TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 82.º Volume \ 2011
134 TRIBUNAL CONSTITUCIONAL legal. Visando as alterações legislativas conferir um tratamento diferente a determinada matéria, a criação de situações de desigualdade, resultantes da aplicação do quadro legal revogado e do novo regime, é inerente à liberdade do legislador do Estado de direito alterar as leis em vigor, no cumprimento do seu mandato democrático.Daí que, conforme tem referido o Tribunal Constitucional, o princípio da igualdade não opere diacro- nicamente ( v. g. Acórdãos n.º 34/86, em Acordãos do Tribunal Constitucional , 7.º Vol., p. 42, n.º 43/88, em Acordãos do Tribunal Constitucional , 11.º Vol., p. 565, n.º 309/93, em Acordãos do Tribunal Constitucional , 24.º Vol., p. 185, n.º 188/09, no Diário da República, II Série, de 18 de Maio de 2009, e n.º 3/10, no Diário da República , I Série, de 2 de Fevereiro de 2010). São as normas de conflitos que, numa situação de sucessão de leis, determinam qual o âmbito de apli- cação no tempo da nova lei, existindo normas gerais que fixam os princípios que fornecem ao julgador um critério permanente de solução dos conflitos ( v. g. o artigo 12.º do Código Civil), e normas específicas, esta belecendo a solução de um conflito particular surgido a propósito duma alteração legislativa determinada, normalmente inseridas na própria lei nova, como sucede relativamente à norma aqui sob fiscalização. Na determinação do conteúdo destas normas é reconhecida ao legislador uma apreciável margem de liberdade quanto ao estabelecimento do marco temporal relevante para aplicação do novo e do velho regime legal. Contudo, o critério escolhido terá que respeitar não só o princípio constitucional da segurança jurídica e da protecção da confiança, de modo a não violar direitos adquiridos ou frustrar expectativas legítimas, sem fundamento bastante, assim como também não poderá resultar na criação de desigualdades arbitrárias na aplicação da nova lei, após ela ter entrado em vigor. Quando se diz que o princípio da igualdade não opera diacronicamente, apenas se abrange as desi- gualdades resultantes de aplicação de diferentes regimes legais durante a sua respectiva vigência, mas já não quando, após a entrada em vigor duma lei, o legislador restringe a sua aplicação a determinadas situações, mantendo a aplicação da lei antiga, relativamente a outras, sem que se vislumbre fundamento razoável para essa distinção. Neste último caso, o princípio da igualdade consagrado no artigo 13.º da CRP, imporá um juízo de censura constitucional sobre essa opção. Segundo os princípios gerais estabelecidos no artigo 12.º do Código Civil, nomeadamente o que consta do n.º 2, in fine , as leis que regulam o exercício do poder paternal deveriam ter uma aplicação imediata às relações de filiação já existentes (vide, neste sentido, Baptista Machado, em Sobre a aplicação no tempo do novo Código Civil , pp. 144-145, da edição de 1968, da Almedina). Contudo, no presente caso, o legislador determinou que as alterações introduzidas pela Lei n.º 61/2008, de 31 de Outubro, não se aplicariam aos processos pendentes no momento da sua entrada em vigor, impe- dindo que elas regulassem as situações cuja solução já havia sido solicitada aos tribunais, salvaguardando, desse modo, a aplicação da lei vigente no momento em que foi requerida ao tribunal a sua intervenção. Desta norma de conflitos específica resulta que o exercício das responsabilidades parentais, relativo aos filhos de pessoas não unidas pelo matrimónio, nem vivendo em união de facto, nos processos entrados em juízo antes de 30 de Novembro de 2008, é regulado segundo o regime previsto para estas situações no Có- digo Civil, na redacção do Decreto-Lei n.º 496/77, de 25 de Novembro, enquanto nos processos entrados posteriormente àquela data, já o exercício das responsabilidades parentais é regulado segundo o novo regime do Código Civil, na redacção introduzida pela Lei n.º 61/2008, de 31 de Outubro. Apresentando estes dois regimes significativas diferenças, como acima se apontou, verifica-se um trata- mento jurídico diferenciado para o exercício das responsabilidades parentais que seja judicialmente regulado já após a entrada em vigor da Lei n.º 61/2008, de 31 de Outubro, nos processos iniciados anteriormente ao início da vigência deste diploma legal (30 de Novembro de 2008) e nos processos iniciados em data posterior. O estabelecimento desta diferença teve como fundamento a ponderação de que nos processos que se encontravam em curso quando ocorre a alteração legislativa já pode ter sido desenvolvida uma acti- vidade de determinação do quadro fáctico relevante que necessariamente se orientou pelo conteúdo do direito substantivoentão vigente. Na verdade, um processo judicial comporta fases de alegação de factos
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