TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 82.º Volume \ 2011
24 TRIBUNAL CONSTITUCIONAL 20) Na norma objecto deste pedido de fiscalização sucessiva da constitucionalidade ao Tribunal Constitucio- nal, a discriminação negativa dos trabalhadores da Administração Pública é manifesta por terem sido prejudicados com esta redução definitiva de salários, sendo certo que há outras categorias de trabalhadores que são igualmente pagos com dinheiros públicos e que não foram atingidos por uma idêntica medida. 21) O legislador, na sua arbitrariedade claramente violadora deste critério de igualdade, chegou ao ponto de nalguns casos até ter construído uma ideia alternativa de adaptação dos salários quanto a outros trabalhadores, e não propriamente a sua redução, com o subterfúgio de tais trabalhadores terem um título jurídico salarial diverso dos trabalhadores em funções públicas. D) Violação do direito fundamental à não redução do salário 22) Em terceiro lugar, cumpre ainda referir a circunstância de os salários dos trabalhadores da Administração Pública, que têm um regime próprio, beneficiarem de um regra de irredutibilidade geral dos mesmos, à semelhança do que sucede com as remunerações dos trabalhadores que se submetem ao Direito do Trabalho. 23) E é bom de ver que os escassos casos em que a redução do salário é aceite não correspondem à norma que agora veio a ser incluído na Lei do Orçamento do Estado para 2011. 24) Mas deve entender-se que estas normas dos regimes gerais dos trabalhadores em funções públicas ou do Código do Trabalho, integrando leis ordinárias, não são normas que possam ser simplesmente alteradas por uma outra lei ordinária, como a Lei do Orçamento do Estado para 2011. 25) Essa é uma conclusão segura pelo facto de aquelas normas juslaborais, públicas ou privadas, reflectirem e concretizarem a realidade superior do direito ao trabalho e do direito ao salário justo dos trabalhadores, que são constitucionalmente acolhidos pelos princípios e pelas disposições que informam a Constituição Laboral. 26) Recorde-se também que aquelas normas podem funcionar como direitos fundamentais legais, reconheci- dos por legislação ordinária, mas que por via do artigo 16.º, n.º 1, da Constituição, acabam por obter uma força constitucional paralela, a ponto de não poderem ser alteradas ou revogadas por uma lei ordinária posterior. 27) Quer isto dizer que o legislador laboral, público e privado, tem criado novos direitos fundamentais dos tra- balhadores por via dessa legislação, sendo o direito à irredutibilidade dos salários, públicos ou privados, um desses direitos fundamentais legais, mas com protecção constitucional. E) Violação do direito fundamental de participar na elaboração da legislação laboral por parte das entidades representativas dos trabalhadores 28) Em quarto lugar, é finalmente de mencionar o facto de esta legislação laboral que reduziu os salários não ter sido devidamente precedida pelas obrigatórias consultas às entidades representativas dos trabalhadores, sendo certo que a lei orçamental tem o mesmo regime, neste ponto, das outras leis. 29) É isso o que se dispõe nos artigos 54.º, n.º 5, alínea d ), e 56.º, n.º 2, alínea a) , da Constituição, e também no artigo 134.° do Regimento da Assembleia da República, pelo que se trata de legislação inconstitucional por preterição dessa audição, pacificamente considerada obrigatória pelo próprio Tribunal Constitucional. 30) E não parece haver dúvidas sobre o carácter laboral desta medida, até se podendo dizer que nenhuma outra norma se conhece como sendo tão laboral como esta, pois reduz aquilo que de mais essencial e sagrado um trabalhador tem, que é o seu salário. Termos em que se pede ao Tribunal Constitucional a declaração da inconstitucionalidade, com força obriga- tória geral, de todas as normas dos artigos 19.º, 20.º e 21.º da Lei do Orçamento do Estado para 2011, aprovado pela Lei n.º 55-A/2010, de 31 de Dezembro.» 3. Resposta do órgão autor da norma Notificado para se pronunciar sobre o pedido, o Presidente da Assembleia da República veio juntar aos autos cópia da documentação relativa aos trabalhos preparatórios da Lei n.º 55-A/2010 e oferecer o mereci- mento dos autos.
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