TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 82.º Volume \ 2011
211 acórdão n.º 416/11 integra o objecto do presente recurso de constitucionalidade a interpretação dessa norma no sentido de nela se prever uma proibição total de revisão da medida de confiança a instituição com vista a futura adopção. Questão de constitucionalidade 6. Deve começar por dizer-se que não cabe ao Tribunal Constitucional apreciar se a decisão recorrida interpretou correctamente o direito infraconstitucional. Na verdade, não lhe cabe censurar a correcção do juízo hermenêutico desenvolvido pelo tribunal a quo e, nomeadamente, se, como defendem os recorrentes, a correcta interpretação do inciso final do n.º 1 do artigo 62.º-A da Lei de Protecção de Crianças e Jovens em Perigo, aprovada pela Lei n.º 147/99, de 1 de Setembro, introduzido pela Lei n.º 31/2003, de 22 de Agosto, é o de que, dele se não retirando embora a obrigatoriedade da revisão periódica da medida, também se não proíbe a sua revisão. Sob apreciação está única e exclusivamente a interpretação dada ao preceito no sentido de nele se proibir a revisão da medida para efeitos de reapreciação da conduta e condições supervenientes dos progenitores. Na interpretação dos recorrentes, tal interpretação do preceito é inconstitucional por violação dos n. os 5 e 6 do artigo 36.º da Constituição. A argumentação dos recorrentes pode sintetizar-se do seguinte modo. Em primeiro lugar, sustentam os recorrentes que, ao não permitir a revisão da medida de confiança a instituição com vista a futura adopção, a lei apenas está a ter em conta o interesse dos adoptantes, em viola- ção da Constituição, que vincula o legislador a orientar-se primordialmente pelo interesse da criança. Além disso, entendem os recorrentes, que, mesmo atendendo aos interesses dos adoptantes, estes só deve riam prevalecer quando as razões da aplicação da medida se baseassem na violação grave dos deveres fundamen- tais dos pais para com os filhos, como, por exemplo, atentar contra a sua vida ou saúde, e não quando tal medida tenha sido determinada por razões de incapacidade temporária dos pais. A esse acresce um segundo argumento, que passa por dizer que, se tal é assim num cenário em que a criança já teve contacto com um casal candidato à adopção e em que, portanto, os recorrentes reconhecem existir um conflito de interesses entre os pais e os futuros adoptantes, então, por maioria de razão, a prevalência do interesse dos pais deverá ser assegurada em um cenário, como o do caso dos autos, em que nem sequer existe qualquer contacto entre o menor e os futuros adoptantes, estando este confiado a um centro de acolhimento. Em termos dogmáticos, o argumento utilizado pelos recorrentes é o de, ao não diferenciar as situações de culpa grave dos pais da mera incapacidade temporária dos mesmos, a lei, na interpretação acolhida de que é proibida a revisão da medida para efeitos de reapreciação da conduta e condições supervenientes dos progenitores, restringe desproporcionadamente, porque tolha o relacionamento entre pais e filhos de forma definitiva quando o seu interesse é permanecerem enquanto famí- lia, direitos, liberdades e garantias, em violação do artigo 18.º, n. os 2 e 3, da Constituição, violando-se ainda o carácter de ultima ratio da separação entre pais e filhos que se retira do artigo 36.º, n.º 6, da Lei Fundamental. 7. A argumentação dos recorrentes baseia-se em uma determinada interpretação do artigo 36.º, n.º 6, da Constituição, na parte em que faz depender a possibilidade de separação entre filhos e pais do incumpri- mento de deveres fundamentais dos pais para com os filhos. Desde logo, a interpretação que de tal preceito fazem os recorrentes parte de uma leitura exclusivamente subjectivista desse preceito, em que se privilegia a protecção conferida pela Constituição aos próprios pais, e na qual apenas seria de admitir a “restrição” desse direito – o dos pais – a não poderem os seus filhos deles ser separados, salvo a verificação de determinados pressupostos. É por partirem desse enquadramento jurídico-constitucional que os recorrentes entendem que a norma sub judicio vem “restringir” de forma desproporcionada o seu direito. O problema dessa sua construção argumentativa reside justamente na sua premissa inicial, i. e., logo no enquadramento jurídico-constitucional de que partem os recorrentes.
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