critério (a pronúncia, por um lado; e a exclusão do tribunal do júri em qualquer dos crimes constantes da Lei n.º 34/87, de 16 de Julho) torna a norma do seu artigo 40.º inconstitucional, na medida em que permite – mercê da manipulação da acusação – excluir a aplicação do tribunal do júri para todos os delitos dos titulares de cargos políticos que normalmente lhe poderiam ser submetidos em razão da sua gravidade. 32.º - Uma interpretação de tal norma que permita a exclusão arbitrária da intervenção do tribunal do júri – como arbitrária sempre será a que fundamente tal exclusão na prática de crimes pelos quais o arguido não venha a ser condenado – é flagrantemente inconstitucional. – Da ratio decidendi do Acórdão recorrido para a exclusão do Júri do julgamento do crime de branqueamento de capitais: 33.º - o artigo 40.º da Lei n.º 34/87, de 16 de Julho, veda não só a intervenção do Júri no julgamento de crimes (1) “previstos na lei penal geral com referência expressa a esse exercício” como, por influência do artigo 2.º, nos (2) “que mostrem terem sido praticados com flagrante desvio ou abuso da função ou com grave violação dos inerentes deveres.”. 34.º - A lei processual não incluiu o crime de branqueamento de capitais na previsão do seu conceito de cri- minalidade altamente organizada até à Lei n.º 48/2007, de 29 de Agosto, que alterou o artigo 1.º do CPP (e daí que esta norma não tenha sido aplicada pela douta decisão recorrida em função da data dos factos trazidos a juízo). 35.º - Como se verifica pelo teor do douto Acórdão recorrido, formalmente o mesmo não afastou a compe- tência do Júri para o julgamento da causa no que concerne ao crime de branqueamento de capitais, com base no disposto no artigo 141.º da Lei 52/2008, de 28/8, conjugado que fosse com o disposto na actual alínea m) do n.º 1 do artigo 1.º, e no n.º 2, do C.P. Penal. 36.º - Efectivamente, à luz daquelas normas, não é possível concluir que o legislador ordinário tenha afastado a competência do Júri para julgamento do crime de branqueamento de capitais (a menos que fosse aplicado o artigo 1.º, n.º 1, alínea m), do CPP, de forma retroactiva, ao caso em apreço). 37.º - Assim, aparentemente, a ratio decidendi para a exclusão da competência do Júri nestes casos foi, (1) a aplicação directa do artigo 207.º, da CRP, considerando que o conceito jurídico constitucional de criminalidade altamente organizada abrange, desde logo, o crime de branqueamento de capitais, e (2) a interpretação de que na exclusão prevista no artigo 40.º da Lei n.º 37/87, de 16 de Julho, se deve incluir o crime de branqueamento de capitais por, à luz da pronúncia, ser conexo e instrumental em relação aos demais crimes imputados ao Arguido e previstos naquela Lei. 38.º - Pelo contrário, a exclusão da intervenção do Tribunal do júri pela douta decisão recorrida em relação a todos os restantes crimes pelos quais o ora recorrente foi pronunciado foi baseada exclusivamente no artigo 40 da Lei n.º 37/87, considerada como especial face ao artigo 13, n.º 2, do CPP e, portanto, aplicável em sua derrogação.
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