TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 82.º Volume \ 2011

256 TRIBUNAL CONSTITUCIONAL inseridos no artigo 207.º, n.º 1, pela revisão constitucional de 1997 em compressão dos direitos a ser julgado ou a participar em Tribunal do júri. 7.º - Foi a revisão constitucional de 1997 que incluiu no preceito correspondente ao actual artigo 207.º, n.º 1, da CRP, uma autorização ao legislador para a introdução de restrições “nos casos e com a composição que a lei fixar” e a amputação do âmbito de protecção do preceito que o toma inaplicável nos casos de “criminalidade altamente organizada”. 8.º - Ora, sendo o direito a participar em Júri (igualmente amputado) e o direito a ser julgado por tribunal do júri direitos, liberdades e garantias (ou, no mínimo, direitos de natureza análoga a direitos, liberdades e garantias), a sua restrição em sede de revisão constitucional sempre teria de respeitar os limites impostos pelo artigo 288.º, alínea d) da CRP. 9.º - O sentido preciso da alínea d) do artigo 288.º da CRP tem dado azo a divergências, porém, a compressão introduzida por revisão terá de se revelar adequada à protecção de um bem jurídico constitucional particularmente valioso, tal compressão deverá ser indispensável a tal protecção (não existindo alternativas adequadas menos lesivas do direito a alterar em sentido limitador) e o valor acrescentado por tal protecção deve ser claramente superior ao desvalor provocado nos titulares pela alteração do direito objecto de revisão compressora. 10.º - Apesar de se estar perante o poder de revisão constitucional, em matéria de compressão dos direitos, liberdades e garantias constitucionalmente consagrados, este poder tem uma discricionariedade muito limitada, encontrando-se sujeito a limites tão intensos ou mais do que os do legislador ordinário na formulação de restrições aos direitos, liberdades e garantias. 11.º - À luz destes critérios, afigura-se justificada a exclusão dos crimes de terrorismo do âmbito dos tribunais de júri introduzida pela Revisão de 1989, para evitar que o medo possa afectar a justiça dos actos dos Jurados, bem jurídico-constitucional (artigos 202.º, n.º 2 e 203.º da CRP) particularmente importante que justifica esta com­ pressão dos direitos em análise. 12.º - Pelo contrário, a exclusão (em 1997) do âmbito da jurisdição do Júri dos crimes que impliquem “crimi- nalidade altamente organizada”, operada através da inclusão de uma noção jurídica susceptível de ser utilizada para tutelar uma multiplicidade de bens jurídicos, incluindo vários que não têm dignidade para justificar compressões do direito fundamental a um julgamento por Júri (ou do direito a participar como Jurado na administração da jus- tiça), implica uma permanente aferição, à luz do sistema de valores plasmado na CRP, das escolhas que o legislador infraconstitucional sucessivamente adopte para concretizar esse conceito indeterminado. 13.º - Isto porque esse carácter indeterminado é susceptível de levar a interpretações formalistas, como as reali- zadas no presente processo, em que um determinado crime foi excluído do âmbito da garantia do tribunal do júri somente por força de uma qualificação legal sem consideração das particularidades do caso concreto. 14.º - Porém, conforme se referiu durante os trabalhos parlamentares da Revisão Constitucional de 1997: “Este conceito constitucional de “criminalidade altamente organizada” pressupõe: i) um elevado grau de organização do processo criminoso; ii) uma especial lesividade e perigosidade das condutas criminosas.”. (Deputado José Maga- lhães, citado pelo douto Acórdão n.º 450/08, de 24 de Setembro de 2008 do Tribunal Constitucional, relatado pela Sr.ª Conselheira Ana Guerra Martins). 15.º - Ao contrário do que se julgou, não se visou incluir em tal noção crimes particularmente complexos pela sofisticação da sua preparação ou complexidade da organização dos autores – mesmo que essa fosse a situação dos autos, que patentemente não era. 16.º - Tal intenção seria manifestamente inconstitucional por ter subjacente um juízo de que os cidadãos co- muns são incapazes de julgar “crimes complexos”. Tal premissa seria completamente anti-democrática. 17.º - Para preencher o conceito jurídico constitucional é necessária uma dimensão violenta efectiva ou, pelo menos, um risco sério desta em associação com uma organização alargada, ao ponto de poder constituir uma ameaça para os Jurados. 18.º - A razão de ser da exclusão da criminalidade altamente organizada e a do terrorismo são exactamente a mesma, e nem poderia ser de outra forma, sob pena de se estar perante uma revisão compressora dos direitos em causa contrária à alínea d) do artigo 288.º da CRP.

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